quinta-feira, 30 de abril de 2015

Uma sociedade moralmente sedentária

Macunaíma


Adaptação do artigo "Uma sociedade moralmente sedentária" de Percival Puggina


Li “O homem medíocre” pela primeira vez em 1999. O autor, José Ingenieros, tratava, ali, da diferença entre a mera honestidade e a virtude, bem como da falsa honestidade daqueles que a exibem como troféu.

“Em todos os tempos, a ditadura dos medíocres é inimiga do homem virtuoso. Prefere o honesto e o exibe como exemplo. Mas há nisso um erro ou mentira que cabe apontar. Honestidade não é virtude, ainda que não seja vício. A virtude se eleva sobre a moral corrente, implica uma certa aristocracia do coração, própria do talento moral. O virtuoso se empenha em busca da perfeição.”

Com efeito, não fazer o mal é bem menos do que fazer todo o bem que se possa. Ser e proclamar-se honesto para consumo externo é moldar-se às expectativas da massa e isso fica muito aquém da verdadeira virtude. 

“Não há diferença entre o covarde que modera suas ações por medo do castigo e o cobiçoso que age em busca da recompensa“, 

afirma o filósofo portenho enquanto sentencia sobre o homem medíocre:

“Ele teme a opinião pública porque ela é a medida de todas as coisas, senhora de seus atos“.

É preciso distinguir, portanto, a virtude que se alcança por adesão voluntária a um determinado bem, da virtude intrínseca a modelos institucionais que inibem a conduta não virtuosa. A fidelidade será, sempre, um produto da vontade humana. O pérfido só renunciará a perfídia quando ela se mostrar inconveniente. O venal pode trocar de camiseta, mas só não terá preço se não houver negócio a ser feito.

A corrupção tem causas em duas fragilidades, a da moralidade individual e a institucional. No plano das individualidades, só teremos pessoas virtuosas em maior número quando forem enfrentadas certas questões mais amplas, na ordem social. Ou seja, quando:

• a virtude for socialmente reconhecida como um bem a ser buscado;

• escolas e universidades retomarem o espírito que lhes deu origem e levarem a sério sua missão de formação e informação e não cooptação;

• famílias e meios de comunicação compreenderem a relação existente entre o desvario das condutas instalado na vida pública e o estrago que vêm produzindo na formação da consciência moral e na vida privada dos indivíduos;

• o Estado deixar de ser fonte de privilégios;

• for vedada a filiação partidária dos servidores públicos;

• forem extintos os Cargos de Confiança na administração direta, indireta e Estatais;

• a sociedade observar com a atenção devida o método formativo e educacional das corporações militares;

• voltar a ser cultivado o amor à Pátria;

• a noção ideológica de “la pátria grande”, que prega que a "América Latina" é que é a pátria, ao invés dos países, for banida por inspirar alta traição;

• as Igrejas voltarem a reconhecer que sua missão salvadora nada tem a ver com sociedade do bem estar social, mas com sociedade comprometida com os valores que levam ao supremo Bem.

Não há virtude onde não há uma robusta adesão da vontade ao Bem. E isso não acontece por acaso. É uma busca que exige grande empenho.

Por fim, quero lembrar que o relativismo moral veio para acabar com a moral. O novo totalitarismo elegeu como adversário os valores do Ocidente. Multidões, sem o perceber, tornaram-se moralmente sedentárias.

Abandonaram os exercícios que moldam a consciência e fortalecem a vontade. Ao fim e ao cabo, em vez de uma sociedade onde os indivíduos orientam suas vidas segundo os conceitos que têm, constituímos uma sociedade onde os indivíduos conformam seus princípios e seus valores à vida que levam.

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