A
vida cristã ortodoxa é toda sacramental. Isto significa que ao nos tornarmos
membros do Corpo de Cristo *tudo* que fazemos, inclusive no dia-a-dia, é um
mistério e um sacramento, pois ou é preparação para dar expressão ao Espírito
Santo que habita em nós caso façamos parte da Igreja Ortodoxa, ou é expressão
do Espírito Santo através de nós, especialmente entre aqueles de vida
espiritual desenvolvida.
A
verdade é que se nosso coração for pequeno, se estiver escurecido e fechado,
pouca ou nenhuma diferença existirá entre nós e os perversos. Como com nosso
corpo, para melhorarmos nosso coração espiritual, precisamos nos exercitar para
ficarmos mais fortes e saudáveis. Este exercício espiritual é chamado ascese. A vida dedicada ao exercício
espiritual é chamada de vida ascética. A vida cristã ortodoxa é sempre
ascética.
E
que exercícios são esses? Fundamentalmente quatro: arrependimento e jejum, amor
e oração.
O
arrependimento e o jejum são a arte de dizer não para as coisas que devemos
afastar de nossa vida.
Arrependimento
Você
já reparou como para manter uma casa limpa temos que: encontrar onde estão as
sujeiras, mesmo as que ficam escondidas atrás de móveis, embaixo de tapetes ou
nos pelos do tapete? Depois, temos que reunir essa sujeira toda em um só lugar.
Para isso usamos ou uma vassoura ou um aspirador de pó. Depois que a sujeira
está reunida, colocamos em um saco e finalmente, colocamos o saco em algum lugar
para ser recolhido pelos lixeiros que recebem autorização para fazê-lo das
autoridades superiores, e que irão leva-lo ao seu destino final, destruindo-o
ou reciclando-o, conforme tenha sido determinado pela autoridade municipal.
O
arrependimento é semelhante a esse processo. Buscamos nossos pecados nos
recantos mais escondidos de nossas mentes e corações. Eles ficam escondidos
embaixo de desculpas, racionalizações, ilusões, hábitos, paixões, visões e
valores de mundo equivocados, medos, mágoas, ressentimentos, raivas e ódios.
Normalmente o mais escondido deles é o ódio a Deus, a Quem culpamos por as
coisas serem como são. O auto-exame espiritual é esse momento de busca
interior. Depois nós os “juntamos” encontrando palavras que os expressem,
mantendo-os na memória. Finalmente, levamos nossos pecados e faltas até o
padre, que recebeu a autoridade de Deus, para o sacramento de ouvir a confissão
e proclamar perdoados os pecados.
Quem perdoa é Deus, mas o faz através das
palavras do padre. Deus então destrói nossos pecados se forem coisas
exclusivamente ruins, e se forem coisas boas que tinham sido mal-usadas, irá
“recicla-los”, transformando-os em bons novamente. O arrependimento deve ser emocional e
racional, isto é, não basta a gente “deixar pra lá” o mal que fizemos. Temos
que sentir a culpa e a vergonha de tê-lo feito, a inteligência e a honradez de
admiti-lo, e a bravura de lidar com as consequências confessando e buscando uma
nova vida.
O arrependimento nada tem a ver com a culpa
paralisante, que apenas nos deixa deprimidos mas não muda nada. Também não tem
nada a ver com a atitude bem moderna de justificar termos ferido a Deus, outras
pessoas e a nós mesmos dizendo que era “necessário para o aprendizado, eu não
tinha como fazer diferente naquela situação”. Esta é apenas um daqueles
tapete-desculpas debaixo do qual escondemos nossa baixeza. No arrependimento
real teremos vergonha de nós mesmos e não orgulho. Um homem que se “arrependa”
e “confesse” dizendo “Roubei 100 mil da empresa em que trabalho, padre! Mas
prometo que não vou fazer de novo” não está confessando nada. Está é contando
vantagem de forma indireta, vangloriando-se do seu pecado, agravando o crime
que cometeu e ainda tenta vender uma promessa de não repetir o mal como troca
para não sofrer as consequências do mal já cometido. Uma real confissão seria
algo como “Sou pior que um bicho padre! Agi como um animal age, minha dignidade
de homem foi atropelada por meus impulsos que eu não soube controlar, traí quem
confiou em mim, prejudiquei várias pessoas que sofreram as consequências do meu
ato sem nem compreender a origem do mal que caiu sobre elas. Fui vil, vil no
pior sentido da palavra”. Sabemos que estamos nos arrependendo de verdade
quando sentimos verdadeira culpa e vergonha e quando essa vergonha *passa* com
a confissão. A vergonha ou culpa que não passam normalmente não estão
relacionadas com pecados verdadeiros, mas com pecados imaginados, ou
exagerados. Ficar sentindo-a e ressentindo-a é uma forma precisamente de não
encarar os verdadeiros pecados, como se ao limparmos a casa ficássemos passando
o aspirador na parte mais fácil da casa para não ter que iniciar a limpeza
pesada do banheiro.
Jejum
Se
o arrependimento constitui o remédio, o jejum é a prevenção da doença. O jejum
consiste em dizer não para as coisas, estilos de vida, valores, situações,
locais e pessoas que podem nos levar ao pecado. O jejum de comida propriamente
dito é um exercício para o jejum das coisas espirituais, mas nem por isso é
menos importante. Lembre-se que o primeiro pecado da humanidade foi desobedecer
o jejum de comida. Adão e Eva tinham todo um jardim com frutas deliciosas e
nutritivas a sua disposição, oferecidas por seu Pai. O jejum deles era muito
simples: podiam comer de tudo, menos uma fruta em particular. Mas pela
influência da serpente quebraram este jejum e a morte entrou no mundo. Reparem
também que o jejum que Nosso Senhor Jesus Cristo fez no deserto por 40 dias era
de comida, mas foi concluído com um jejum espiritual, quando ele diz não para
as três tentações do diabo: resolver todos os problemas com um passe de mágica
(transformar pedra em pão), ficar desafiando Deus a fazer mágica como se isso
fosse fé (“não tentarás o Senhor Teu Deus”), e finalmente tentar criar um mundo
perfeito neste mundo mesmo, antes do Juízo Final, através do poder político (o
diabo disse a Cristo que era o rei do mundo e que colocaria os reinos do mundo
aos pés pacíficos de Cristo se apenas se ajoelhasse e o adorasse). Cristo
jejuou espiritualmente, disse não para tais coisas e assim concluiu o jejum que
se iniciara apenas com comida.
Vivemos
em uma sociedade que é cristã apenas no nome. Nossa cultura, que foi posta em
nós até em nível subconsciente desde criancinha, nos ensina apenas coisas que
fazem chorar o Cristo e Nossa Senhora. Quando vemos os miraculosos ícones que
choram, alguns choram até sangue, saiba que é por causa do nosso estilo de vida
imerso onde aprendemos a amar o pecado que eles choram. Somos ensinados a odiar
a Deus, considerar Seus caminhos antiquados, promotores de ódio,
supersticiosos, selvagens, ignorantes, superados, intolerantes e nem mesmo
consideramos a hipótese de que aqueles que nos ensinaram isso é que estivessem
errados. Colocamos autoridades humanas e pecadoras como dignas de nossa
credulidade e Deus como uma ideologia mais ou menos boa e, mesmo assim, boa
apenas na medida em que repita aquilo que acreditam os ‘grandes’ desse mundo
material e grosseiro. Novelas cheias dos piores valores, filmes onde o grotesco
é engradecido e o amor é tratado como mera desculpa para o sexo, livros que
incentivam o orgulho e a vaidade intelectuais, ritmos musicais, estilos de
dança, peças de teatro, estátuas, pinturas, arquitetura e até mesmo “missas” e
“cultos” religiosos que deformam nosso senso estético e agridem nossa alma
tratando o vulgar, baixo, grotesco, caótico, barulhento, o desespero, a
agonia, o alucinante, o histérico, o
blasfemo, o depressivo e vazio de
sentido como se fossem belos e
desejáveis; políticos e ideologias que valorizam as forças da morte e da
desordem e zombam das forças da vida e da ordem, achando que irão trazer o
paraíso através da destruição. Nossa cultura está semelhante à nossa
alimentação: cheia de “junk food” (“comida lixo”, esses lanches rápidos,
engordativos, sem valor nutritivo e até ruins para a saúde). O cristão ortodoxo
não tem nada contra a cultura em si, mas a cultura de nossa época é sim algo a
ser evitado e devemos jejuar dela, buscando os resquícios da alta cultura
secular espalhados aqui e ali e a tradicional cultura religiosa, nas liturgias,
arquitetura e nos ícones em estilo tradicional e na música bizantina ou
gregoriana.
Devemos
também jejuar de nossas próprias tendências e gostos excessivos ou deturpados,
que nos consomem diariamente, quaisquer que sejam eles, e essa é a luta mais
difícil de todas. É incessante e perene, nos acompanhando até o último suspiro.
O
jejum de comida, como podem ver, é apenas um exercício simples que disciplina
nossa vontade e nossa atenção.
Na
Igreja Católica Ortodoxa, temos três tipos de jejuns de comida (nota: essa
denominação é sugerida por esta apostila, para fins didáticos. Ela não é
normativa na Igreja Ortodoxa):
1. O Jejum
Rigoroso, no qual nenhum tipo de
sólido ou líquido é ingerido; é o mais raro de todos e normalmente dura apenas
um dia.
2. O Jejum
Completo, no qual jejuamos de óleos,
álcool, e proteína animal (carnes vermelha e branca, ovos e laticínios);
3. O Jejum
Parcial, no qual alguns dos
alimentos do Jejum Completo são liberados
Períodos de
Jejum
- · na Quaresma de Páscoa (40 dias antes da Páscoa) – Dias da Semana: Jejum Completo / Fim-de-Semana: Vinho e óleos são permitidos / Dia da Anunciação, caso caia na Quaresma e outros dias de santos importantes: Peixe, vinho e óleos são permitidos / Sexta-Feira da Paixão: Jejum Rigoroso
- · no Jejum da Dormição de Nossa Senhora (1 de agosto a 14 de agosto) – Dias da Semana: Jejum Completo / Fim-de-Semana: Vinho e óleo são permitidos;
- · na Quaresma de Natal (40 dias antes do Natal)- Segundas, Quartas e Sextas-Feiras: Jejum Completo / Terças e Quintas: Vinhos e óleos são permitidos / Fins-de-Semana e dias de santos: Peixe, vinho e óleos são permitidos ;
- · no Jejum dos Santos Apóstolos (2ª segunda-feira depois do Pentecostes até o dia de São Pedro e São Paulo, 29 de junho) – Quartas e Sextas-Feiras: Jejum Completo / Todos os outros dias da semana: Peixe, vinho e óleos são permitidos;
- · Todas as Quartas e Sextas-Feiras do ano (exceto nas semanas após o Natal e a Páscoa): Jejum Completo / Se cair algum dia de santo importante no dia: Peixe, vinho e óleos são permitidos.
Quando
Podemos aliviar ou estamos isentos do jejum?
O
jejum não é uma regra moralista, mas um exercício espiritual. Ninguém é melhor
ou mais amado por Deus simplesmente por jejuar. Sendo assim, se a pessoa percebe que o jejum
está tão rigoroso que está lhe fazendo mal fisicamente – alterando pressão,
criando problemas digestivos, deixando fraca demais, ela deve retornar a
alimentação normal, se fortalecer e tentar um jejum menos rigoroso dali para
frente – por exemplo abster-se apenas de carne vermelha, ou apenas de
laticínios, ou apenas de álcool. Idealmente deve fazer isso com orientação do
padre ou um pai espiritual, mas se não tiver nenhum disponível, deve buscar
fazer o jejum o mais próximo possível da regra sem que isso se torne uma
agressão ao corpo. O Jejum *não* é uma forma de auto-castigo! É um exercício,
feito para melhorar sua vida espiritual, não para te deixar doente! Exagerar no
jejum é um grande pecado de vaidade espiritual.
De
forma geral são completamente isentos de jejuar: as crianças muitos pequenas,
bebês, gestantes, mães em período de amamentação, idosos, pessoas com doenças
temporárias ou permanentes, pessoas com algum tipo de dieta ou restrição
alimentar especial por questões médicas, seja temporária ou permanente,
viajantes que estejam em uma situação na qual a única comida a disposição seja
fora do jejum, pessoas que estejam em uma situação na qual recusar uma refeição
fora de jejum seria cometer um pecado maior contra o amor ao próximo, por
exemplo, fazendo desfeita de uma refeição oferecida amorosamente por um parente
ou amigo que não conhece a regra do jejum. Neste último caso, se surgir um
momento oportuno, pode-se explicar a pessoa que em determinadas ocasiões você
jejua e que você mesmo se responsabilizará de avisá-la com antecedência caso te
convide de novo.
Amor
Já
dizia o Apóstolo que sem o Amor, nada mais adianta.
Apesar
disso, existe muita confusão em nossa cultura sobre o que é o amor. Ele não consiste em se deixar agredir
desnecessariamente, em se deixar vulnerável às más intenções dos perversos, não
consiste em tratar os perigosos como se fossem inofensivos, os injustos como
justos, o feio como belo, o errado como certo, o mal como bom, não é perdoar o
que não se arrepende (embora deixar para trás o não-arrependido obstinado possa
ser amor sim), não é tratar o vício como um “detalhe” da personalidade da
pessoa, premiar o que não foi merecido, reagir ao indigno como se fosse digno
ou em permanecer perto de quem nos odeia e deseja nos ferir, amar não é
proteger o culpado não-arrependido das consequências dos seus atos; às vezes
não é proteger nem mesmo o arrependido das consequências dos seus atos. O amor
não é uma vida morna, nem uma vida de barulho e agitação. Não é paixão, não é
sonho, não é fantasia , não é apego, não é ficar implicando ou ofendendo um ao
outro “de brincadeira”, não é sexo “selvagem”; Infelizmente, muitos filmes,
novelas, músicas e livros chamam todas essas coisas de amor sem que o sejam.
O
amor consiste em desejar o bem da pessoa amada (que nem sempre é o que vai
deixa-la feliz!) e, na medida em que esteja dentro de nossas forças e que essa
pessoa esteja em condições de desejar e permitir, sermos parte desse bem de
alguma forma. O perdão é a aceitação do arrependimento e é um componente do
amor.
Mas
estejamos atentos. Se amamos o que não devia ser amado, incorremos em grande mal.
Em nossa cultura contemporânea costumamos dizer ser “justa toda forma de amor”,
independente do seu objeto e da forma como realizamos esse amor. Jesus Cristo
ensinou que jogar pérolas aos “porcos” também é um pecado. Nossa mais preciosa
pérola é o nosso amor e oferece-lo a uma causa, grupo, atividade ou pessoa
indigna, ou vive-lo de uma forma indigna e proibida por Deus, é atirar pérolas
aos porcos. Assim como Deus concede uma vocação a cada um de nós, está incluso
nessa vocação os objetos e modos de nosso amor. Não, nem toda forma de amor é justa,
pois existem amores de perdição e amores de salvação. O amor é o maior dos bens
quando é direcionado a algo ou alguém digno dele e direcionado na forma e modo
igualmente dignos. Porque Deus é o mais digno de ser amado temos o primeiro
mandamento: Amar a Deus acima de todas as outras coisas. Apenas quando
corretamente amamos Deus acima de qualquer pessoa, causa ou coisa, conseguimos
colocar tudo no seu devido lugar e proporção. Amar sim, mas amor de salvação,
começando com Deus e nos termos de Deus, que apenas deseja o nosso bem.
Outro
grande equívoco de nossa época é o mito do “amor incondicional”. Este termo é
uma forma suave, infelizmente, de dizer “direito de desrespeitar” seja de uma
das partes ou de todas envolvidas umas às outras. O amor verdadeiro é
necessariamente condicional. Naturalmente, Deus potencialmente ama a todos nós.
Mas este amor só se expressa em nós sob condições bem específicas. Em todas as
Santas Escrituras temos vários exemplos de algo como “se agires desta forma,
então terás a graça do Senhor”, “quando fizeres deste modo, então o Senhor se
compadecerá” e, de forma oposta, mais de uma aviso para que não caiamos na
“ira” do Senhor. É verdade que Deus não
faz distinção de cor, sexo, classe social ou nacionalidade. Mas ele *faz*
distinção de caráter. É verdade também que Ele está disposto a receber o mau
arrependido, mas Ele não trata o mau como o bom e não ama os dois. Basta ver
como ele se dirige aos bons nas bem-aventuranças e o tom oposto entre irado e
decepcionado para com os hipócritas e perversos, nos “ais” ou na expulsão dos
vendilhões do Templo. Podemos dizer que Deus ama a todos apenas se
compreendermos que a ira contra os maus é uma forma de amá-los, impedindo-os de
praticar o mal contra si mesmos e contra o próximo. Assim também em nossas
relações pessoais. Nosso amor *deve* ser condicional, exigindo condições
diferentes a depender do tipo de relação que temos: na relação de pais e
filhos, os pais têm o direito de exigir o devido respeito e os filhos, na
medida em que amadurecem, de exigir espaço para viverem como adultos; na
relação entre professores e alunos, igualmente, o professor tem o direito de
exigir respeito e comprometimento do aluno, e o aluno de que o professor
demonstre conhecer o que ensina e estar comprometido em ensinar; nos
relacionamentos amoroso que haja respeito e admiração mútua, sem jogos de poder
ou exigências tóxicas; entre a pessoa que pratica e a que recebe caridade deve
a primeira exigir uma contraparte que mostre que não está desperdiçando
recursos que outro necessitado poderia estar utilizando, e o que recebe tem o
direito de exigir ser tratado como alguém capaz e que logo irá cuidar de si
mesmo e não ser tratado como criança ou dependente.
Quem
quer que exija, de forma direta ou indireta, ser amado incondicionalmente e até
contra o nosso bem, está, normalmente, desejando o nosso mal. Nem mesmo Deus
exige amor incondicional. Ele mesmo nos convida a experimentar: “Vem e
experimenta que o Senhor é bom”.
Oração
Orar
é conversar com Deus e mais. Orar é se colocar na presença dEle
espiritualmente. Deus está em toda parte, mas quase nunca nós estamos com Ele,
porque nosso coração está definhado, murcho, quase morto.
A
oração é a vida do coração. Mas como pode um coração doente orar corretamente,
olhar para o “lado” que Deus está se não vê nada na escuridão em que se
encontra? Por isso existem as orações prontas da Igreja Católica Ortodoxa,
nascidas de corações santos, constantemente na presença de Deus.
Claro
que Deus escuta nossa prece mesmo quando a fazemos com palavras simples. Mas se
usarmos essas “vitaminas” que a Igreja oferece, Deus ficará cada vez mais claro
para nosso coração, sentiremos Sua presença de forma cada vez mais nítida. É
como se estivéssemos aprendendo música. Nosso ouvido já é capaz de ouvir os
sons do jeito que eles aparecem. Mas se estudarmos as músicas prontas por
outros músicos, especialmente se nós mesmos as repetimos prestando atenção nos
seus detalhes, nosso ouvido vai se apurando, aprendendo a perceber sutilezas
que antes não percebia e até mesmo ouvindo o que antes não ouvia.
Assim
é com o nosso coração, a orações da Igreja e Deus. Existem muitas formas de
orar na Igreja. Podemos orar com palavras, mas também podemos orar com todo o
nosso corpo e é por isso que fazemos o sinal da cruz, nos curvamos, nos
ajoelhamos, beijamos ícones. Cada gesto desses é uma oração que fazemos com
nosso corpo. É por isso que oramos juntos na Divina Liturgia. Estarmos juntos é
uma forma de oração. Finalmente, existe
a chamada oração do coração. Quando uma pessoa atinge um certo grau de abertura
do coração e a luz do Espírito Santo verte dele como mirra abençoada iluminando
o mundo, então aquilo a que as palavras da oração se referiam está acontecendo
de fato no coração deste santo. O Espírito Santo habita na pessoa e seu coração
ora incessantemente, pois a presença de Deus já faz parte do seu ser. A grande
meta da vida do cristão ortodoxa deve inclusive ser essa: alcançar a oração
incessante e se tornar Templo Vivo do Espírito Santo. Quando isso acontece, é
um prelúdio do céu na Terra.
Nós
que somos crianças na vida espiritual muitas vezes até pensamos que sabemos
orar. Deus certamente nos ouve sempre, mas seria bom que nós também ouvíssemos
o que Ele ouve quando estamos orando, pois a verdadeira oração, a que Deus
ouve, é a que está lá no nosso coração e nem sempre a que está nos nossos
lábios. As orações que a Igreja oferece ensinam nossos corações a falar com
Deus e nossos pensamentos e palavras a refletirem o que está em nossos
corações. Com o tempo, quando falamos com Deus, nosso coração fala com
sinceridade, verdade e fé.
Para
começar, o ideal é que tenhamos uma “Regra de Oração”, ou seja, uma rotina
diária de orações que fazemos de modo regular. É essa repetição que vai
fortalecer nosso coração para que um dia ele possa “orar sem cessar” que é uma
das metas da vida do cristão, pois quem não quer estar constantemente na
presença da pessoa que ama? E, como dito, a oração é colocar-se na presença de
Deus. Você encontrará no final da
apostila uma regra de oração simplificada, que deverá servir provisoriamente
até que você encontre um padre ou pai ou mãe espiritual que lhe indique uma
mais adequada para seu caso particular.
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