quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

O Diálogo Ecumênico do Século 21: Uma Pista de Obstáculos?



Caríssimos,


É comum ouvirmos no Brasil que já foram feitos certos documentos e acordos de união entre as igrejas católicas Ortodoxa e Romana, que existiriam documentos permitindo ortodoxos frequentarem e mesmo comungarem na Igreja Romana, em suma, que seriam basicamente a mesma igreja e que a união seria um fato quase consumado.

Tais informações são rigorosamente falsas.

Confirmaremos isso na exposição do Protopresbítero Pe. Georgio Tsetsis, representante do Patriarcado Ecumênico no Conselho Mundial de Igrejas e veterano de diálogos ecumênicos.


Sobre todos acordos, documentos e declarações conjuntas já realizados, afirma o Protopresbítero:



A agenda das conversas bilaterais é muito cheia. Ela cobre uma gama de questões teológicas, eclesiológicas e pastorais, relacionadas, por exemplo, com fé e dogma, as fontes da revelação divina, tradição apostólica, cristologia, a natureza da missão da Igreja, a unidade da Igreja, os sacramentos, a autoridade da Igreja, a vocação de São Pedro, o testemunho do Cristianismo no mundo moderno e até questões pastorais sobre casamentos inter-religiosos.


Nessa altura, dada a confusão que reina sobre os objetivos dos diálogos e a natureza dos "Documentos Conjuntos" que são escritos nesses encontros, pode ser útil sublinhar uma coisa: que esses diálogos não são "concílios de unidade", e que os textos que publicam não possuem natureza de "acordos", muito menos de "uma confissão comum de fé", como muitos acreditam e persistentemente repetem. 


Como o Pe. Theodoros Zisis muito competentemente afirmou na 3a. Conferência Pré-Conciliar, quando ainda era um professor leigo, 
"qualquer um que estude as atas dos Sínodos Ecumênicos perceberá que antes de os pais do sínodo chegarem no ponto de formularem os termos, houve um longo período durante o qual os problemas foram esmiuçados e analisados , posicionamentos e estudos foram investigados e então, com base em tal preparo, o sínodo define a formulação dos termos." 
(...)

Devemos enfatizar quantas vezes forem necessárias que esses encontros são de natureza exploratória e que os textos preparados neles não são mais que "textos de trabalho" enviados por aqueles que os escreveram para as Igrejas que representam para avaliação e comentário. E naturalmente em ad referendum para o Grande e Santo Sínodo. São meramente textos de apoio na estrada para a unidade cristã, textos que as igrejas têm a liberdade de rejeitar, como já foi demonstrado na prática.

(...)

A questão óbvia que surge quanto a esse ponto é se, e até que ponto, os bispos, padres, professores e teólogos que tomam parte nesses diálogos realmente representam a "linha" oficial de suas respectivas igrejas e até onde o que expressam é meramente suas próprias ideias teológicas pessoais, e com as quais será impossível que as igrejas que os escolheram como representantes se identifiquem. A solução desse problema ajudará muito na prevenção de mal-entendidos quanto a natureza das conversas e do papel que os delegados das igrejas têm nelas.

(...)

O que nossas contrapartes devem cuidadosamente evitar em conversas entre eles, é expressar pontos de vista diametralmente opostos aos que formulam quando conversam com os Ortodoxos. O diálogo ecumênico deve, acima de tudo, ser um "diálogo em verdade". Pelo menos, esse é o sentido que foi entendido pelos Ortodoxos quando, cerca de 35 anos atrás, através de uma decisão Pan-Ortodoxa, inauguramos conversas com várias igrejas heterodoxas, tendo como objetivo uma estrada comum de cristãos em direção a união.


Mas quando nessas conversas, posições contraditórias são expressas por questões de "cortesia ecumênica" ou meramente para que em dado momento haja alguma empatia com a tradição teológica do interlocutor, então não apenas a verdade não foi manifestada, mas também não há promoção da jornada comum pela unidade cristã, que é precisamente o principal objetivo das conversas em primeiro lugar.



Fontes:


quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

A Vida do Justo São José, o Noivo, Primeiro Devoto de Maria






Os grandes santos anulam seu ego, sua identidade, sua imagem decaída para exaltar o Cristo.



É o que vemos em S. João Batista quando este diz: “É necessário que Ele (Jesus) cresça e eu diminua” (João 3:29,30) e também S. Paulo declarando seu processo de teosis/santificação, isto é, resgate da imagem e semelhança plena de Deus: “Não sou mais eu que vivo, mas é o Cristo que vive em mim” (GI 2,20).



São Paulo e São João Batista estabelecem, portanto, o plano completo de nossa salvação com estas suas palavras. S. João Batista nos mostra o meio da salvação (que a imagem do “eu” diminua para que Cristo tome a alma e resgate nela sua própria imagem) e S. Paulo nos mostra o efeito final e conclusão do processo; depois de diminuído a imagem decaída, esta morre e Jesus Cristo é que vive em nós e não nossas falsas concepções a respeito de nós mesmos e do mundo.



Esta breve introdução a respeito da humildade santa – que como visto é muito diferente da humildade “social” – é necessária para que compreendamos em sua total amplitude a figura do Venerando e Justo São José, o Noivo. De forma geral sabemos apenas que ele foi carpinteiro, que aceitou após um período de dúvidas ser o pai adotivo de Nosso Senhor Jesus Cristo e que em algum ponto entre os 12 e 30 anos de idade do seu filho ele deve ter falecido. Entretanto, esse santo que parece manter-se propositadamente à sombra de Maria e de Jesus Cristo guarda muitos ensinamentos para todos nós.

A Igreja Ortodoxa, sendo a Igreja criada por Jesus Cristo e transmitida pelos Apóstolos, preserva em seus registros escritos (dentre os quais, além das escrituras, o testemunho de historiadores cristãos primitivos que moravam ou iam nos locais santos buscar informações adicionais), culturais e pictóricos uma série de outras informações úteis a respeito dele e todas estas informações estão resumidas no título Justo São José, o Noivo.



O título de “Noivo” é dado pela relação que ele tinha com a Virgem Maria, que era expressão da relação que tinha com Deus. Para compreender a relação que ele tinha com a Virgem, devemos estudar quem era José pouco antes de conhece-la e onde ela estava quando foi entregue a ele.


Maria vivia de alguma forma dedicada ao Templo, provavelmente prestando serviços de tecelagem como outras jovens faziam. Tornando-se moça por volta dos 14 anos, pelos costumes da época, tinha que ser entregue em casamento para alguém.

Santíssima Virgem Maria,
modelo de vida consagrada


Dizem os primeiros historiadores da Igreja que Maria fizera um voto de permanecer virgem a vida toda, o que gerava um problema pois, tendo atingido a adolescência, tinha que ser desposada. Ao mesmo tempo, os sacerdotes do Templo se admiravam com a devoção sincera da mocinha e não queriam passar por cima do seu voto, o que seria inevitável se ela se casasse. Naquele tempo ainda não existia a instituição das freiras, que era a clara inclinação da jovem Maria.


A solução encontrada pela sua santa família foi precisamente entregá-la em noivado sem consumação do matrimônio a um viúvo idoso, igualmente religioso e que compreendesse a situação, que se comprometeria a cuidar dela pelo pouco que restasse de sua vida, de modo que ela pudesse ser fiel a seu voto e ao mesmo tempo atendesse às prerrogativas sociais de uma época sem mosteiros e que exigiam que ela se casasse.


Segundo os registros, José era um homem de idade extremamente avançada, ao contrário do jovem que filmes e certas imagens sugerem. De fato, a tradição de mostrar José como um idoso nas imagens era comum ao Ocidente e o Oriente até o século 17, quando na Espanha começam a aparecer imagens de um José mais jovem. Até ali, em toda a Cristandade, a Sagrada Família era a família de Nossa Senhora, constituída por Santa Ana, São Joaquim e sua santa filha, a Virgem Maria. Eles eram o exemplo de família devota e piedosa, cuja educação correta conduz os filhos à santidade. Já Santa Maria era vista à luz de sua condição especial de Virgindade Devota e Miraculosa Mãe, e São José como devotado a Maria e a Deus.



De toda forma, segundo a tradição da Igreja, José teria 80 anos ao ter conhecido Maria e teria falecido por volta dos 110 anos, ou seja, logo antes de Jesus iniciar seu ministério aos 30 anos. Essas idades são extraordinárias mas possíveis e ainda que sejam números imprecisos (seu valor simbólico sugerem que sejam), o fato estabelecido é que com certeza já passara da terceira idade. Era viúvo de um casamento de aproximadamente 40 anos, com uma mulher chamada Salomé, que era prima de João Batista apesar da diferença de idades, e que dera a José sete filhos: Tiago, Judá, Simão e José eram os filhos e Salomé, Ester e uma terceira cujo nome é incerto, eram as filhas. Tiago é o que seria mais tarde chamado Irmão do Senhor e seria o primeiro bispo de Jerusalém e autor da Liturgia de S. Tiago. Esta Salomé, filha de José, seria mais tarde a mãe de um outro Tiago, nomeado provavelmente em homenagem ao tio, e que era irmão de São João Teólogo, autor do quarto evangelho e portanto sobrinho de Jesus.


São José foi então sorteado entre os viúvos piedosos da cidade para ser noivo da jovem Maria. No Judaísmo da época não existia propriamente um noivado, mas um contrato de comprometimento, no qual as partes, através de seus pais, ou como no caso de José, por sua assinatura mesmo, se comprometiam a morar juntos durante algum tempo e a relação sexual após a cerimônia do casamento representaria a consumação do casamento. Como a jovem estava noivando com um idoso com o fim de manter seu desejo de devoção total a Deus, a ideia era provavelmente desde o início que o casamento jamais fosse consumado, mas a sociedade fosse apaziguada pelo contrato de noivado.


Tem-se registrado que S. José teria hesitado em receber a jovem devido à diferença de idades e mesmo teria dito que seria ridículo já que ele tinha filhos mais velhos do que ela (Maria deve ter-lhe sido entregue tendo por volta de 14 anos). Mas vendo a piedade da moça e compreendendo que esse noivado iria protegê-la, ele resolve aceitar e recebê-la como sua protegida.


Tendo aceitado-a, teria deixado a jovem em sua casa em Nazaré, acompanhada de 5 outras virgens para auxiliá-la, enquanto ia preparar uma casa definitiva longe dali. Essa mudança é outro sinal de que o contrato de noivado servia mais para proteger a vocacionada Maria de uma sociedade que não tinha ainda freiras ou mosteiros. Ao retornar, José encontrou-a grávida e raciocinou segundo os padrões normais, supondo que ela teria se deitado com algum homem.

S. José, o primeiro devoto de Maria

O interessante é que os registros deixam claro que mesmo em suas lamentações ele não fala como um homem traído e sim como um “protetor” que falhou em sua missão. De fato, tudo parece indicar que José tinha o entendimento de que a jovem virgem lhe havia sido entregue mais como alguém a ser protegida do que como esposa de fato. É apenas com a visitação do Arcanjo Gabriel em sonhos que o Justo José começa a compreender o que se passara. Que o seu comprometimento, vai muito além de cuidar de uma jovem devota, mas de proteger o próprio Filho de Deus que virá através dela.


S. José então relê as Escrituras judaicas e confirma que tudo está ocorrendo de acordo com as profecias. A partir daí, resolve assumir a jovem como noiva, ainda que não tencione consumar o matrimônio, já que esse não era o objetivo inicial e ele compreende que a Virgem Maria é a própria Arca da Nova Aliança, o Santíssimo, inexpugnável e no qual quem tocar morre; todos estes atributos eram relegados ao local onde Deus habitava no Antigo Testamento. De fato, era proibido tocar na Arca da Aliança e José, compreendendo que a Virgem Maria era a Nova Arca pois o Incontenível estava contido em seu útero jamais a tocaria.


Após nascido o Salvador, somos informados que Herodes manda matar os bebês com menos de dois anos e a São José recebe aviso para fugir para o Egito. O ícone que embeleza o início deste artigo representa tal fuga. Nele podemos ver São José, a Santíssima Maria, o Menino Jesus e São Tiago, já citado filho mais velho de São José com sua primeira esposa, Salomé.


Em sua terceira idade, este homem devoto toma a si o encargo de guiar sua jovem noiva, e o Filho de Deus através de uma viagem que seria longa e cansativa mesmo para um jovem. Viverão em um país estrangeiro onde terá que sustentá-los com seu ofício desgastante de carpinteiro. Retornam para Israel três anos mais tarde e então veremos José pela última vez nos Evangelhos no evento do Templo, quando o jovem Jesus, com 12 anos, dá lições aos sacerdotes. Neste meio tempo, José cumpriu perante Ele, perante a sociedade e perante Maria todas as obrigações e sacrifícios de pai e noivo, de forma total e completa. Por isso ele é chamado de S. José, o Noivo, não apenas porque nunca consumou o casamento com Maria, mas porque a virtude principal de um noivo é a fidelidade ao compromisso. São José era comprometido com Maria, e com a missão que Deus lhe outorgou e a cumpriu integralmente.


Vale citar ainda, o outro título de José: que ele era Justo. Este título, na religião judaica era mais que um adjetivo sinônimo de “honesto” ou de alguém com um senso de “justiça humana” aguda. Ser um Justo era o objetivo final da vida místico-religiosa judaica assim como ser santo o é do Cristianismo. O Justo (Tsadic) judeu é alguém que alcançou o Amor absoluto à Deus, o nível de ahava beta'anugim - "deleite amoroso".


Outros dois homens bíblicos que são chamados Justos são Noé e o José do Velho Testamento. Segundo o site Beit Chabad:

Um tsadic (o justo consumado) é alguém tão completamente devotado a D'us que nunca se considera como uma entidade separada ou individual. Sim, sua observância da Torá e dos mandamentos está repleta da intenção de aderir e tornar-se unido a D'us, cumprindo Sua vontade, e vivencia a Divindade com amor e temor. Mesmo assim, atribui tudo à infinita graça e providência de D'us. Como dizem nossos Sábios (Ética dos Pais 3:7): "Dê (i.e., atribua) a Ele tudo que Lhe pertence, pois você e tudo que é seu pertencem a Ele. (...)O serviço do tsadic a D'us é sem nenhum interesse. Seu desejo incondicional de servir e tornar-se um com Ele obstrui qualquer preocupação com o recebimento de uma recompensa, mesmo aquela do Mundo Vindouro."
E ainda outra fonte judaica sobre o que é ser um "Justo":
O Tsadic (O Justo)
Segundo a opinião do Tanya, uma pessoa que passou por testes de força moral e de caráter, e não sucumbiu ao pecado em pensamento, palavra e ação não é exatamente o significado do termo tsadic. Este também não descreve a essência de um tsadic. Ao contrário, o título tsadic refere-se a uma pessoa que triunfou sobre sua alma animalesca. Esta vitória significa que ele expulsou, ou transformou em bem, o mal inerente a seu coração desde o momento em que nasceu.
No capítulo dez do Tanya, Rabi Shneur Zalman explica que há duas categorias gerais de tsadic.
Um tsadic imperfeito ou incompleto é alguém que conseguiu banir ou eliminar o mal dentro de si por meio de seu serviço Divino, como alude o versículo: "E erradicarás o mal de dentro de ti." Um tsadic perfeito ou consumado é alguém que não somente baniu qualquer traço de mal dentro de si, como também conseguiu transformar o mal em bem.
Conforme já destacamos, na sabedoria chassídica há uma distinção entre a faculdade do desejo da alma animalesca, e as "vestes imundas" nas quais a alma animalesca se veste. O poder do desejo não é necessariamente mau. Ele tem em si o potencial de ser atraído na direção do bem ou do mal. As "vestes imundas" nas quais a alma se veste são o produto da indulgência nos deleites físicos deste mundo. Assim como uma pessoa pode mudar de roupas à vontade, assim também pode tirar as vestes imundas que cobrem sua alma.
Banir e eliminar o mal
Deveria ser enfatizado que a transformação do poder do desejo da alma animalesca em amor a D’us caminha de mãos dadas com mudar completamente as vestes imundas. Devido a isto, o tsadic imperfeito, que não conseguiu transformar o mal em bem, também não conseguiu eliminar o mal dentro de si próprio. É por este motivo que o tsadic incompleto é também chamado "um tsadic que conhece o mal", ou "um tsadic no qual existe o mal", pois algum minúsculo vestígio do mal ainda permanece dentro dele, no lado esquerdo de seu coração. No entanto, em seu favor, devemos dizer que o vestígio do mal nunca é expresso em pensamento, palavra ou ação, pois "em razão de sua pequenez, é subjugado e anulado para o bem."
Rabi Shneur Zalman enfatiza que o nível de "um tsadic que conhece o mal" na verdade abrange miríades de níveis, que são classificados segundo a quantidade e a potência do mal que permanece dentro dele. Em um tsadic imperfeito, um vestígio do mal originário do elemento Ar permanece. Em outro, um traço do mal do elemento Terra sobrevive, e assim por diante. Em um tsadic incompleto, o mal é anulado pelo bem na proporção de um para sessenta. Em outro tsadic imperfeito, o mal é anulado na proporção de um para mil, ou dez mil, etc. Estas várias subdivisões na categoria do tsadic imperfeito são os níveis dos numerosos tsadikim encontrados em todas as gerações. Segundo o Tanya, este é o significado da declaração de Nossos Sábios, que "dezoito mil tsadikim ficam de pé perante o Eterno, bendito seja."
O mal não é sentido
O rei David declarou sobre si mesmo: "Meu coração está vazio (chalal) dentro de mim." Isso sugere que seu coração estava vazio da consciência da má inclinação. E a razão para isso está declarada no Talmud Yerushalmi: "pois ele o tinha matado através do jejum." A palavra chalal significa também um cadáver, implicando assim que depois que o Rei David tinha jejuado a tal ponto que destruiu sua má inclinação, tudo de que tinha consciência era o "cadáver" do yetser hará (yetser hará=inclinação para o mal) dentro dele. Este status é atingido por todo "tsadic que conhece o mal" na guerra contra a alma animalesca.
O tsadic imperfeito destruiu seu yetser hará, e cumpriu o versículo "erradicarás o mal de seu meio", embora às vezes o vestígio do mal que permanece dentro dele (o "cadáver" de seu yetser hará) demonstre sua presença. Mesmo assim, não tem efeito sobre ele (permanece um corpo sem vida, por assim dizer) e não pode perturbá-lo em seu serviço Divino ou impedi-lo de apegar-se a D’us.
Em contraste, o yetser hará do benoni (o sujeito que não é mais um pecador inveterado, mas não é um tsadic ainda) é passível de incomodá-lo ao máximo. Mesmo quando o benoni está ocupado com seu serviço Divino, e em meio a seu apego por D’us, maus pensamentos podem perturbá-lo. Para superar estes maus impulsos ele deve ir à guerra. No tsadic incompleto, porém, a aparência do mal é apenas transitória, e pode imediatamente ser ordenado a fugir sem qualquer luta. 
http://www.chabad.org.br/tora/cabalaterapia/cab125.html




Vemos, portanto que José é um homem que recebe três títulos honrosos: ele é Santo que é um  reconhecimento de avançado estágio de aproximação de Deus segundo os critérios Cristãos, garantindo que ele fora salvo por seu Filho, algo que está acima de ser Justo. Mas ele também é um Justo,  o que, como vimos, é também o nome de uma forma de santidade no judaísmo em reconhecimento do pleno cumprimento da Vontade de Deus por parte de José. Este octogenário conseguiu nada mais, nada menos do que cumprir tanto o que Deus exigia no Velho Testamento quanto o que exigia no Novo. É Santo e Justo.


Finalmente, é chamado também "o Noivo" porque ele obteve tais virtudes pelo comprometimento com Deus que realizou através do noivado com sua Santíssima Mãe Maria, superando a vergonha do escárnio da sociedade por ser visto como "traído" por uma moça mais nova. Com profunda fé em Deus e fidelidade a missão recebida, São José foi o primeiro devoto consagrado a Maria, o primeiro homem que entregou sua vida integralmente a Deus através do serviço constante à Sua Santíssima Mãe, relacionando-se com ela com a reverencial piedade de um devoto e não como marido - lembramos mais uma vez que tradicionalmente a figura exemplo da Sagrada Família, de santidade no casamento e na criação dos filhos é a família de Nossa Senhora e seus pais, Santa Ana e São Joaquim, com muitos e luminosos exemplos de fé, paciência, e alegria, gerando uma filha santa.



Portanto, São José é um homem de estatura espiritual singular e magnífica e que ainda assim manteve suficiente silêncio humilde a respeito de si mesmo para que não se destacasse diante daqueles a quem devia servir, entre os quais o próprio Deus. Diminui-se para que Deus fosse glorificado, entregou até o último suspiro de suas forças ao Plano de Deus, servindo assim de exemplo para todos nós e merecendo ser chamado o Justo São José, o Noivo. 

A Sagrada Família Tradicional:
São Joaquim, exemplo de pai, Santa Ana, exemplo de mãe,
e a Virgem Maria, exemplo de filha, símbolos do casamento e da família cristã

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Divina Liturgia: Como Aproveitar Melhor



Traduzido e adaptado do original do Pe. Dimitri Cozby





Todo padre recebe perguntas sobre como aproveitar melhor a Divina Liturgia, o que deve ser feito para mostrar o devido respeito no templo do Senhor e o que pode ser feito para termos uma participação mais significativa nos ofícios. Este artigo buscará tratar de algumas das perguntas mais comuns, fundamentando-se em fontes diversas. Não deve ser tratado como leis que exigem obediência, mas como auxílios para alcançarmos uma postura espiritual, uma certa mentalidade que fará a adoração em nossa igreja mais significativa para cada um de nós.



Sempre que entramos ou saímos do templo, devemos fazê-lo da forma mais serena possível, para não perturbarmos as orações de nossos irmãos e irmãs, assim como gostaríamos de fazermos nossas orações sem interrupções ou distrações.



Também ao entrarmos ou sairmos do templo, devemos ficar de frente para o altar e fazer o sinal da cruz. Antes de irmos para nosso lugar, veneramos o ícone do santo padroeiro ou da festa que comemoramos e que estará no centro do templo, e veneramos os ícones de nosso Senhor e da Teotókos - tudo isso depois de comprarmos e acendermos velas se assim quisermos.



É melhor evitar ficar entrando e saindo da igreja durante os ofícios. Especialmente não entre enquanto a igreja estiver senso incensada, durante as procissões do Evangelho e do pão e vinho que serão consagrados, nem durante o sermão; são momentos que exigem concentração e movimentações provocam distração. Chegar atrasado na Liturgia é uma falta comum entre ortodoxos de todas as origens, mas não é algo de que devemos nos orgulhar. Sair mais cedo sem uma razão muito boa é tão ruim quanto.



Dentro do templo, devemos buscar manter uma atitude de oração e um espírito de humildade, como o do coletor de impostos do Evangelho (S. Lucas 18:10-14). Nosso propósito ao irmos a igreja é nos aproximarmos de nosso Senhor e Rei na companhia de nossos irmãos e irmãs; nos juntamos para constituir a Igreja de Deus. Esses fatos devem governar todas as nossas atitudes e comportamentos.

É melhor evitar conversas na igreja mesmo se o ofício não começou ainda. Devemos aproveitar o tempo antes dos ofícios nos preparando para a adoração; conversas necessárias devem ser conduzidas serenamente para não perturbar a meditação dos outros.



Aproveitamos melhor o que a Liturgia oferece se orarmos ao invés de meramente estarmos presentes. Deixe que os hinos entrem no seu coração, e faça com que as palavras ditas sejam as suas próprias como se você as dissesse de sua própria boca com toda sinceridade. Lembre-se que a Liturgia não é o momento das orações particulares, que podem ser feitas em casa em nosso canto de ícones, mas ela é o momento da oração comum da Igreja.



Para ajudar na oração do coração, ore com o seu corpo além da sua mente. A piedade ortodoxa é rica em ações que permitem que tudo em você glorifique a Deus, inclusive seus gestos e postura corporal. Devemos fazer o sinal da cruz nas horas adequadas: sempre que se fala na Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, e em qualquer oração ou petição que te afete pessoalmente. Quando o padre incensa ou abençoa o povo, o correto é fazer uma curvatura de reverência. Nesse momento não é necessário fazer o sinal da cruz, mas também não é errado fazê-lo. Durante a Quaresma, existem momentos quando nos ajoelhamos ou fazemos prostrações; siga o padre e os auxiliares do altar nessas questões. Se ajoelhar aos domingos não é adequado, pois todo domingo é uma festa da Ressurreição, uma Páscoa semanal e a posição do corpo que melhor expressa nossa alegria e salvação é estarmos de pé, especialmente após a Comunhão. A participação penitencial, de joelhos, pode ser feita nos outros dias. Os leitores e cantores podem não fazer vários desses gestos para não perturbarem a harmonia do ofício.



Lembremos sempre e acima de tudo que o templo deve estar cheio de uma atitude de amor mútuo e respeito. Estamos reunidos para compartilharmos na adoração da Igreja, para nos unirmos uns aos outros e com nosso Deus, para sentir já um pouco da alegria que teremos quando reunidos no Seu Reino. Nossas atitudes uns para com os outros devem ser reflexo da atitude do Senhor, que ama a todos nós e só deseja o nosso crescimento espiritual e nossa salvação.

domingo, 20 de dezembro de 2015

Como surgiu a festa do Natal (e não tem nada a ver com festas pagãs)



William J. Tighe, sobre a história do 25 de dezembro

Tradução de Ricardo Williams

Ensaio publicado originalmente no site Touchstone – A Jornal of Mere Christianity http://www.touchstonemag.com/index.html

Muitos cristãos pensam que celebramos o nascimento de Cristo em 25 de dezembro porque os Pais da Igreja se apropriaram da data de um festival pagão. Praticamente ninguém se importa com isso, exceto por alguns grupos extremistas de evangélicos norte-americanos, que crêem que isto faz do Natal uma festa pagã. Mas é importante saber que a escolha do 25 de dezembro é resultado de várias tentativas dos primeiros cristãos de descobrir a data do nascimento de Jesus, baseadas em cálculos que não tinham relação com festividades pagãs.

Pelo contrário, ao instituir o festival pagão do "Nascimento do Sol Invicto" em 25 de dezembro de 274, o imperador romano Aureliano certamente tentou criar uma festividade pagã para competir com uma data que já possuía certa importância para os cristãos romanos. Portanto, o mito das "origens pagãs do Natal" é totalmente desprovido de bases históricas.

Um erro
Devemos a idéia de que a data foi apropriada dos pagãos a dois estudiosos do final do século XVII e início do século XVIII: Paul Ernst Jablonsky, um Protestante alemão que desejava mostrar que a celebração do nascimento de Cristo em 25 de dezembro era apenas uma das inúmeras "influências" pagãs adotadas pela igreja a partir do século IV e que transformara o cristianismo apostólico puro no catolicismo romano; e Dom Jean Hardoiun, um monge beneditino que tentou mostrar que a Igreja Católica Romana adotara festivais pagãos para cristianizá-los sem, no entanto, corromper o evangelho com influências pagãs.

No calendário juliano, criado em 45 a.C. pelo imperador Júlio César, o solstício de inverno caía em 25 de dezembro, e portanto, parecia óbvio a Jablonsky e Hardoiun que a data fora importante para os pagãos. Mas, na verdade, tal data não possuía importância religiosa no calendário de festividades pagãs romanas antes da época de Aureliano, tampouco o culto ao sol fora importante em Roma antes de seu governo.

Havia dois templos solares em Roma: um deles, mantido pelo clã ao qual Aureliano pertencera, e que celebrava seu festival em 9 de agosto; e outro que celebrava seu festival em 28 de agosto. Mas ambos os cultos caíram em decadência por volta do século II, quando cultos solares orientais, como o mitraísmo, tornaram-se populares em Roma. De qualquer modo, nenhum destes cultos, novos ou antigos, celebravam festivais relacionados a solstícios ou equinócios.

O que realmente ocorreu é que Aureliano, que governou de 270 até seu assassinato em 275, era hostil ao cristianismo, e aparentemente promoveu e estabeleceu o festival do "Nascimento do Sol Invicto" como um meio de unificar diversos cultos pagãos do Império Romano através do "renascimento" anual do sol. Durante seu governo o império parecia desmoronar devido a desordem interna, rebeliões nas províncias, decadência econômica e ataques contínuos das tribos germânicas ao norte, e dos persas à leste.

Com a criação da nova festividade o imperador pretendia que o 25 de dezembro – que iniciava o período do ano em que os dias eram mais longos e as noites mais curtas – se tornasse um símbolo do esperado "renascimento" ou renovação perpétua do Império Romano, resultado da retomada do culto a deuses que, no passado, haviam levado Roma à grandeza – segundo criam os romanos. Se a data coincidisse com uma festa cristã, melhor ainda.

Uma conseqüência
É certo que a primeira evidência que temos da celebração da festa cristã do Natal do Senhor na data de 25 de dezembro data de 336 d.C., anos após o fim do governo de Aureliano. Mas há evidências de que, já nos século II e III, tanto no oriente grego quanto no ocidente latino, os cristãos tentavam descobrir a data do nascimento de Cristo antes mesmo dela tornar-se uma celebração litúrgica. Evidências indicam que, na verdade, a escolha da data de 25 de dezembro foi uma conseqüência de tentativas de se determinar a celebração da Páscoa.

Como isso ocorreu? Há uma contradição aparente entre a data da morte do Senhor segundo os Evangelhos sinópticos e o Evangelho de São João. Os sinópticos marcam sua morte na Festa da Passagem, após o Senhor celebrar da Ceia na noite anterior. João marca sua morte na véspera da Festa da Passagem, quando os cordeiros eram sacrificados no templo de Jerusalém para a festa que teria início após o sol se pôr naquele dia.

Para solucionarmos esse problema devemos responder se a Última Ceia do Senhor foi uma ceia celebrada na Festa da Passagem, ou uma refeição ocorrida na véspera. A questão é muita longa para abordamos aqui, mas basta dizer que a Igreja primitiva seguia a data de São João, e portanto cria que a morte de Cristo ocorrera em 14 de Nissan, segundo o calendário lunar judaico.

Aliás, muitos estudiosos contemporâneos postulam que a morte de Cristo só poderia ter ocorrido em 30 ou 33 d.C., já que somente nestes dois anos a véspera da Festa da Passagem caíra em uma sexta-feira, sendo os possíveis dias de sua morte 7 de abril do ano 30, ou 3 de abril do ano 33.

Porém, com sua forçosa separação do judaísmo, a Igreja passou a adotar calendários distintos, e teve de obter meios próprios para determinar a celebração da Paixão de Cristo de modo independente dos cálculos feitos pelos rabinos judeus que determinavam a data da Festa da Passagem. Além disso, como o calendário judaico era um calendário lunar composto de doze meses de trinta dias, de tempos em tempos o Sinédrio decretava a adição de um 13o mês para que o calendário acompanhasse os equinócios e solstícios, e as estações do ano caíssem na época apropriada do calendário.

Além da dificuldade que os cristãos teriam em seguir, ou mesmo saber com precisão, a data da Festa da Passagem a cada ano, seguir um calendário lunar próprio lhes causaria problemas com os judeus e pagãos, e muito provavelmente causaria disputas internas – como as disputas do século II sobre se a Páscoa deveria sempre ser celebrada em um domingo ou em qualquer dia da semana que caísse dois dias depois do dia 14 de Nissan. Seguir um calendário lunar pioraria ainda mais tal situação.

Tais dificuldades foram solucionadas de modo diferente entre os cristãos gregos da porção oriental do império e os cristãos latinos da parte ocidental. Os gregos aparentemente desejavam encontrar uma data equivalente ao 14 de Nissan em seu calendário solar, e como o mês de Nissan coincidia com o equinócio de primavera, ele escolheram o 14o dia de Artemísion, mês do equinócio de primavera em seu próprio calendário. Por volta de 300 d.C., o calendário grego foi substituído pelo calendário romano, e como as datas de início e fim dos meses em ambos os calendários não coincidiam entre si, o 14 de Artemísion tornou-se 6 de abril.

Por sua vez, os cristãos latinos de Roma e do norte da África do século II aparentemente desejavam estabelecer uma data histórica para a morte de Nosso Senhor. Na época de Tertuliano (c. +230), eles decidiram estabelecer que a data da sua morte fora em uma sexta-feira, 25 de março do ano 29 (é importante notar que esta data estava errada; 25 de março de 29 não era uma sexta-feira, e naquele ano a véspera da Festa da Passagem não caíra em uma sexta-feira, tampouco em 25 de março).

Era de Integração
Portanto no oriente tínhamos o 6 de abril, e no ocidente o 25 de março. Aqui devemos explanar uma crença que era corrente no judaísmo na época de Cristo, mas que como não se encontra na Bíblia, é desconhecida dos cristãos: a idéia de uma "era de integração" dos grandes profetas judaicos, a idéia de que os profetas de Israel morreram na mesma data de sua concepção.

Esse conceito é um fator chave para compreendermos como alguns cristãos primitivos vieram a crer que 25 de dezembro é a data do nascimento de Cristo – eles aplicaram esta idéia a Jesus, de modo que 6 de abril e 25 de março não eram apenas as supostas datas da morte de Cristo, mas também de sua concepção ou nascimento. Há evidência fugaz de que alguns cristãos dos séculos I e II criam que o nascimento de Cristo era 25 de março ou 6 de abril, mas a data de 25 de março logo ganhou aceitação entre os cristãos como a data da Concepção do Senhor.

Ainda hoje esta data é comemorada pela maioria dos cristãos como a Festa da Anunciação, quando o Arcanjo Gabriel trouxe a Boa-nova do Salvador à Virgem Maria, que por seu consentimento possibilitou que o Eterno Verbo de Deus ("Nascido do Pai antes de todos os séculos: Luz de Luz, Deus Verdadeiro de Deus Verdadeiro") se encarnasse em seu ventre. E quanto tempo dura uma gravidez? Nove meses. Se contarmos nove meses a partir de 25 de março, chegamos a 25 de dezembro; fazendo o mesmo com o 6 de abril, temos 6 de janeiro. Em 25 de dezembro celebramos o Natal, e em 6 de janeiro, a Epifania.

O Natal (25 de dezembro) é uma festa originária do ocidente cristão, que foi introduzida em Constantinopla por volta de 379 ou 380. Em um sermão de São João Crisóstomo, que na época era um renomado asceta e pregador em Antioquia, vemos que a festa foi celebrada pela primeira vez em sua cidade natal em 25 de dezembro de 386. A partir dos grandes centros urbanos, a festa se difundiu em todo o oriente cristão, sendo instituída em Alexandria no ano 432, e em Jerusalém por volta de um século depois. Somente a igreja da Armênia não adotou esta tradição, e até hoje celebra o Natal de Cristo, a adoração dos Reis Magos e o Batismo do Senhor em 6 de janeiro.

As igrejas ocidentais, por sua vez, adotaram posteriormente a Festa da Epifania, celebrada no oriente em 6 de janeiro, entre os anos 366 e 394. Mas no ocidente a festa era celebrada geralmente como a visita dos Reis Magos ao menino Jesus, e como tal, era uma festa importante, mas não pertencia às grandes festas da Igreja – um visível contraste com o Oriente, onde a Epifania ainda é, depois da Páscoa, a festa mais importante do calendário litúrgico.

No oriente cristão, a Festa da Epifania é mais popular que o Natal. O motivo é que esta festa celebra o Batismo de Cristo no Rio Jordão, quando a Voz do Pai e a descida do Espírito Santo manifestaram aos homens, pela primeira vez, a divindade do Cristo Encarnado e a Trindade Divina.

Uma festa cristã
Portanto a escolha do 25 de dezembro como data do nascimento de Cristo não possui relação alguma com supostas influências pagãs que adentraram a Igreja durante ou após o reinado de Constantino. É altamente improvável que esta seja a verdadeira data do nascimento de Cristo, mas deve suas origens aos esforços dos cristãos latinos dos primeiros séculos em determinar a data precisa da morte de Cristo.

E a festa pagã instituída pelo imperador Aureliano em 274 foi não somente uma tentativa de utilizar o solstício de inverno para fins políticos, mas também uma tentativa de dar um significado pagão a uma data que já era importante aos cristãos romanos. Estes, por sua vez, posteriormente fizeram uso da coincidência com a festa pagã do "Nascimento do Sol Invicto" para se referir ao nascimento de Cristo como o nascimento do "Sol da Salvação" ou "Sol da Justiça".

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William J. Tighe, correspondente da Touchstone, é professor de História da Faculdade Muhlemberg. Ele indica aos leitores interessados o livro The Origins of the Liturgical Year, de Thomas J. Talley, publicado pela editora The Liturgical Press

Assista também sobre o mesmo tema, o desenho animado "Hórus Arruina o Natal"

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

O Que a Igreja Ortodoxa Não É - Parte 04/11


S. Gregório Palamas, Pai da Igreja

por Sua Eminência Jeremias (Foundas) de Gortyna e Megalópolis (Grécia)

Não para o Fim da Era Patrística
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Mas também temos um outro tipo de plani (ilusão espiritual) dos Franco-Latinos sobre os Pais da Igreja; similar à que mencionamos no item anterior, mas pior: a ilusão de que a era da teologia patrística teria acabado depois de Fócio, o Grande. O pior é que essa ideia do fim da teologia patrística encontrou chão fértil mesmo em solo ortodoxo helênico. A questão é simples e é como segue: 

No início do século 9, os francos introduziram o filioque (a tese de que o Espírito Santo procede não apenas do Pai, mas também do Filho) no Símbolo de nossa Fé, o Credo (NT). Nessa época, todos os cinco patriarcados romanos (de Roma, Nova Roma, Alexandria, Antioquia e Jerusalém) condenaram formalmente tal ensino como herético no Oitavo Concílio Ecumênico (879). Como os francos não podiam reconhecer como Pais aqueles que lutaram contra o seu filioque, por essa razão viram-se forçados a alegar que a tradição teológica patrística terminara no século 8. Afinal de contas, os Francos já haviam condenado também o Sétimo Concílio Ecumênico (794); de modo que sequer aceitavam São João Damasceno como um Pai da Igreja. Mais tarde, porém, durante o século 12, sob a pressão de itálo-lombardos e dos romanos ocupados no sul da Itália, os francos foram forçados a finalmente aceitarem o Sétimo Concílio Ecumênico, incluindo assim São João Damasceno entre os seus Pais da Igreja. Até hoje, os ocidentais crêem que o último Pai “Grego” da Igreja foi São João Damasceno. 

Esse ponto de vista, ou melhor, essa heresia, sobre o suposto fim da era patrística, também foi aceito pelos russos (10), com a diferença de que para eles o último pai teria sido Fócio, o Grande. Assim, os russos incluem entre os Pais da Igreja aquele que lutou contra o filioque. O problema é que essa heresia também foi aceita por alguns gregos modernos (11), que falam de um antigo “período patrístico” e que não existem mais Santos Pais em nossa época. 

Os francos, russos e junto com eles os gregos modernos que pensam que a era patrística terminou foram excomungados por nossa Igreja, já que quando o Concílio de Constantinopla em 1368 proclamou Gregório Palamas não apenas um santo da nossa Igreja, mas também um Pai, excomungando ali todos os que não o aceitam como um Pai da mesma estatura dos Pais mais antigos da Igreja. Entretanto, São Gregório Palamas viveu durante o século 13, em outras palavras, muito depois de São João Damasceno ou de São Fócio, que são considerados pelos grupos acima como os últimos Pais da Igreja. 

Ou seja, através do reconhecimento conciliar de São Gregório Palamas como um Pai e da excomunhão de todos os que não o aceitam como de igual status com os Pais anteriores da Igreja, a própria heresia franco-latina do fim da era patrística foi condenada como tal e os franco-latinos foram excomungados. 

A despeito dos sofistas tagarelas entre os francos e os russos, nós ortodoxos, até mesmo durante esse duro e tenebroso período da Turcocracia, geramos portadores viventes da genuína teologia e espiritualidade dos antigos Santos Pais, tais como: Nicodemos, o Haguiorita, Eugênio Vulgaris, Nicéforo Theotokis, Atanásio de Paros, Macário Notaras, Cosme da Etólia, Máximo, o Grego, Pacômio Russanus, Genádio Scholarius, Jacó Monachus, Máximo do Peloponeso, Agápio Lardus, além de muitos hierarcas e patriarcas que participaram de tantos concílios entre os séculos 17 e 19. 

A plani (ilusão espiritual) de que a teologia patrística teria acabado foi combatida especificamente e no fim derrotada pelo profundo teólogo Pe. Florovsky; e dessa forma, nossa própria Ortodoxia, que fora influenciada pelos francos, foi resgata e aceitou a teologia patrística além de Fócio, o Grande. 

De toda forma, para que posssamos confronter com sucesso toda a questão do término da teologia patrística é necessário que estudemos bem o que a Igreja (ecclesia) é (12) e o significado da palavra “Pai”. Um argumento simples mas poderoso contra tal ideia é o seguinte: toda época tem problemas espirituais fundamentais e crises com que lidar, aos quais a Ecclesia, através dos Pais, provê soluções; em outras palavras, sempre precisamos de Pais. Mas sempre encontramos o Espírito Santo na Ecclesia, o Qual designa esses Pais. Se alegamos que o período patrístico encerrou-se, sabendo que sempre necessitamos da presença dos Pais, é como se estivéssemos blasfemando dizendo que o Espírito Santo não mais trabalha ou está presente na Ecclesia. 

(Nota do Tradutor): Historicamente a primeira vez que os ocidentais introduziram o filioque no Credo foi tardiamente no fim do século 6, no III Concílio de Toledo em 589, e que marcou a conversão dos Visigodos do Arianismo. Entretanto, o Concílio de Toledo foi um concílio local. A expectativa de aceitação universal do filioque por parte dos Ocidentais, fundamentada na crença errônea (ou propaganda secessionista de Carlos Magno para legitimar seu nascente império) de que o filioque faria parte do Credo original e os “gregos” teriam adulterado a declaração, só manifesta-se consistentemente, de fato, no século 9. 

10. Ao que parece, através de Pedro Moghila (AD 1633-1646). 

11. O Pe. John Romanides diz: “Com o estabelecimento do Primeiro Estado Helênico depois da revolução de 1821, as poderosas influências da Rússia e da Francocracia invadiram-na, especialmente através da Universidade de Atenas, com resultados desastrosos para a Romanidade, já que a hierarquia de Hellas e a liderança espiritual dos gregos modernos educaram-se sob o espírito da Francocracia (Europa Ocidental) e da Rússia (ibid. p. 75). 

O padre teólogo dá, entretanto, em outra seção de seu livro, boas notícias para “hoje”: “Hoje, quando a teologia ocidental está em confusão e decadente, a teologia patrística retornou às universidades helênicas, e assim seu espírito reina em Hellas, para grande benefício da Romanidade” (ibid. p. 80) 

12. Cf. nosso periódico “Incense”, número 13

A Natividade de Cristo: Vivendo o Natal Ortodoxo


15 de Dezembro de 2015 

O Natal está à nossa frente. Como escolhemos celebrá-lo? E o quê, afinal de contas, estamos celebrando? 

Para os cristãos, o Natal é a Grande Festa da Natividade na carne de Nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo. Com eloquência inspiradora, São João, o Teólogo, escreve: “No início era o Logos, e Logos estava com Deus, e o Logos era Deus” (Jo. 1:1) 

O Logos, Jesus Cristo, é o eterno Filho de Deus, e a porta do mistério de Sua Encarnação é aberta com a belíssima hinologia da Igreja. S. José, o Hinógrafo, canta: “O Filho do Pai...surgiu para nós... para dar a luz aos que estavam nas trevas e reunir os dispersos. Portanto, louvamos a gloriosa Teotókos” (A Natividade do Senhor, manuscrito bizantino, século 14, Mosteiro de Cutlumus, Monte Athos).

S. João de Damasco escreveu o hino: “Um gloriosíssimo mistério ocorre hoje: a natureza renova-se, e Deus torna-se homem. O que Ele era, continua sendo; e o que não era, chamou a Si, sem mistura ou divisão”. 

Utilizando a teologia ortodoxa como referência, podemos dar subsídios para que a celebração de Natal nos ajude a ter uma vida mais plena – uma vida no espírito (cf. Gal 5:25). 

Comecemos com o ponto fundamental que foi experienciado e transmitido pelos Pais da Igreja: que Deus tornou-se homem para que o homem se tornasse participante da natureza divina (cf 2Pedro 1:4) através da graça e adoção (cf. Efésios 1:5). A Encarnação de Cristo nos convida todos nós a sermos santos (cf 1Pedro 1:16); ser santo não é algo que Deus quer para um pequeno número de pessoas, um objetivo além da capacidade das pessoas normais – é para cada um de nós, em todos os lugares do planeta. 

A Igreja Ortodoxa não é uma ideologia, uma filosofia ou um conjunto de regras rígidas e legalísticas. Igualmente, Deus não é uma ideia abstrata, uma Pessoa sem rosto com Quem não há possibilidade de comunicação. 

A fé ortodoxa prega um Deus pessoal: Pai, Filho e Espírito Santo – Três Pessoas, uma Soberania. Deus Se revela para nós através de Jesus Cristo, o Homem-Deus (“Theantropos”, em grego). 

Em um sermão de 1990 realizado pelo abade do Santo Mosteiro de São Gregório no Monte Athos, o falecido e abençoado Arquimandrita George ecoava os Pais da Igreja: “O Deus inalcançável torna-se alcançável. O Deus desconhecido torna-se conhecido. O Deus distante torna-se familiar e um amigo”. 

No Natal, celebramos a destruição da barreira que separava o homem de Deus. E como sabemos que essa barreira foi realmente destruída? Por um lado, através dos santos da Igreja. Os santos provam que o homem pode comunicar-se pessoalmente com Deus e vê-Lo. 

“Santos”, de acordo com o renomado teólogo do século 20, Pe. John Romanides, “é o nome dado àqueles que, através da purificação e iluminação, alcançam a glorificação (teósis) e participam das glorificantes energias de Deus”. 

Assim, a Ortodoxia é uma ciência positiva, a experiência da revelação, e não especulação. É a experiência de comunicar-se com Deus através da oração, especialmente da oração noética. É a experiência de nos comunicarmos com Deus pela vivência da Sua Vontade, no jejum, nas esmolas, sendo humildes e amando-nos uns aos outros. É a experiência de comunicarmo-nos com Deus adotando um vida centrada em Cristo na Igreja, e participando nos Santos Sacramentos, especialmente a confissão/arrependimento e a comunhão eucarística. 

É a experiência de ter a verdadeira liberdade, não a pseudo-liberdade e as armadilhas que o mundo oferece. Ao contrário do que dizem muitos críticos, o Cristianismo autêntico não restringe o homem, mas ao contrário, devolve-lhe a liberdade de viver. Dá luz aos que estão nas trevas. 

Esse é um desafio para toda a vida, uma escada que subimos degrau a degrau. E como sabemos se estamos realmente progredindo, se de fato estamos vivendo no espírito? Basta vermos se cultivamos os frutos do Espírito Santo: amor, alegria, paz, perseverança, caráter, bondade, fé, serenidade e autocontrole (cf Gal 5:22-23). 

Tudo isso só é possível por causa do Natal. Escolhamos celebrá-lo corretamente.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Patriarca Bartolomeu em Lyon

Em 2009, Sua Santidade, o Patriarca Ecumênico Bartolomeu, na 13a. Conferência das Igrejas Européias, em Lyon, França, fez este belo pronunciamento:

Viemos a Lyon, de Constantinopla, do Fanarion, que é o domicílio paternal de todos nós – nosso lar! E trazemos o amor, as intenções e bênçãos da Igreja Mãe! Viemos para ver seus rostos alegres e rejubilarmo-nos em sua diligência. 

Temos certeza de que, sob o vigilante cuidado pastoral de seu bom pastor, amado irmão e nosso co-celebrante, Sua Eminência Metropolita da França, Emmanuel, assim como seus piedosos padres de tempos em tempos, têm lutado para preservar a menina de seus olhos, a herança de seus pais, isto é, a Fé Cristã Ortodoxa, graças, por um lado, aos santos mártires de Lyon que sacrificaram sua vida e sangue, junto com milhões de outros naturalmente, por todo mundo, desde a antiguidade até nossos tempos, e por outro graças à grande civilização, língua e tradição cultural helênica que, de uma forma ou outra, corporificam os fundamentos da civilização europeia contemporânea. 

A presença de representantes de outras Igrejas Ortodoxas na Divina Liturgia de hoje sublinha precisamente esta verdade: de que nós ortodoxos somos todos um só lar, uma só alma, um só coração, uma só voz – a despeito das descendências nacionais e linguísticas ou das diferenças culturais! Esse, infelizmente, não é o caso com todos os que confessam a fé em Cristo no geral. 

Como não possuímos um ensino dogmático e uma confissão em comum com eles, não podemos ter uma Eucaristia em comum, nem um Cálice em comum – o que nos entristece profundamente, mas Cristo entristece-se ainda mais – Ele que disse que deseja que todos sejam um, como Ele é um com o Pai e o Espírito Santo. 

Obedecemos a um dever de amor, conversando honestamente e responsavelmente com aqueles que não pertencem ao seio da Igreja Ortodoxa e portanto deixamos o Espírito Santo agir como Ele achar que deve. É nosso dever não nos isolarmos egoisticamente dentro de nossa autossuficiência, assim colocando a nós mesmos em risco junto com aqueles que “retêm a verdade na injustiça”, porque o tesouro da Verdade, que herdamos, potencialmente pertence a todos e quantos mais tornarem-se seus comunicantes, mais irá aumentar o Corpo de Cristo e maiores serão nossas recompensas no Senhor! 

Na crise multi-facetada de nossos dias, que é moral, social, ambiental, financeira e, principalmente, espiritual, nós cristãos não temos espaço para o desespero! Cristo, Seu Evangelho, Sua Igreja, são imaculados e são nossa esperança certa! E devemos abrir o peito para essa esperança: não apenas europeus, mas todos os povos da terra! Roguem, meus irmãos e filhos em Cristo, que o Espírito Santo possa guiar todas as pessoas para a luz dessa esperança!

Fontes:

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

O Papa Não Disse Que Não Há Mais Impendimentos à Intercomunhão


Surgiu nas redes sociais mais uma distorção das palavras do Papa Francisco, afirmando que o Papa teria declarado que não há mais impendimento para a intercomunhão entre fiéis da Igreja Católica Ortodoxa e os fiéis da Igreja Romana.


Não foi isso que o Papa disse. Sobre o assunto ele declarou especificamente: 

"não há mais nenhum impendimento à comunhão Eucarística que não possa ser superado através da oração, da purificação dos corações, do diálogo e da afirmação da verdade. "

O que o Papa disse, utilizando o pronome relativo "que" para qualificar o tipo de impendimento que seria predicado em seguida, é que os impedimentos, concretos e existentes, podem vir a ser superados no futuro mediante oração, purificação dos corações, diálogo e afirmação da verdade. Dizer que não existem impendimentos insuperáveis é muito diferente de dizer que não existem impedimentos ou que os impedimentos existentes foram já superados.

O Papa também afirmou sobre o mesmo assunto:

"Embora nem todas as diferenças entre as Igrejas Católica e Ortodoxa tenham chegado ao fim, já existem agora as condições necessárias para uma jornada (...)" 

Ou seja, ele reconhece textualmente que há diferenças persistentes hoje em dia, embora haja condições para o início de uma jornada. Mas a intercomunhão é o *fim* da jornada, não o início. Para que essa jornada chegue ao fim é necessário, como disse o Papa, a afirmação da verdade.

Sobre a questão da união em particular, ele concluiu dizendo:

"O próprio diálogo teológico, mantido pela caridade mútua, deve continuar a examinar cuidadosamente as questões que nos dividem"

Ou seja, existem questões que nos dividem, especificamente sobre qual é a verdade a respeito do papel do Primeiro-Entre-Iguais na Igreja e sobre a correção ou não do uso do filioque no Credo.


Essas "afirmações da verdade" precisam ser discutidas no diálogo teológico marcado, naturalmente, pela caridade mútua. Devemos manter em mente, porém que a esperança da Igreja Romana é que a Igreja Ortodoxa "reconheça" como verdadeiras as heresias da infalibilidade papal bem como sua jurisdição suprema, universal, ordinária e extraordinária. 

Ao mesmo tempo, a Igreja Ortodoxa anseia que Roma tenha a humildade de reconhecer que errou ao afirmar tais coisas e possa reunir-se à Igreja Mãe de Jerusalém e suas irmãs petrinas mais velhas, as sés de Antioquia e Alexandria.

Segue abaixo a tradução do texto completo da mensagem do Papa Francisco ao Patriarca Ecumênico Bartolomeu.



Para Sua Santidade, Arcebispo de Constantinopla, Patriarca Ecumênico

Sua Santidade, Amado Irmão em Cristo



Um ano passou-se desde que celebramos juntos, na Igreja Patriarcal no Fanar, a festa de Santo André, o Apóstolo primeiro chamado e irmão de São Pedro. A ocasião foi um momento de graça que permitiu-me renovar e aprofundar, em orações compartilhadas e em um encontro pessoal, os laços de amizade com você e com Igreja que preside. Foi também com alegria que experienciei a vitalidade de uma Igreja que incessantemente professa, celebra e oferece testemunho da fé em Jesus Cristo, nosso único Senhor e Salvador. Estou feliz mais uma vez de enviar uma delegação da Santa Sé às celebrações Patronais como um sinal tangível de minha afeição fraternal e da proximidade espiritual da Igreja de Roma com Sua Santidade, assim como com os membros do Santo Sínodo, clero, monges e todos os fiéis do Patriarcado Ecumênico.


Em nossa profunda comunhão de fé e caridade, e gratidão por tudo que Deus realizou por nós, eu relembro o quinquagésimo aniversário em 07 de dezembro de 2015 da Declaração Conjunta Católico-Ortodoxa do Papa Paulo VI e do Patriarca Ecumênico Atenágoras I, que expressaram a decisão de remover da memória e do meio da Igreja as excomunhões de 1054. A memória das sentençãs mútuas de excomunhão, junto com as palavras ofensivas, censuras infudadas e gestos repreensíveis de ambos os lados, que acompanharam os tristes eventos desse período, representaram por muitos séculos um obstáculo para a reaproximação em caridade entre Católicos e Ortodoxos. Atentos à vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo, que orou ao Pai na véspera de sua Paixão que seus discípulos "sejam um" (Jo. 17:21), o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágoras I consignaram tais memórias dolorosas ao esquecimento. Desde então, a lógica do antagonismo, desconfiança e hostilidade que eram simbolizados pela excomunhão mútua foram substituídos pela lógica do amor e da amizade, representadas por nosso abraço fraternal.


Embora nem todas as diferenças entre as Igrejas Católica e Ortodoxa tenham chegado ao fim, já existem agora as condições necessárias para uma jornada em direção ao restabelecimento da "plena comunhão na fé, no acordo fraternal e na vida sacramental que existia entre elas nos primeiros mil anos de vida da Igreja" (Declaração Conjunta Católico-Ortodoxa, 07 de dezembro de 1965). Tendo restaurado a relação de amor e fraternidade, em espírito de confiança mútua, respeito e caridade, não há mais nenhum impendimento à comunhão Eucarística que não possa ser superado através da oração, da purificação dos corações, do diálogo e da afirmação da verdade. De fato, onde há amor na vida da Igreja, sua fonte e plena realização sempre estará no amor Eucarístico. Assim também o símbolo do abraço fraternal encontra a mais profunda verdade no abraço de paz realizado na celebração Eucarística.


Com o fim de progredir em nossa jornada na direção da plena comunhão pela qual ansiamos, devemos continuamente inspirar-nos naquele gesto de reconciliação e paz de nossos veneráveis predecessores Paulo VI e Atenágoras I. Em todos os níveis e em todos os contextos da vida da Igreja, as relações entre Católicos e Ortodoxos deve progressivamente refletir a lógica do amor que não deixa espaço para o espírito de rivalidade. O próprio diálogo teológico, mantido pela caridade mútua, deve continuar a examinar cuidadosamente as questões que nos dividem, buscando sempre um aprofundamento de nossa compreensão mútua da verdade revelada. Motivados pelo amore de Deus, devemos juntamente oferecer ao mundo um testemunho crível e efetivo da mensagem de Crsito de reconciliação e salvação.


O mundo hoje tem grande necessidade de reconciliação, particularmente à luz de tanto sangue que tem sido derramado em ataques terroristas recentes. Que possamos acompanhar as vítimas com nossas orações, e renovar nosso compromisso com uma paz duradoura promovendo o diálogo entre as tradições religiosas, pois "indiferença e ignorância mútua só podem levar à desconfiança e, infelizmente, até a conflitos" (Declaração Comum, Jerusalém 2014).


Quero expressar minha profunda apreciação pelo fervoroso compromisso de Sua Santidade com o assunto crítico do zelo pela criação, pois sua consciência e sensibilidade são um testemunho exemplar para os Católicos. Creio que é um sinal de esperança para Católicos e Ortodoxos que agora celebremos juntos anualmente um Dia de Oração pelo Zelo com a Criação em 01 de setembro, seguindo uma duradoura prática do Patriarcado Ecumênico. Quanto a tal assunto, garanto-lhe minhas orações pelo importante encontro internacional do meio-ambiente que ocorrerá em Paris e que você irá participar.


Sua Santidade, é necessário que a humanidade redescubra o mistério da misericórdia, "a ponte que conecta Deus ao homem, abrindo corações à esperança de ser amado para sempre a despeito de nossos pecados" (Misericordiae Vultus, 2). Por essa razão, eu convoquei um Jubileu Extraordinário da Misericórdia, um tempo favorável para contemplarmos a misericórdia do Pai revelada plenamente em seu Filho, Jesus Cristo e para nos tornarmos nós mesmos um sinal efetivo do amor de Deus através de nosso perdão mútuo e trabalhos de misericórdia. É providencial que no aniversário da histórica Declaração Conjunta Católico-Ortodoxa sobre a remoção das excomunhões de 1054 ocorra na véspera do Ano da Misericórdia. Seguindo o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágoras I, Católicos e Ortodoxos hoje devem pedir perdão a Deus e uns aos outros pelas divisões que os Cristãos provocaram no Corpo de Cristo. Peço-vos e a todos os fieis do Patriarcado Ecumênico que orem para que esse Jubileu Extraordinário possa trazer os frutos espirituais que desejamos. Garanto-lhes voluntariamente minhas orações pelos eventos que sua Igreja irá celebrar no ano por vir, especialmente o Grande Sínodo Pan-Ortodoxo. Que essa importante ocasião para todas as Igrejas Ortodoxas possa ser uma fonte de abundantes bençãos para a vida da Igreja.

Com afeição fraternal no Senho, garanto-lhe de minha proximidade espiritual na alegre festa do Apóstolo André, e voluntariamente abraço Sua Santidade na paz do Senhor Jesus.



Do Vaticano, 30 de Novembro de 2015
Francisco PP.