domingo, 11 de janeiro de 2009

O Que é a Igreja Ortodoxa



Amigos,

realizamos um estudo no dia 10 de janeiro de 2009 sobre o que é a Igreja Ortodoxa e gostaria de compartilhar aqui com vocês.

O estudo foi fundamentado na definição que o Evangelho e Credo dão da Santa Igreja e foi também baseado no livro "A Mentalidade da Igreja Ortodoxa" do Bispo Hieorotheos de Nafptakos, cujos primeiros capítulos estão traduzidos e resumidos aqui.

Segundo o Novo Testamento, a Igreja é o Corpo de Cristo. Não como metáfora, mas literalmente. Isto foi a revelação de Nosso Senhor Jesus a São Paulo.

Quando ainda se chamava Saulo e era fariseu, o futuro apóstolo perseguia os cristãos onde quer que estivessem, levando-os a julgamento e mesmo a morte. Quando estava a caminho de Damasco, Jesus Cristo aparece para ele e diz: "Saulo, Saulo. Por que me persegues?"(ênfase minha).

O significado disto é que a Igreja é o Corpo de Cristo, persegui-la é perseguir o próprio Jesus Cristo, agredir um cristão é, literalmente, repetir o que os soldados romanos fizeram durante Sua Paixão.

Não por outro motivo, São Paulo repete inúmeras vezes em suas epístolas que os cristãos ortodoxos somos os membros do Corpo de Cristo e o Espírito Santo habita a Igreja, ou seja todos os cristãos ortodoxos e essa é natureza da Comunhão, como nosso próprio espírito habita em nosso corpo.

O modo dessa participação corporal na natureza de Cristo está plenamente revelada ao longo de todo o Novo Testamento e mais discretamente no Antigo. Mais evidentemente na Segunda Epístola de Pedro, capítulo 1, versículos 3 e 4:

3 Visto como o seu divino poder nos deu tudo o que diz respeito à vida e piedade, pelo conhecimento daquele que nos chamou pela sua glória e virtude;
4 Pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo.

mas também da boca do próprio Jesus Cristo quando ele diz em São João 8:12

Falou-lhes, pois, Jesus outra vez, dizendo: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida.


e, ao mesmo tempo, em São Mateus 5:14

Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte;

Ou seja, ele é a Luz do mundo, como dizemos no Credo "Luz de Luz". E ao mesmo tempo, o cristão é "luz do mundo" também. Ou seja, o Cristão Ortodoxo, quando realmente participa do Corpo de Cristo, isto é, da Igreja, é participante da natureza deste corpo, da natureza de Cristo. A Luz que é o Cristo, brilha através de nós.

Nós participamos da energia de Deus assim como a lâmpada da nossa casa participa da energia da usina hidroelétrica que a produz.

A energia não é da lâmpada, ela não teria como produzi-la, mas é a *mesma* energia que está lá na usina.

Assim é com as energias de Deus (o Amor, a Graça, a Glória, a Misericórdia, a Justiça, a Luz, a Presença, etc., etc.). Ele é a "usina" sendo que de energias infinitas, e nós somos as lâmpadas. Não há realmente, literalmente, virtude em nós, pois apenas o Pai é Bom. Se abrimos a visão espiritual (chamada na Igreja Ortodoxa de 'nous') essas energias de Deus nos inundam o coração e todo nosso ser e, como uma esponja no mar, ficamos cheios delas. E esse é nosso estado natural, "cheios de Graça", que Jesus Cristo veio resgatar. E isso é "participar da natureza Divina", ser Corpo de Cristo, assim como as lâmpadas são corpo da usina estando ligadas a ela, e a esponja é corpo da água que está nela, sem que a lâmpada seja a usina ou a esponja seja o mar.

Uma questão de tradução
(ou "O trecho que você pode pular se não gosta de detalhes" :) )

Como nota adicional, vale lembrar que o Novo Testamento afirma inúmera vezes que somos "energizados" por Deus, que uma "energia" sai dEle, que devemos viver a Energia dEle, mas isso não fica transparente nas traduções ocidentais. As palavras gregas "dynamis", "energon", "energematon" podiam significar tanto a energia do trabalho, quanto o trabalho em si mesmo, ou o resultado do trabalho.

Vejamos dois exemplos, o primeiro com a palavra energon e o segundo com dynamis.

I Coríntios 12:06

Original
καὶ διαιρέσεις νεργημάτων εἰσίν, δὲ αὐτὸς θεός, ἐνεργῶν τὰ πάντα ἐν πᾶσιν.

Transliteração
ki diaresis energemáton issín, o de avtos Teós, o energon ta pánta en pãssin.

Tradução Vulgata Latina tradicional:
6 et divisiones operationum sunt idem vero Deus qui operatur omnia in omnibus

Tradução Modernas

Protestante Almeida Corrigida e Revisada Fiel:
6 E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos.

Católica Ave Maria
6 Há também diversas operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos.

Vale lembrar que "operações", palavra derivada de "operationum", provavelmente no Latim original tinha a mesma ambiguidade de "energemáton", significando tanto a energia do trabalho, quanto o trabalho em si mesmo.

Tradução moderna correta:
6. E há diversidade de energias, mas é o mesmo Deus que energiza tudo em todos.

E o segundo exemplo, com a palavra dynamis.

São Lucas 08:46

Original:
δὲ Ἰησοῦς εἶπεν, Ηψατό μού τις, ἐγὼ γὰρ ἔγνων δύναμιν ἐξεληλυθυῖαν ἀπ' ἐμοῦ.

Transliteração
o de Iesus ipen, Epsató mi tis, ego gar egnon dynamin ekselelythyan ap' emi.

Tradução Vulgata Latina tradicional
46.et dixit Jesus tetigit me aliquis nam ego novi virtutem de me exisse

Nota: "virtude" no Latim, era mais do que simples um elemento do bom caráter moral. Era literalmente uma "força".

Traduções modernas:

Protestante Almeida Corrigida e Revisada Fiel:
46 E disse Jesus: Alguém me tocou, porque bem conheci que de mim saiu virtude.

Católica Ave Maria:
46. Jesus replicou: Alguém me tocou, porque percebi sair de mim uma força.

Como vemos a protestante preservou a versão latina na qual "virtude" significa "força". Já a versão católica, mais atenta ao fato de que a palavra "virtude" hoje já não é entendida como "força", porém como uma "característica moral boa", resgatou o sentindo, realizando uma tradução correta.

Ou seja, em diversos trechos do Novo Testamento em que vemos "virtude", "obra", "operação", a melhor tradução seria "força", "energia" e as palavras delas derivadas, especialmente nos contextos em que se dá a relação Deus-Homem.

Una, Santa, Católica, Apostólica

Entendendo que a Igreja Ortodoxa é o Corpo de Cristo através da participação na natureza divina pela participação do Cristão Ortodoxo nas energias de Deus, tornada possível pela Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo, unindo a natureza humana e a natureza divina em Sua Pessoa, fica mais fácil compreender as quatro características da Igreja que encontramos no Credo. São as quatro características do Corpo de Cristo.

O Corpo de Cristo é Uno

Jesus Cristo verdadeiramente encarnou-se e teve um corpo de carne como o nosso. Esse corpo teve as mesmas características que qualquer corpo.

A única diferença é que foi o primeiro corpo a ser restaurado, pela Ressurreição, à forma original pretendida pelo Pai.

O Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo após a Ressurreição é chamado "glorioso" porque não é um corpo como o que temos, que fica doente, se fere e morre. É um corpo que não se corrompe.

Ao mesmo tempo que é como o corpo de Adão antes da Queda, o Corpo de Nosso Senhor após a Ressurreição é ainda "melhorado" porque é um corpo humano, restaurado, mas também "pós-Encarnação". É Adão restaurado e plenificado.

É neste Corpo que participamos. Todos seremos ressuscitados, mas o que ressuscitarem como Corpo de Cristo, estarão com Ele que é a Vida, a Verdade, o Verbo, o Caminho. Os que não... não. Estarão fora do Corpo da Vida, da Verdade, do Verbo, fora do Caminho. Tal estado é o inferno.

O Corpo de Cristo, como vimos, é um corpo de carne em tudo menos na corruptibilidade. É a carne original, santa, gloriosa, imaculada e glorificada.

Sendo um Corpo de Carne ele só pode ser um. Não existe uma pessoa com vários corpos, a não ser em filmes de ficção científica e gibis. Se a Igreja é o Corpo de Cristo e o Corpo de Cristo é um Corpo, então só há uma Igreja.

Sendo um Corpo de Carne ele é visível e delimitado. Não pode haver "igreja invisível" ou "impossível de definir qual é a verdadeira", porque é impossível tanto existir um corpo invisível quanto é impossível imaginar que não dá para dizer onde o "Zé" começa e acaba. Quando não conseguimos ver os limites de um corpo, vendo tudo borrado, não é porque o corpo é borrado. É porque nossos olhos estão doentes.

Sendo um Corpo de Carne e não podendo ser invisível, também não pode ser apenas parcialmente invisível. Não pode haver no corpo uma cabeça invisível de Cristo e uma segunda cabeça visível. Não existem corpos com duas cabeças, nem com cabeças invisíveis. A cabeça visível do Corpo de Cristo é aquela "barbuda e de cabelos longos" que vemos no ícone e está, muito adequadamente, ainda presa e visivelmente ao pescoço dEle. A administração da Igreja não precisa recorrer a distorções teológica para simplesmente escolher um moderador ou presidente da assembléia de bispos, seja este homem um bispo ou um rei.

Sendo um Corpo de Carne, e pela promessa de Cristo que as forças do Inferno não prevaleceriam sobre o Seu Corpo, o Corpo de Cristo não pode ser um amontoado de pedaços separados uns dos outros, como se os pedaços esquartejados de um corpo pudessem continuar vivos e saltitantes por aí. Um corpo que fosse dividido em muitos "corpos" menores, simplesmente morreria, e todos os pedaços seriam apenas pedaços mortos de um corpo outrora vivo. Ser um, para um corpo, simplesmente significa que ele está vivo. Os que crêem que o Corpo de Cristo, a Igreja, está dividido, sem perceberem, defendem que Deus morreu na carne e que a promessa de Cristo de que as forças do Inferno não prevaleceriam, não se cumpriu. É assim que o demônio nos seduz com idéias elegantes a blasfemar contra Deus.

O Corpo de Cristo continua sendo Um, Indiviso no corpo e na cabeça, Visível no corpo e na cabeça, a Cabeça de Cristo continua sendo exclusivamente a que Ele possui sobre os ombros, o corpo ainda é Contínuo e Delimitado. Ou seja, continua estando Vivo e sendo um Corpo.

O Corpo de Cristo é Santo

A Santidade, propriamente, é exclusiva de Deus. Como vimos quando estudamos as energias de Deus qualquer santidade que vejamos em um ser humano, os chamados "santos", nada mais é que a própria Santidade de Deus apenas brilhando através deles por terem se aberto, através do amor, ao próprio Deus.

Tanto "sanctus" quanto "agyos", que significam "santo" respectivamente em latim e grego, passam a idéia de algo colocado a parte, separado, diferente.

Só Deus é realmente "separado" de toda a Criação. Sendo o Criador de tudo, inclusive das leis da Criação, não está submetido a elas e portanto em nada se assemelha a Criação como um todo. Tanto que na Criação, um indivíduo só pode ser uma pessoa. Deus, entretanto, é individual, só é um, mas é, ao mesmo tempo, três pessoas. Isso só é possível porque, sendo o criador da regra de que um só pode ser um, Deus não está submetido a ela, pois a regra não existia antes dEle.

Sendo assim, toda essa busca de "identidade", "originalidade", "individualidade" que vemos no mundo, e os seus meios: afirmação profissional, artística, "ser feliz" é completamente fútil, pois a única forma de atingir verdadeiramente o "ser diferente" não é participar de algum grupo com roupas e hábitos exclusivos ou exóticos. O único jeito de ser "diferente", "a parte" ou "santo" é participando na única verdadeira diferença, a única verdadeira santidade, que é a de Deus.

Nosso estado natural é participar da "diferença" de Deus, de Sua Santidade. Isso é possível porque, diferente do resto da Criação, seja natural ou sobrenatural, nós somos a parte da Criação que foi feita à imagem e semelhança dEle. Então podemos participar, pelos meios já explicados, das energias dEle, inclusive a Santidade, de forma subsidiária, limitada e absolutamente dependente e sem mistura.

Por isso é que Nosso Senhor Jesus Cristo diz que devemos ser perfeitos como o Pai é perfeito, e também pede que sejamos Santos. Isso não significa nem tornar-se Deus, nem é uma metáfora que seria, na literalidade, impossível.

Ser perfeito como o Pai é, deixando-se ensopar pelas energias de Deus, deixando-se imergir no reino, domínio de Deus, restaurar a semelhança de Deus. Isto é algo que seria impossível com nossas próprias forças, pois o finito em nada se assemelha ao infinito. Mas o infinito, por não conhecer limites, pode superar inclusive esta *nossa* limitação.

Ser santo, portanto, é participar na Santidade do Único que é Santo, pelo Espírito Santo, em Nosso Senhor Jesus Cristo, na Perfeição do Pai. É a única originalidade, individualidade e diferença possível. O resto não passa de "variações sobre o mesmo tema".

O Corpo de Cristo é Católico

Muitos pensam que "católico" é o nome de uma instituição. Entretanto, não é um nome, mas uma qualidade.

Alguns também pensam que "católico" significa "universal" o que não é verdade. O termo grego para o que é universal é "kosmico" que em português deu a palavra "cósmico" e "cosmos" é sinônimo de "universo".

Igualmente, a palavra grega que significa "universal" no sentido geográfico, de englobar o mundo inteiro habitado era "oikumenicos" que vem de "oike" que significa habitação.

Se na definição se quisesse dizer "universal" seria dito "kosmico" e se quisesse dizer "no mundo inteiro" diria "oikumenicos". Mas não é isso que está lá, e sim "kat' holicos".

A palavra "católico" vem do grego "kat' holikos" que significa "de acordo com o todo". "Holikos" vem de "holos" que deu a palavra "holístico" em português. Portanto "kat' holikos" também significa "o que é integral, pleno".

O Corpo de Cristo é integral, pleno. Não é dependente de nenhum povo, país, cidade, bispo, rei ou livro.

O fato de ser integral e pleno significa:

1) que não importa quantas pessoas, cidades, povos, bispos, reis, países ou livros se separem da Santa Igreja, ela continua inteira, plena, completa, sem necessidade balancear ou complementar-se em lugar algum; o Corpo de Cristo não depende de nada nem de ninguém;

2) que cada cristão ortodoxo que participa da Igreja, participa dela inteira, mesmo que nunca saia de sua paróquia;

3) que cada unidade de "bispo, padres, diácones, leigos e monges" é a Igreja inteira;

3.5) Nota: Arcebispos, Metropolitas, Patriarcas e Papas não são ordens superiores a Bispo. A ordem máxima é bispo. Aqueles títulos são apenas nomes diferentes para uma certa *função administrativa*. Por exemplo, é como em um time de futebol. O capitão (seja Arcebispo, Metropolita, Papa ou Patriarca) é um jogador como qualquer outro. Ele tem o privilégio de orientar os demais jogadores, por sua visão tática reconhecida, mas não pode nem deve jogar na posição dos outros. Se o capitão for "fominha" atrapalha o time como qualquer outro jogador faria, pois ser "capitão" não é algo acima de "jogador", é apenas uma função no time.

Vale lembrar também que o "capitão" pode ser qualquer jogador de qualquer posição. É um privilégio concedido pela visão tática. Igualmente, o primaz da Igreja poderia ser qualquer um dos bispos, é um privilégio que ele tem enquanto mantém a Ortodoxia. Assim como a visão tática confere o título de capitão, a Ortodoxia é que confere o título de Primaz. Nunca será o contrário, simplesmente alegar que por ter o título de "capitão" ou de "primaz" ele passa a ser a definição do que é taticamente correto ou do que é ortodoxo. A tática eficiente e a ortodoxia funcionam por si só e não dependem de títulos ou funções administrativas. Portanto, é preciso primeiro ser fiel à Ortodoxia para ser Primaz e se o Bispo que portar este título se afastar da Ortodoxia, deixa de ser, neste exato momento, cristão, quanto mais bispo e primaz.

4) Que a Igreja é plena em todos os lugares e todos os tempos. Se ela fosse se "desenvolvendo" ou se uma região do mundo possuísse parte da verdade e outra região uma outra parte, então o Corpo seria fragmentado. Onde o Corpo está, ele está inteiramente, hoje, ontem, amanhã e em todos os lugares. Por isso o estudo da vida dos santos e dos escritos dos pais da igreja e de outros santos são tão importantes. Deus não mudou e Seu Corpo não tem que se adaptar aos "dias de hoje". Ao contrário, os "dias de hoje" é que, se alterando para integrar o Corpo de Cristo são curados de seus males e se tornam plenos e holísticos.

5) que o Corpo de Cristo é a plenitudade da Vida, da Verdade e da Graça. É um fato observável que outros grupos religiosos possuem verdades parciais. Porém, quando falam de Deus, quando falam de Cristo, esforçam-se pelo intelecto, pela pesquisa, pelo debate, pela emoção, compreender a Verdade. O Corpo de Cristo é o Corpo da Verdade. Nós não temos uma idéia dEle, não O debatemos, não O sentimos nem pesquisamos. Nós participamos nEle. Somos membros da Verdade, como nossa mão é membro de nosso corpo. Não contemplamos com nossa filosofia o Espírito Santo. Ele habita em nós, porque o Espírito Santo de Deus habita o Corpo do Filho de Deus, de modo semelhante como nosso espírito habita nosso corpo. A Verdade Absoluta é algo que nenhum homem jamais terá dentro de seu intelecto ou emoção, mas é algo dentro do qual ele pode entrar, e participar como membro. Jesus Cristo não é um homem que falou a verdade. Ele *é* a Verdade assim como eu sou eu. Todos nós já vimos aquela figura da morte, com capuz e foice. Ninguém diz, ali está um ser que fala da morte, que traz a morte. Quando vemos a figura, sabemos que *é* a morte. Igualmente, Jesus *é* a Vida. Jesus *é* a Verdade. Por isso São Paulo diz que "nEle vivemos e nos movemos" e "já não sou eu quem vive, mas Cristo que vive em mim". Ele não "apreendeu a Verdade" mas, deixou-se apreender na Verdade, sendo que a Verdade em certo momento histórico tornou-se homem pela Virgem Maria e chamou-se Jesus, foi morto e ressuscitou ao terceiro dia.

6) Um detalhe pouco conhecido é que "católico" e "ortodoxo" eram praticamente sinônimos. Isto porque "ortodoxia" vem de "ortho" e "doxa". "Ortho" significa "correto". O "ortodentista" é quem coloca os dentes na posição correta. O "ortopedista" é quem coloca os pés na posiçã correta e assim por diante. "Doxia" significa tanto "opinião" quanto "louvor". Assim a "ortodoxia" consiste em ter a opinião ou louvor corretos. Comparando com o ortodentista, o dente "pleno", "integral", completo, perfeitamente saudável, é, evidentemente, o dente que está "correto". Um dente podre por dentro logo sairá da posição correta, caindo. Um dente na posição errada estará mais vulnerável às cáries e infecções. Então ser "pleno" e ser "correto" são conceitos semelhantes dentro do Corpo de Cristo. Apenas modernamente "ortodoxia" ficaria sendo o nome da Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica e "católico" o nome da comunidade de fé que cerca o "papa".

O Corpo de Cristo é Apostólico

"Apóstolo" significa "enviado". O primeiro motivo de o Corpo de Cristo ser chamado apostólico é porque Jesus Cristo é "apóstolo" do Pai:

Por isso, irmãos santos, participantes da vocação celestial, considerai a Jesus Cristo, apóstolo e sumo sacerdote da nossa confissão,
Hebreus 3:1
Então, o Corpo do Sumo-Apóstolo evidentemente tem que ser apostólico, isto é, cumpridor da função de "ser enviado".

Mas enviado para o quê? Simplesmente ensinar a doutrina de Jesus? Simplesmente divulgar profecias?

Se Deus quisesse simplesmente anunciar uma idéia, uma informação ou mesmo uma atitude ou fazer profecias, não precisaria ter vindo pessoalmente para isso. Ele sempre pôde e de fato gerou profetas, pessoas justas, professores, sábios e filósofos que fizeram e ainda fazem tudo isso.

É evidente que Ele *também* fez isso, mas não foi *apenas* para isso que Ele veio. Deus veio para fazer algo que só Deus poderia fazer: unir a natureza humana à natureza divina na Pessoa de Jesus Cristo, restaurando nossa natureza à condição anterior a da Queda através da infusão do Espírito Santo. Não é por outro motivo que vemos em São João, capítulo 22:

22 E, havendo dito isto, assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo.
O que é isto senão o mesmo Deus do Gênese, agora já encarnado, morto e ressuscitado como homem, repetindo, ali, em todo os Apóstolos, aquilo que Ele mesmo já fizera antes tantos milênios antes, no início:

7 E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.
Gênese 02


Quando Deus primeiramente dera a vida ao homem, soprou no barro e Adão viveu. Agora, o próprio Deus *repete* o ato para, não apenas restituir a vida do Paraíso, porém uma vida ainda mais plena na Glória do Espírito Santo que nem Adão conhecera.

Este ato registrado nas Santas Escrituras e realizado primeiramente por Nosso Senhor é o que repetimos no Mistério do Santo Crisma, no qual, como os Apóstolos e como Adão no Paraíso, o cristão batizado recebe o dom do Espírito Santo. Não como participar plenamente do Corpo de Cristo se não há o dom do Espírito Santo, como o próprio Cristo demonstrou.

O fato de o Pentecostes ter decido sobre os Apóstolos e de Cristo ter soprado sobre os Apóstolos demonstra também que o grupo dos Apóstolos como um todo é a fonte "mediadora" da Apostolicidade do próprio Cristo e do resto da Igreja. A Igreja é Apostólica. Não é "petrina". Não é "bíblica". Não é "papal", "episcopal", "presbiteriana", "metodista", "evangélica", "luterana", "calvinista", "universal", "pastoral", "carismática", "anglicana". O Corpo de Cristo é Apostólico. No que tange a parte doutrinária, é o ensino dos Apóstolos que constitui o ensino da Igreja e não o ensino de bispo, rei, colégio, ou exegetas. A validade de uma análise dos Evangelhos é sempre medida pela comparação com o ensino dos Apóstolos. Quem repete o mesmo ensino, sem desenvolver, nem cortar, faz parte da Igreja Apostólica. Quem não o repete, mas desenvolve ou suprime, não está sendo Apostólico e não está falando em nome do Corpo de Cristo.

Os Pais da Igreja, sejam gregos ou latinos, antigos ou modernos, o são porque souberam expressar bem, sem mudar, o ensino apostólico e não por "criatividade" ou "originalidade" filosófica. E isto só é possível por pessoas que repetiram a mesma experiência dos Apóstolos, isto é, realizaram a fé intensa, o amor, o sacrifício e a vida de Cristo.

O Ensino Apostólico não é fruto de filosofia ou educação, nem tampouco apenas da sucessão de bispos até os apóstolos, embora esta última seja importante porque o Corpo é físico e portanto a transmissão também é.

O Ensino Apostólico é fruto de participar daquilo que os Apóstolos participaram, ou seja, do Corpo de Cristo. O Teólogo não é uma pessoa que "estudou muito" (embora isso nem sempre seja obstáculo). O Teólogo é uma pessoa já "imersa em Cristo", participante da Graça, da Verdade, da Misericórdia e que viu a Luz Incriada de Deus. Quando oramos, somos um pouco teólogos, conforme São Máximo.

Outro aspecto da apostolicidade é o ser "enviado". É através das pessoas que já são Corpo de Cristo que os que estão fora passam a participar dEle. Por isso é que vemos em São João 20, que
após soprar sobre os Apóstolos, Jesus Cristo continua dizendo:

23 Aqueles a quem perdoardes os pecados lhes são perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos.
É através de quem participa de Si que Jesus Cristo chama para Si os que ainda não o foram. "Vós sois a luz do mundo", e "Vós sois o sal da terra", disse Jesus Cristo. Jesus Cristo ordena que "anunciemos a Boa Nova" para todos os povos da terra. Ser Cristão é ser missionário.

Isso não significa, porém, proselitismo, isto é, ficar tentando convencer as pessoas a "aceitar Jesus".

Significa, antes de mais nada viver realmente a vida Cristã. Se a Luz que é o Cristo não estiver em nós, não estará em nossas palavras. Como pediremos aos grandes pecadores que se contenham se não conseguimos nem conter nossos pequenos pecados?

Significa que vivendo uma vida cristã de oração, jejum, boas obras e amor ao próximo, a Luz de Cristo brilhará naturalmente através de nós. Estaremos sendo as "lâmpadas" da "energia" da "usina". Não adianta fingir que temos a "energia" com belas palavras. Cedo ou tarde seremos flagrados e mesmo que não o sejamos pelos homens, a Verdadeira Fonte sabe que não estamos ligados a Ela. Ser missionário é tornar-se radiante na luz de Cristo e assim nossos atos e palavras serão radiantes.

Ser apostólica, enviada, significa também que a Igreja coloca a nossa nacionalidade, nossa posição social, familiar e econômica, nosso "ego" em último plano, conforme vemos nos seguintes versículos:

Romanos 10:12 Porquanto não há diferença entre judeu e grego; porque um mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam.

Gálatas 3:28 Nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.

Colossenses 3:11 Onde não há grego, nem judeu, circuncisão, nem incircuncisão, bárbaro, cita, servo ou livre; mas Cristo é tudo em todos.
Na época dos apóstolos havia um preconceito dos gregos contra os judeus, mesmo apesar de serem os judeus que aceitaram o Cristo. Este preconceito existia porque os gregos possuíam toda a cultura clássica da Grécia, enquanto os judeus lhes pareciam pessoas rudes e ignorantes. São Paulo, então, lembra da missão apostólica da Igreja, dizendo que uma vez pertecendo ao Corpo de Cristo, classes sociais, sexos, etnias, nível cultural, e todo tipo de coisa semelhante desaparece. Somos "um em Cristo Jesus", "Cristo é tudo em todos" e Ele é "o Senhor de todos".

Graças a essa admoestação de S. Paulo e de seu esforço na missão apostólica aos gentios, hoje, gregos, árabes, eslavos, escandinavos, africanos, ocidentais e povos do Novo Mundo fazem parte do Corpo de Cristo. E continua sendo missão dos que estão dentro, auxiliar e pregar para os que estão fora.

Deus veio ao mundo para que todos sejam salvos através da participação no Corpo dEle e não para defender ou atacar culturas, ideologias, civilizações, doutrinas, filosofias, etnias, interesses políticos, comerciais ou de familiares.

E o Corpo de Cristo é a Igreja e esta, por ser Una, Santa, Católica e Apostólica, pode legitimamente ser chamada de Orto-doxa, compravado por ter preservado retamente o mais recorrente mandamento dos salmos: Louvai!

Doxa si, o Theos!

Salmos 119:7
Louvar-te-ei com retidão de coração quando tiver aprendido os teus justos juízos.

Salmo 150
1 Louvai ao Senhor. Louvai a Deus no seu santuário; louvai-o no firmamento do seu poder.
2 Louvai-o pelos seus atos poderosos; louvai-o conforme a excelência da sua grandeza.
3 Louvai-o com o som de trombeta; louvai-o com o saltério e a harpa.
4 Louvai-o com o tamborim e a dança, louvai-o com instrumentos de cordas e com órgãos.
5 Louvai-o com os címbalos sonoros; louvai-o com címbalos altissonantes.
6 Tudo quanto tem fôlego louve ao Senhor. Louvai ao Senhor.

2 comentários:

lucas disse...

oi é mais uma pergunta vou batizar meu filho em uma igreja ortodoxa qual é a diferença da igreja catolica apostolica romana e se o batismo tem o mesmo valor nas duas

Fabio disse...

Oi Lucas! Cristo ressuscitou!

Respondendo à sua primeira pergunta, existem os seguintes posts neste blog:
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2009/01/quais-as-diferenas-entre-ortodoxia-e-o.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2008/09/como-igreja-catlica-voltou-igreja.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2011/05/algumas-vezes-as-pessoas-me-perguntam.html

Além destes, recomendo também estes aqui:
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2008/10/so-pedro-o-papa-e-os-protestantes.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2008/09/mentalidade-da-igreja-ortodoxa.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2010/03/uma-visita-dos-bispos-da-igreja.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2010/02/sermao-de-sao-tikhon-no-domingo-do.html
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2011/03/o-que-e-tao-atraente-na-ortodoxia.html

Quanto ao batismo, a fé da Igreja ortodoxa (embora não de alguns de seus membros) é que só há um batismo, isto é, o que é realizado na Santa Igreja, chamada "ortodoxa" nos dias de hoje. Porque o batismo não é um rito mágico, mas uma expressão particular da Graça de Deus na Igreja, ele só existe dentro dela. Todos os que não fazem parte da Igreja Ortodoxa são, de fato, não batizados.
Algumas igrejas não-ortodoxas, por assim crerem ou por oportunismo, dizem que "aceitam" o batismo ortodoxo, mas isso é, quando honesto, uma contradição com o conceito da Graça divina expressa na Igreja, e quando desonesto, mero proselitismo que deseja angariar membros a todo custo.
Vale lembrar também que existem muitos grupos que se dizem ortodoxos no Brasil e que são, literalmente, picaretas. Existem alguns que não estão ligados a nenhuma Igreja Ortodoxa, e outros que estão ligados a Igrejas Orientais não-ortodoxas, mas se apresentam aqui no Brasil como ortodoxos. Para sua segurança, veja um post que fiz com as Igrejas ortodoxas canônicas que estão presentes no Brasil:
http://vidaortodoxa.blogspot.com/2010/02/amigos-compartilho-com-voces-uma-tabela.html e aqui uma lista de suas paróquias:
http://www.gettoknowtheoriginal.net/pt/directory.html