terça-feira, 14 de agosto de 2012

A Dormição da Teotókos


A Dormição da Teotókos

Sua Santidade Bartolomeu I

[© Reuters/Contrasto] - http://www.30giorni.it/articoli_id_23386_l3.htm


Bartolomeu I Patriarca Ecumênico de Constantinopla, durante a festa da Dormição da Santa Mãe de Deus, no monastério de Sumela, na pronvíncia Turca de Trebizonda, 15 de agosto de 2010

A Igreja Ortodoxa venera profundamente a Mãe de Deus - ou Teotókos (parturiente de Deus) ou Panaguia (Toda Santa), como preferimos nos referir a ela - exaltando-a não como uma santa exceção mas como de fato um sólido exemplo do modo cristão de compromisso e resposta à vocação de ser discípulo de Cristo. Maria é extraordinária apenas em sua virtude humana normal, a qual somos chamados a emular e respeitar como cristãos devotos. Sua morte é comemorada no dia 15 de agosto, sendo uma das doze grande festas do calendário ortodoxo.

E, para compreender a "aliança sagrada" ou o mistério de Maria, do qual "ninguém pode aproximar-se com mãos não iniciadas", a teologia ortodoxa busca as Escrituras, e especialmente a Tradição, particularmente a liturgia e a iconografia.Os cristãos ortodoxos lembram de Maria primeiramente por seu papel na encarnação Divina, isto é como Mãe de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Ao mesmo tempo, a conectamos a uma longa linhagem de seres humanos, e não divinos, que compõem a continuidade da história sagrada que leva ao nascimento do Filho de Deus, Jesus de Nazeré, dois mil anos atrás. Separar Maria desta linhagem preparatória ou "econômica" a desconecta da nossa realidade e a marginaliza de nossa salvação - como todos os seres humanos; mesmo quando ela é considerada "sem pecados pessoais", ainda assim, ela estava sob o a opressão do pecado original. Embora ela seja "mais venerável que os querubins e incomparavelmente mais gloriosa que os serafins", o que é verdade a nosso respeito, também é verdade a respeito de Maria. Ela é "bendita entre as mulheres", e encarna a única coisa necessária a todos os seres humanos: a dedicação à Palavra de Deus e a rendição à vontade de Deus.

Portanto, enquanto os Cristãos Ortodoxos oram de pé na Igreja e olham para cima para o Pantokrator (ou "Soberano do Universo"), ou seja, o Cristo, que ergue-se acima de suas cabeças durante a adoração, eles encaram diretamente a Platytera (ou "A Mais Ampla"), isto é, a Mãe de Deus, que fica imediatamente na nossa frente, literalmente no amplo abside conectando o altar ao céu. Pois, em tendo dado à luz Deus, a Palavra, e "concebendo o inconcebível" em seu útero, ela foi capaz de conter o incontenível e circunscrever O que não pode ser circunscrito.

Aprendemos da Escritura que, quando nosso Senhor estava na Cruz, Ele viu Sua mãe e Seu discípulo João e, voltando-se para a Virgem Maria disse: "Mulher, eis aí teu filho!" e para João: "Eis aí tua mãe!" (S. Jo. 19:25-27). Desde aquela hora, o Apóstolo e Evangelista do Amor cuidou da Teotókos em sua própria casa. Além disso, a referência no livro de Atos (Cap. 2, v. 14) confirma que a Virgem Maria estava com os Apóstolos do Senhor na festa do Pentecostes. A tradição da Igreja mantém que a Teotókos permaneceu na casa de João em Jerusalém, onde ela continuou seu ministério em palavras e ações.

A tradição iconográfica e litúrgica da Igreja também mantém que, na época em que a Virgem Maria morreu, os discípulos estavam pregando ao redor do mundo, mas foram levados de volta a Jerusalém para prestar suas reverências à Teotókos. Exceto por S. Tomé, todos os demais, incluindo o Apóstolo Paulo, estavam reunidos em torno da cama dela. No momento de sua morte, Jesus Cristo desceu do céu para levar sua alma de volta Consigo. Após sua morte, o corpo da Teotókos foi levado em procissão para ser colocado em uma tumba perto do Jardim de Getsâmane. Quando o Apostólo Tomé chegou, três dias depois e quis ver o corpo, a tumba estava vazia. A assunção corpórea da Teotókos foi confirmada pela mensagem de um anjo e pela aparição dela aos Apóstolos. Todos estes eventos refletiam a morte, sepultamento e ressurreição de Cristo.

O ícone e liturgia da grande Festa da dormição e sepultamento de Maria claramente representam um serviço de funeral, ao mesmo tempo sublinhando o ensino fundamental sobre a ressurreição do corpo de Maria. A este respeito, a morte de Maria serve como lembrança que afirma nossa fé e esperança na vida eterna. Mesmo assim, os cristãos ortodoxos referen-se a este evento como "Dormição" (Koimisis) da Teotókos, ao invés de "Assunção" (ou translado físico) ao céu. Isto ocorre porque enfatizando que Maria é humana, que ela morreu e foi enterrada como outros seres humanos, nos é dada a certeza de que - a despeito do fato de que "nem o túmulo nem a morte puderam conter a Teotókos, nossa inabalável esperança e sempre vigilante proteção"(conforme canta o Kontakion da festa) - Maria é na verdade muito mais próxima de nós do que pensamos; ela não nos abandonou. Como observa o Apolytikion da Festa: "No nascimento, preservaste tua virgindade; na morte não abandonastes o mundo, ó Theotokos. Como mãe da vida, partiste para a fonte da vida, libertando nossas almas da morte por tuas intercessões".

Para os cristãos ortodoxos, Maria não é simplesmente aquela que foi escolhida. Acima de tudo, ela é símbolo da escolha que cada um de nós é chamado a fazer em resposta à iniciativa divina da encarnação (o nascimento de Cristo em nossos corações) e de transformação (a conversão dos nossos corações do mal para o bem). Nós somos, como diz S. Simeão, o Novo Teólogo do século X, todos convidados a sermos Cristotokoi (parturientes de Cristo) e Theotokoi (parturientes de Deus).

Pelas suas intercessões, que todos nós nos tornemos como Maria, a Teotókos.