domingo, 14 de setembro de 2008

A Santa Cruz


A Santa Cruz é a nova Árvore da Vida em paralelo com aquela do Paraíso pois nela estava o Fruto da Vida.

Lembremos da passagem em Gênesis 3:22:
"Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal; ora, para que não estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente"

Quando o Homem quebrou o primeiro mandamento, de jejum da árvore do conhecimento do Bem e do Mal, afastou-se de Deus pela desobediência, trazendo sobre si a doença, o pecado e a morte.

Caso tomasse da Árvore da Vida nessa condição, seria eternamente doente, pecador e...espiritualmente morto, pois o fruto da Árvore da Vida o tornaria eterno na condição em que estivesse.

Esse foi o motivo da expulsão de Adão e Eva: a infinita misericórdia de Deus que não queria que nos tornássemos eternos em um estado de decadência sem fim. E foi também por esta ilimitada misericórdia que Deus nos enviou Seu próprio Filho, Ele mesmo o Fruto da Vida, o Pão da Vida (Eu sou o Caminho, a Verdade e A VIDA). Vejamos as Santas Escrituras em São João, capítulo 6:

32 Disse-lhes, pois, Jesus: Na verdade, na verdade vos digo: Moisés não vos deu o pão do céu; mas meu Pai vos dá o verdadeiro pão do céu

Quem é que o Pai nos deus senão seu Filho? Ele é o Pão do céu como ele confirma em seguida:

33 Porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo.


Que também concorda com São João, capítulo 3:13:

Ora, ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do homem, que está no céu.


Aquele que desceu do céu, Aquele que o Pai nos deu é ele a Vida, Nosso Senhor Jesus Cristo, o que Ele diz de forma explícita em São João 6:51:

"Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo."

Sendo assim o madeiro da cruz torna-se o tronco árvore de onde o Pai nos concede o Fruto da Vida que outrora nos proibira. A ação redentora de Nosso Senhor tudo transfigura, tudo renova e um instrumento de morte se transforma em doador da Vida.

Sabemos também, através da última bem-aventurança em São Mateus 5

Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.

e de São João 15:20

Lembrai-vos da palavra que vos disse: Não é o servo maior do que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa.

Que a energia da Cruz é componente essencial da redenção, isto é como disse São Paulo ao Romanos (repare a condicional):

Ora, *se* já morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos.

Ou seja, que *se* "morremos" com Cristo, ressuscitaremos em Cristo. Deixando morrer o "homem velho", carnal, das paixões, "crucificando-o", fazemos como São João Batista: "É necessário que *Ele* cresça e *eu* diminua" (S. João 3:30).

E de fato aí está a energia da Santa e Vivificante Cruz; a diminuição constante do nosso eu, da nossa vontade para que a Dele seja plena em nós e possamos dizer com o Filho para o Pai:
"Que se faça a Tua Vontade e não a Minha" (S. Lucas 22:42);

e como São Paulo:
"Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim;" (Gálatas 2:20).

No dia da Liturgia são lidos os Salmos 22, 74 e 99 que profetizam a crucificação de Nosso Senhor. Isso demonstra que a Cruz faz parte da Salvação desde o início.

De fato, tramite-nos a Santa Tradição que o sacrifício redentor de Nosso Senhor é figurativamente mencionado já no proto-Evangelho do Gênesis (3:15) quando Deus diz à serpente: "E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e *tu lhe ferirás o calcanhar*."

Finalmente, Nosso Senhor explica para Nicodemos de que modo esta Vida Eterna nos foi dada:

E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado;
Para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.
(S. João 3:14-15)

A leitura da epístola do dia é 1 Coríntios 1:18:24 e o Evangelho é S. João 19:6-11, 13-20, 25-28 e 30-35, todos relacionados à Santa Cruz.

sábado, 13 de setembro de 2008

Realeza Monástica

Olá!

Traduzi a divulgação deste livro para a Comunidade Monarquia Parlamentar Legítima e quis publicar aqui também. :)

Realeza Monástica

A vida de uma princesa não é apenas glamour, belos príncipes e bonitas roupas. Também é devoção ao dever, sacrifício pelo seu povo e simplesmente trabalhar muito duro. E se o seu país tiver passado por duas guerras mundiais e uma dominação comunista durante seu tempo de vida, isso signfica perigo e sofrimento, exílio e amargor.

A princesa Ileana da Romênia suportou tudo isto e mais. Mas sua fé ortodoxa profundamente arraigada lhe deu chão firme, e acabou levando-a na terceira idade ao repouso sereno do monasticismo.

Mas esta vida também significava sacrifício e trabalho duro, pois como Mãe Alexandra ela fora chamada a construir o primeiro monastério feminino de língua inglesa nos Estados Unidos: o Monastério da Transfiguração em Ellwood City, Pensilvânia. A história da Princesa Ileana é um conto empolgante de amor e perda, perigo e resgate, sacrifício e recompensa. Sua inspiradora vida é como um farol de fé e santidade para moças de todas as épocas e nações.

" Royal Monastic é uma leitura completa e prazerosa para qualquer idade. Os leitores irão ficar admirados com a mulher que viveu em três continentes ao longo do período mais conturbado da história moderna - uma mulher que de algum modo conseguia se identificar com todos que encontrava, e de outros não era como ninguém no mundo."
- Mãe Cristófora, Abadessa do Monastério Ortodoxo da Transfiguração

" Royal Monastic é uma excelente e envolvente biografia de uma princesa verdadeiramente notável que se torna uma monástica. Mãe Alexandra é um exemplo das virtudes cristãs ortodoxas do amor, sofrimento e auto-sacrifício."
Chrissi Hart, autor de Under the Grapevine: A Miracle by Saint Kendeas (Sob a Vinha: Um Milagre de São Kendeas) e The Hermit, The Icon and The Emperor: The Holy Virgin Comes to Cyprus (O Eremita, O Ícone e O Imperador: A Santa Virgem Vem ao Chipre)

http://www.conciliarpress.com/products/Royal_Monastic_Princess_Ileana_of_Romania_The_Story_of_Mother_Alexandra-497-0.html


Clique aqui para uma análise de Mãe Alexandra sobre o Pai Nosso e sobre a Oração de Jesus (em inglês)

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A Cidade e as Estrelas


No século 20, vimos surgir um sub-estilo de ficção que trata exclusivamente de explorações de novas descrições do mito da Caverna de Platão.

São estórias que descrevem seus personagens completamente imersos em mundos que de alguma forma foram planejados para aprisionar seus habitantes, tolhindo sua própria humanidade, ou que ao menos, ainda que inadvertidamente, acabam por fazê-lo.

São livros como 1984, Admirável Mundo Novo, A Cidade e as Estrelas, filmes como Matrix, O Show de Truman, seriados como Lost, Arquivo X. O que todos estas obras têm em comum é o mote principal do personagem imerso em uma rede de mentiras, às vezes tão radical, que o mundo em si é uma mentira.

Eu posso estar enganado, mas a primeira obra que aponta nesta direção é Othelo de Shakespeare. Ali, Othelo é enredado em uma teia de falsidades engedrada por Iago. Iago domina completamente o mundo subjetivo de Othelo, que passa a viver em uma realidade virtual primitiva.

Depois temos As Viagens de Gulliver, na qual não existe uma rede de mentiras propriamente ditas, mas os habitantes de cada país são absolutamente provincianos em sua perspectiva de vida, o que não deixa de ser uma prisão subjetiva virtual.

Em todas estas obras, quando há um planejador da mentira, ele é, ainda que bem intencionado, representado como profundamente maligno ou, ao menos, um sociopata. Se o responsável for a sociedade inteira, esta é apresentada como doente e auto-destrutiva, digna de reprovação.

A tentação, o pecado fundamental que tais obras expõem é talvez um dos mais antigos da humanidade. No primeiro milênio do Cristianismo foi exercitado principalmente pelos gnósticos. Trata-se da soberba de um ou de muitos em tentar imprimir no mundo real o mundo de sua imaginação e pensamento.

Para tais pessoas, o mundo real é detestável e igualmente detestáveis são os elementos da realidade que porventura encontram.

Iago detesteva a felicidade de Otelo e a ascenção de Cássio. Por isso cria seu mundo particular com o fim exclusivo de destruí-los. Os provincianos detestam o mundo exterior. O ódio ao mundo tal como ele é caracteriza e justifica a criação do mundo virtual que deve substituí-lo na subjetividade das pessoas dado que mudar o próprio mundo real em si é impossível. O estado de queda, ao invés de gerar maior vontade de redenção projeta sobre inocentes sua própria condição descendente e, acentuando-a, busca detê-la através da destruição do falso causador.

Nossa época viu a ascensão de tais obras simplesmente porque foi o século no qual a realidade foi mais detestável para todos os envolvidos nela.

A prosperidade de muitos países que pela primeira vez tiraram o homem da miséria foi um dos mais destestados elementos do século.

As conquistas da ciência, os ápices espirituais da religião...nossa época detestou de tudo um pouco e muitos foram os que resolveram que "outro mundo é possível" - nazistas, fascistas, comunistas, socialistas - e não hesitaram em matar em nome desse sonho sufocante.

Cada nova geração, ao contemplar as mortes geradas pela anterior, e julgando-se naturalmente mais genial, sonha então um novo mundo e joga-o sobre nós, através de milhões de Iagos recitando para si mesmos sua cantilena " And what's he then that says I play the villain? When this advice is free I give and honest," (Quem dirá pois que faço o papel de vilão? Posto que meus conselhos são gratuitos e honestos)

Pois nada há mais detestável do que o excelente sempre tomado pelos que o desconhecem como vil. A humanidade matou e mata seus melhores homens e o mesmo faz com suas perspectivas.

Ser bom é tolerável, ser excelente é insuportável. Vemos isso acontecer não apenas nas grandes coisas. Também nas pequenas o fenômeno é comum. São "superiores" e "amigos" que sabotam o crescimento do próximo , colegas que sequer teriam algo a perder com o crescimento do outro e ainda assim o derrubam.

Tudo por vaidade, diria o velho Salomão. Não sei. Sei porém que o que me atrai nas estórias que mencionei é a possibilidade de fuga dessa pseudo-realidade abissal.

É bem verdade que nem todas a tem, mas a simples escrita dela já pressupõe uma mente que não se deixa enredar. Existe uma porta no céu artificial de Truman. Existe uma saída.

Não como os gnósticos pensavam, uma saída do mundo mal falso que seria o mundo material para um bom mundo espiritual que seria o verdadeiro. Existe a saída do falso mundo da nossa subjetividade pessoal e coletiva, controlado por ilusões, para o bom mundo real e objetivo. Tal é a liberdade verdadeira e, creio, o primeiro passo de nossa parta na salvação.

O Caminho, a Verdade e a Vida

Todos nós já ouvimos, se é que não lemos, a famosa frase de Jesus em São João 14:6 "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim." A segunda sentença foi e tem sido sistematicamente abusada por intolerantes de todos os matizes. É importante notar que embora eu critique esses exageros de fideísmo, existem outras passagens como a famosa de São João, na qual Jesus ora para que todos sejam um que tem sido, mais recentemente, abusada pelos para instaurar uma espécie de relativismo que não poderia ser mais exógeno ao Evangelho. Mas o objetivo deste texto é, na verdade, deter-se sobre a primeira sentença do trecho citado.

Um Pouco de Lógica

É certo ver aí uma das frases nas quais Jesus Cristo alega ser Deus. No entanto não é este o aspecto que gostaria de trabalhar e sim o de uma revelação implícita aí. Todos nós já vimos na escola a famosa relação "Se a=b e b=c então a=c". Tenho certeza que os avançados em matemática e lógica poderiam tecer alguns comentários sobre essa formulação bem simples, mas ela descreve um bom número de eventos e, no contexto comunicativo, não foi direcionada para especialistas, mas para leigos em lógica - quando muito para diletantes se considerarmos o público de S. João e não o que ouvia ao Cristo quando ele enunciou a frase.

O ponto é que o texto nos diz que se Caminho=Jesus, Verdade=Jesus e Vida=Jesus, então Caminho, Verdade e Vida são todos o mesmo elemento. Pensemos nisso por um instante: a Verdade e a Vida são o mesmo objeto, a mesma coisa. Se afastar da Vida é viver em falsidade, viver em falsidade é se afastar da Vida, morrer um pouco. Não de forma metafórica, mas literal.

Vidas Falsas

Tal conceito é assombroso. Quando eu minto, eu morro um pouco. Quando sou falso para com os outros ou até para comigo mesmo, estou cultivando minha própria morte de uma forma mais intensa do que se fumasse 30 pacotes de cigarro por dia. Aliás, muito pior do que isso. Quando eu sou falso, eu estou fora da Verdade. Só que a Verdade e a Vida são a mesma coisa. Quando eu sou falso, eu estou fora da Vida. Já estou morto. Não é por outro motivo que Jesus também disse "Deixe que os mortos enterrem seus mortos" em São Lucas 9:60 e São Mateus 8:22.

Ele sabe que a imensa maioria das pessoas levam vidas falsas, cheias de insinceridade para consigo mesmas, para com o próximo e para com Deus. É o sujeito que seria bom advogado, mas seduzido pelo glamour do poeta boêmio, passa a querer viver de sua poesia ruim. Ou o contrário, o excelente poeta que ambicionando o status do advogado torna-se um defensor medíocre. É a pessoa que acha que tem que ser campeã em tudo e sempre, quando no fundo tudo que ela queria é um pouco de paz. É o político que se ilude dizendo para si mesmo que a vida cercada de mentiras e desonestidade é que é "vida" só porque está em meio a riquezas e cercado de pessoas-parasitas que querem partilhar disso. É a pessoa que sacrifica sua liberdade por segurança. É o escravo de suas compulsões e impulsos mórbidos sejam sexuais ou não que mente para si mesmo dizendo que isso é "viver intensamente cada segundo", que ser mais "mulher" ou mais "homem" é tratar o sexo oposto como lixo. Enfim é construir significados para si ao invés de simplesmente se deixar tomar pelO Significado da Vida.

"Eu quero ser um Menino de Verdade"

De forma geral, as pessoas subestimam os contos infantis. Pensam que são apenas estórias bonitinhas, cujo valor está exclusivamente nisso mesmo: são bonitinhas. Têm o mesmo valor da decoração de palhaços ou florzinhas do quarto da criança, desprovidos de sentido mais profundo do que marcar aquele serzinho como uma criança. Penso que estão errados quanto a isso. De forma geral o "conto infantil" nada mais é que o antigo conto fantástico pasteurizado. A presença do mágico é tida como "coisa de criança", mas na verdade o que ocorre é que esses contos expressam questões profundas através de uma realidade flexível. Como disse Chesterton contamos estórias de rios em que corre ouro líqüido apenas para nos lembrar de como nos maravilhamos quando vimos um rio de água pela primeira vez e como a fluidez da água, então, nos parecia tão estranha e maravilhosa quanto uma suposta fluidez do ouro. Falamos de dragões porque isso nos lembra a primeira vez que vimos elefantes e leões. Esse estupor maravilhado diante da realidade é sufocado e soterrado com o passar dos anos pelas banalidades do dia-a-dia. Mas foi o próprio Cristo quem disse: "Se não vos tornades como criancinhas, não entrarão no Reino". Recuperar esse sentimento é fundamental para a salvação. E nada melhor que os contos fantásticos para isso.

Todo o parágrafo anterior foi para explicar porque o conto do Pinóquio representa o que falava sobre "vidas falsas". Pinóquio não é "de verdade". Ele não tem vida, ele vive na mentira, ele não segue o caminho para o qual é constantemente reconvocado pelo Grilo. A maioria de nós segue o caminho oposto do Pinóquio. Nascemos "de verdade" e vamos nos tornando marionetes ao longo da vida, deixando que outras pessoas carismáticas ou não, governos e políticas guiem nossos movimentos. Nos vendemos barato. E assim nos tornamos, ainda por cima, marionetes com orelhas de burro. Mas deixarmos de ser "meninos e meninas de verdade" para nos tornarmos marionetes significa também deixarmos de ser seres vivos para nos tornarmos algo semelhante a um pedaço morto de madeira, apenas esculpido em forma humana. Nos afastamos da Verdade de nossas vidas e assim nos afastamos da Vida em si mesma. Nos tornamos mentirosos. E morremos com isso, nosso corpo animado, nada além de uma carcaça de carne, com um espírito que não se destrói mas também não morre. Zumbis. E se nos tornamos aquele tipo especial de cadáver ambulante que ainda é capaz de destruir a Vida dos que A possuem, aí somos a própria expressão do mito do vampiro. Somos uma marionete especialista em transformar "meninos de verdade" em marionetes também.

O Chifre Falso do Unicórnio Real

No desenho "O Último Unicórnio", baseado no livro de mesmo nome, a último unicórnio do mundo sofre com o fato de que ninguém mais é capaz de vê-la. Todos que olham para ela a vêem sem chifre. Vêem um cavalo normal. São cegos para tudo que ela possui de particular, único, belo, mágico e maravilhoso. As pessoas nessa estória são igualitários, filhos da Revolução Francesa e da época moderna apesar da estória se passar em mundo medieval. Olham para um ser mítico e não conseguem enxergar nada além do que ele possui de cotidiano, banal e de comum, igual aos demais. Um dos momentos mais comoventes do filme é quando uma bruxa velha captura a unicórnio e lhe aplica um chifre falso para expô-la em seu circo de bizarrices. As pessoas vêm, olham para "um cavalo com chifre de papelão" e, acreditando no embuste, pensam ver um unicórnio. É um momento denso. A menina chora de emoção ao ser enganada pelo chifre falso, por causa da incapacidade dela de ver o unicórnio de verdade que está a sua frente. É uma síntese de nossa era: cegos para a verdade, nos emocionamos com os simulacros de verdade pelo amor natural que sentimos pela verdade. Revelado o simulacro, nossa raiva nos torna ainda mais cegos para a verdade que continua a nossa volta e em nós, e mais vulneráveis a novos simulacros. A unicórnio encontra então um aliado no mago Schmendrick que lhe diz: "Eu posso vê-la, porque eu também sou de verdade. Como você." É a explicação para o problema. As pessoas não vêem nada que seja verdadeiro, porque elas mesmas não são de verdade, porque não estão na Verdade, estão afastadas. São os "mortos" de Jesus, os "bonecos de madeira" do conto do Pinóquio, os "robôs" dos contos de ficção-científica, os homens de lata sem coração, os zumbis modernos vagando em busca do "cérebro" que eles mesmos já não possuem. É impressionante como algumas pessoas imaginam uma vida "espiritual" como algo insosso. Jesus mesmo disse "Vocês são o sal da terra. Se o sal não dá sabor não serve para nada". A vida espiritual nada mais é que o processo, precisamente de abandonar a condição de ser sem vida, sem sabor, para se tornar o "tempero do mundo" o que dá sabor à vida. Temos todos que nos tornar homens e mulheres "de verdade".

"Caminhante, o caminho se faz ao caminhar"

É aí que entra, penso, a primeira parte da afirmação e que, por muito tempo, foi a mais misteriosa para mim. O que é "O Caminho"? Ora, o Caminho é nossa história pessoal rumo à plenitude e a Deus. É nossa vocação (todos temos uma, não apenas sacerdotes e ministros), nosso chamamento, aquilo que Deus nos criou para sermos e fazer. É nosso Verdadeiro eu, nossa sintonia no Universo. Diversos filmes, livros e estórias falam do "Caminho". Temos o herói ou heroína normalmente dedicados a alguma atividade que ou consideram perfeitamente insossa, ou, se gostam, gostam apenas porque nunca experimentaram nada melhor ou estão acomodados. Surge então algum personagem ou evento que representa, por assim dizer, a "Voz"., algo que os tira daquela "normalidade" e os chama para a "aventura" que não precisa ser uma aventura propriamente dita; vide o filme baseado em fatos reais "Óleos de Lorenzo", no qual os pais do menino que dá nome ao filme descobrem que ele possui uma grave doença degenerativa do sistema nervoso. A partir daí inicia-se a luta dos pais para a busca de uma cura. Os médicos, no entanto, logo os desencantam explicando, repetidas vezes que a doença age rapidamente e que certamente não há cura com a tecnologia atual. O pai do rapaz então, que não possuía nenhuma formação científica, passa a estudar biomedicina e bioquímica por si só. Não descobre a cura mas descobre um remédio que paralisa o progresso da doença. Era tarde demais para Lorenzo, mas para centenas de milhares de pessoas ao redor do mundo, o remédio tornou-se a garantia de uma vida normal, pois detectando-se a doença em seus estágios iniciais, o remédio impede que ela progrida levando à morte. Os pais de Lorenzo são os heróis. A tragédia que se lhes abateu é a "Voz". A doença era o "dragão", o "monstro", que arrebatou-lhes o filho, mas foi detido, salvando a vida de milhares, e, contando todos que serão ainda salvos ao longo da história da humanidade, milhões de pessoas. Seu Caminho era a luta para destruir o poder letal do "monstro". E foi cumprido.

Felizmente nem todo Caminho possui tais contornos de tragédia. E, no contexto deste artigo, aprendemos que esse Caminho é ele mesmo a própria Verdade. E é a Vida. Quem se afasta do seu próprio Caminho, está longe da Verdade, da Vida, de Deus, das pessoas e de si mesmo. A novidade Cristã, neste contexto é precisamente que este Caminho-Verdade-Vida que se expressa de forma única em cada um de nós, nasceu de uma mulher, viveu como nós e, se chocando de frente com a Morte, destruiu-a por ser mais forte, libertando-nos do jugo dela. Agora cabe a nós escolhermos como passaremos o resto da Eternidade que nos foi concedida e na qual, de certa forma, já vivemos. Viveremos buscando O Caminho universal para que possamos vivenciar sua expressão particular em nossas vidas, buscando viver A Vida para usufruir a expressão particular Dela em nós, buscando A Verdade, para que nós mesmos sejamos "pessoas de Verdade" ou seremos bonecos de madeira, mortos, máquinas de carne que se movimentam por aí da mesma forma que robôs? A escolha é toda e só nossa.

O Brasil na História do Ocidente

O Brasil na História do Ocidente
Fabio Lins

A história do Ocidente, desde antes de Roma, pode ser descrita nos seguintes termos fundamentais: um império, e uma miríade de forças bárbaras. São papéis que foram interpretados por muitos atores ao longo dos milênios mas permaneceram os mesmos. Estes dois elementos sucedessem-se, coexistem, combatem-se e geram um ao outro. Dizer quem veio primeiro é praticamente como querer dizer se quem nasceu primeiro foi o ovo ou a galinha.

Com certeza, Roma é o marco inicial dessa dinâmica. Fica também a questão se ela não teria sido gerada pelos conflitos bárbaros anteriores, mas com certeza é a partir do Império que essa dinâmica fica clara e determinante. Todo o resto da história do Ocidente depois da queda de Roma até hoje é uma grande disputa para ver quem vai ficar com o papel que outrora foi da cidade italiana. O "resumo da história ocidental abaixo" demonstra o que alego.

Com a formação do Império romano, alcança-se um veículo no qual as diversas tribos bárbaras encontram ponto comum para diálogos e mesmo para regras comuns para guerra, conflitos e etc. O mundo, outrora fragmentado nas tribos, está finalmente unificado.

O centro do Império romano passa para Constantinopla. O Império, para desespero dos ocidentais migrara para o Oriente abandonando-os. O mundo ocidental fragmenta-se novamente. Cada rei local, cada tribo bárbara clama para seus líderes o titulo de "rei dos romanos", "imperador dos romanos" nas suas tentativas de conquistar os vizinhos. A Igreja, que preservou a burocracia imperial em sua organização, mesmo sem ser estado, é ainda um improviso de unidade. É uma era de "caos" na sociedade ocidental porque está só é estável se houver bárbaros *e* império em tensão dinâmica, seja construtiva ou combativa. Daí a idéia de que o ocidente seria mais "dinâmico" que o Oriente, que, de fato, fundamenta suas outras civilizações em principíos unitários e não dísticos.

Com o tempo, algumas tribos alcançam poder e influencia para tentar preencher o vácuo deixado pela ausência do império e começam a ensaiar a idéia deles mesmos serem esse império. A primeira tentativa de realce é, naturalmente, o reinado carolíngeo. É principalmente a partir daí que a Igreja ocidental começará a ter o papel estatal que acostumamo-nos a atribuir a ela. Antes disso era apenas a religião local de províncias abandonadas do império, a mercê dos líderes tribais. Foi para dispensar a "proteção" inexistente do Imperador Romano em Constantinopla que os papas passaram a dar apoio aos reis carolíngeos. É a partir daí também que começam a surgir as primeiras falsificações, exercidas pelos carolíngeos, para "reescrever" a história, alegando que o papa recebera o poder secular de Constantino e portanto podia repassá-lo a eles, francos-carolíngeos. É também aí que surge a teoria de "desenvolvimento do dogma" pois os bárbaros francos consideravam o entendimento particular deles do Cristianismo superior ao dos orientais. Criaram então a idéia de que se podiam "acrescentar" coisas aos ensinamentos do Cristo pois eles era uma raça superior, com entendimento superior e portanto livres para ditar
inclusive coisas novas. Os francos eram uma tribo gêrmanica, são os inventores da tese do "sangue azul" e sua crenças racistas deram no que deram no século XX. Passaram a colocar papas dos seus em Roma, provocando a cisão do Cristianismo ocidental de sua matriz oriental. É
a partir daí que o Ocidente começa a achar que o Cristianismo é uma religião ocidental e o resto é "variante" oriental, quando é o preciso contrário.

O Império Carolíngeo foi um esforço adiante de seu tempo porém. Foi uma espécie de primeiro vôo de uma máquina que seria aperfeiçoada ao longo do segundo milênio. Na medida em que os reinos locais iam se fortalecendo, cada um tendia a cultivar as sementes de império que continham em si. É assim que as monarquias medievais vão se tornando as monarquias absolutistas da Renascença. As monarquias absolutistas nada mais são que tribos bárbaras ricas e francas candidatas ao posto de Império e vêem no desenvolvimento das navegações e da descoberta do Novo Mundo o instrumento perfeito de suas ambições. É durante a Renascença e o Iluminismo em que os intelectuais desvinculados da igreja ocidental irão abertamente expor suas teses de formação de uma "paz universal" que nada mais é que o novo império. Essas idéias "revolucionárias" serão a fonte da nova ideologia. Enquanto isso, Holanda, Inglaterra, Espanha e França principalmente lutam desesperadamente para se tornar esse império. Essa disputa será, no século XVIII e XIX, finalmente polarizada por Inglaterra e França que estabelecerão aí dois modelos de império: o império mercantil global, fundamentado no comércio internacional, representado pela Inglaterra; e o Império continental, mais tradicionalista, representado pela França e Napoleão. O primeiro é fundamentado na capacidade de produção mercantil, o segundo em relações aprimoradas de vassalagem entre "nobres" e "servos" que também serão papéis representados por muitos atores a partir daí em todas as variantes e aprimoramentos do modelo
francês a partir daí, dentre eles principalmente o movimento socialista que defende um estado forte, guiado por uma elite de vanguarda que irá prover aos servos. Se são nobres por sangue, por afiliação partidária ou ideológica, não importa. O modelo francês continental sempre crê em um grupo de pessoas nobres guiando a massa.

Se o filhote do modelo francês são os modelos socialistas, o filhote do modelo inglês é, evidentemente, os impérios capitalistas liberais, notadamente os EUA. Foram necessárias duas guerras mundiais para destruir o domínio das forças tradicionais da Europa, dando abertura para os EUA herdarem o poderio inglês e a URSS o ideal revolucionário. Com a queda da URSS, entidades globais como a ONU são as novas herdeiras, além do difuso movimento "progressista".

Temos assim, hoje, a ocidentalização total do mundo. Duas grandes forças representam dois candidatos a império: o modelo comercial americano (que quanto mais se torna império, menos liberal fica, pois são contradições em termos) e no qual o poder é maior para quem mais produz para a sociedade, e o modelo de francês de "massa guiada pelos nobres", quaisquer que sejam os critérios de nobreza ora instituídos. Nem um nem outro é, realmente honesto no sentido estrito do termo. Ambos servem de fachadas para planos pessoais de ambição e poder, mas são dinâmicas sociais com vida própria. Os bárbaros, as tribos menores e com menos recursos, hoje, é todo o resto do mundo e é precisamente porque esse conflito cresceu tanto a ponto de recontextualizar os demais é que se pode falar de ocidentalização mundial.

O Brasil, aqui na América do Sul, nunca quis realmente entrar na disputa para sermos império e esse é o motivo único e exclusivo pelo qual continuamos na condição de "bárbaros" a serem conquistados e pacificados. A tal "mentalidade de colônia" é precisamente a recusa em ser e agir como império. Não é que queiramos ser dominados. Mas é que, sem compreender que na selva internacional só existem dominadores e dominados, recusamos ser dominadores achando que é possível com isso não cair automaticamente na condição de dominados. Daí que quando estamos em uma geração, como a atual, que recusa veementemente o modelo imperial americano, caímos automaticamente na condição de dominados pelo modelo alternativo de dominados pelo império que já foi Francês, Soviético e hoje é "globalista" existente em uma rede de meta-milionários, ONU e associados de nobreza-vassalagem. Quando encontramos força para recusar isso também, nos tornamos entreguistas ao modelo americano. O ciclo só vai terminar quando pararmos de pensar em "com quem vamos nos aliar" para nos apropriarmos das tecnologias sócio-culturais e materiais propriamente ditas de império e nos tornarmos nós mesmos uma força imperialista. Isso ou esperamos a tensão global se acirrar até que aconteça algo, provavelmente uma guerra, que encerre esse ciclo "ocidental" da organização mundial. Mas
aí, podem ter certeza de que o que sobrar depois, não será mais o "nós" que conhecemos. Já não haverá Brasil nem nada, mas alguma outra coisa.

O Brasil, porém, está embarcado nessa bobagem de bloco socialistóide na América do Sul exatamente seguindo a dinâmica descrita. Vamos nos tornar colônias do "império globalista" precisamente porque não juntamos à recusa do império comercial ações e vontade de sermos um
império. Por isso nenhuma retração do gigante colonial Brasil perante gritos de anões com pretensões de serem capatazes regionais do imperialismo globalista me surpreende. Estamos tendo exatamente o que plantamos.

Jesus e as Riquezas Mundanas

Jesus e as Riquezas Mundanas

A relação do Cristianismo com as riquezas mundanas gera diversas polêmicas históricas, políticas e sociológicas. Gostaria porém de fazer alguns comentários exegéticos e teológicos sobre o assunto. Creio que essa questão se encontra muito bem definida no evento em que o jovem rico encontra Jesus (Mc 10, 17:31; Mt 19, 16:30; Lc 18, 18:30). Para quem não lembra, eis o trecho segundo São Lucas:

São Lucas 18

18 E perguntou-lhe um certo príncipe, dizendo: Bom Mestre, que hei de fazer para herdar a vida eterna?

19 Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom, senão um, que é Deus.

20 Sabes os mandamentos: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe.

21 E disse ele: Todas essas coisas tenho observado desde a minha mocidade.

22 E quando Jesus ouviu isto, disse-lhe: Ainda te falta uma coisa; vende tudo quanto tens, reparte-o pelos pobres, e terás um tesouro no céu; vem, e segue-me.

23 Mas, ouvindo ele isto, ficou muito triste, porque era muito rico.

24 E, vendo Jesus que ele ficara muito triste, disse: Quão
dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!

25 Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus.

26 E os que ouviram isto disseram: Logo quem pode salvar-se?

27 Mas ele respondeu: As coisas que são impossíveis aos homens são possíveis a Deus.

28 E disse Pedro: Eis que nós deixamos tudo e te seguimos.

29 E ele lhes disse: Na verdade vos digo que ninguém há, que tenha deixado casa, ou pais, ou irmãos, ou mulher, ou filhos, pelo reino de Deus,

30 Que não haja de receber muito mais neste mundo, e na idade vindoura a vida eterna.

As riquezas, em si, não levam nem à salvação, nem à perdição. São neutras. Um homem pode inclusive ser chamado Justo mesmo sendo rico. A natureza humana, porém, é tal que é difícil para nós mantermo-nos longe das tentações uma vez que tenhamos os meios para obtê-las, seja através do poder financeiro ou político, e por isso Jesus nos alerta para os perigos inerentes a esse caminho, sem com isso reprovar taxativamente os que porventura o trilhem como veremos a seguir.

A leitura mais estimulante, parece-me, é esta que vemos em São Lucas pois logo depois daquele encontro com o mau rico, São Lucas nos apresenta um encontro de Jesus com São Zaqueu, um bom rico (veja o ícone ortodoxo em http://www.thehtm.org/images/a-312.jpg ):
São Lucas 19

1 E, tendo Jesus entrado em Jericó, ia passando.

2 E eis que havia ali um homem chamado Zaqueu; e era este um chefe dos publicanos, e era rico.

3 E procurava ver quem era Jesus, e não podia, por causa da multidão, pois era de pequena estatura.

4 E, correndo adiante, subiu a um sicômoro para o ver; porque havia de passar por ali.

5 E quando Jesus chegou àquele lugar, olhando para cima, viu-o e disse-lhe: Zaqueu, desce depressa, porque hoje me convém pousar em tua casa.

6 E, apressando-se, desceu, e recebeu-o alegremente.

7 E, vendo todos isto, murmuravam, dizendo que entrara para ser hóspede de um homem pecador.

8 E, levantando-se Zaqueu, disse ao Senhor: Senhor, eis que eu dou aos pobres metade dos meus bens; e, se nalguma coisa tenho defraudado alguém, o restituo quadruplicado.

9 E disse-lhe Jesus: Hoje veio a salvação a esta casa, pois também este é filho de Abraão.

10 Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido.

Enquanto o “príncipe” hesita em ser fonte de benesses, São Zaqueu utiliza sua riqueza para auxiliar o próximo sem deixar de desfrutá-la. Fica bem claro que se despojar das riquezas é algo bem mais profundo do que simplesmente doar tudo materialmente. Já dizia S. João Crisóstomo que o pobre que vive ardendo de desejo pela riqueza peca mais gravemente do que muitos ricos. Daí que certas ideologias que vivem de cultivar a inveja da riqueza serem tão tipicamente anti-
cristãs apesar de se apresentarem com pretensões de motivações bondosas.

É apenas com tal entendimento que vamos compreender o Sermão do Monte: Bem-aventurados os *pobres de coração* porque *deles* é o Reino dos Céus. Muitos pobres materiais não são pobres de coração. Vivem desejando a queda da classe dos ricos, sonhando com a ruína alheia e com a fortuna por ela mesma, com o fracasso do vizinho melhor de vida, seja uma pessoa ou um país, do parente afortunado, enfim de todos que estão melhor financeiramente que eles, consumidos por inveja, ganância e ressentimento. Igualmente, alguns po ucos ricos não poderiam fazer menor caso da fortuna que têm em mãos.

Não importa, para nossa salvação espiritual, se temos dinheiro nas mãos ou não. Importa se ele está em nosso coração ou não. O dinheiro *nunca* deve estar em nosso coração, pois este é templo sagrado de Deus. Infelizmente parece que nosso povo é mais “dinheirista” do que cristão. Choca-se mais com crimes de roubo de dinheiro na política do que com milhares de assassinados todos os anos. Ter dinheiro no coração não é simplesmente desejar o dinheiro ardentemente mas achar que o dinheiro vai solucionar tudo, que bastará dar ou ter dinheiro para que os problemas desapareçam. O dinheiro não tem esse poder. Ter dinheiro no coração é também se indignar com roubos e corrupções e ficar indiferente aos atentados contra a vida. Não por outro motivo no capítulo 11 de São Marcos, logo depois do encontro com o mau rico, temos o episódio da expulsão dos vendedores do Templo. Jesus faz externamente aquilo que devemos fazer internamente, isto é, expulsar do templo de Deus em nossas almas o dinheiro, pois Deus se deu a nós de graça para que existindo em nós possamos ofertá-Lo a Ele mesmo, como é dito durante a Anamnese (Rememoração) na Divina Liturgia ortodoxa: “O que é Teu, recebendo-o de Ti, nós Te oferecemos em tudo e por tudo“. Nada temos a ofertar, nem ao próprio Deus, que não tenha sido dado por Ele mesmo anteriormente. Dele provém toda virtude, bondade, graça e alegria.

Aquele que não tem riquezas materiais no coração é que é o “pobre de coração”, mesmo que seja “rico de bolso”. E é importante que mantenhamos isso na cabeça para não cultivarmos determinadas neuras de que se tivermos uma boa condição financeira então estaremos condenados ao inferno, pensamento pernicioso que é talvez responsável por boa parte das mazelas do Brasil em um tipo de auto-sabotagem subconsciente. De fato, no Brasil pensamos que o dinheiro é algo sujo e se vemos alguém rico logo ficamos pensando que “sujeiras” ele deve ter cometido para chegar a tal estado. Isto se dá porque subconscientemente, achamos a riqueza mundana algo sujo e que só pode ser obtida pela sujeira. E assim, apenas os desonestos se interessam por ela e desfrutam o poder de influenciar a sociedade que ela proporciona. Se os bons e os justos brasileiros tirarem essa imagem da riqueza da cabeça poderão eles mesmos obtê-la, permanecendo pobres de coração, e ser a fonte de boa influência nas altas rodas. Já é um ditado popular, e bastante sábio, a sentença que diz que a culpa do mal no mundo não da ação dos maus, mas da omissão dos bons.

Tanto a obtenção da riqueza é algo neutro em si que uma das parábolas mais marcantes de Jesus traz uma imagem praticamente capitalista. E está ligada também ao ciclo “Mau rico-Bom rico” para nos mostrar a dinâmica da relação do homem com a riqueza mundana. Vejamos o trecho, ainda em São Lucas 18, seguindo logo o que foi mencionado por último:

11 E, ouvindo eles estas coisas, ele prosseguiu, e contou uma parábola; porquanto estava perto de Jerusalém, e cuidavam que logo se havia de manifestar o reino de Deus.

12 Disse pois: Certo homem nobre partiu para uma terra remota, a fim de tomar para si um reino e voltar depois.

13 E, chamando dez servos seus, deu-lhes dez moedas, e disse-lhes: Negociai até que eu venha.

14 Mas os seus concidadãos odiavam-no, e mandaram após ele embaixadores, dizendo: Não queremos que este reine sobre nós.

15 E aconteceu que, voltando ele, depois de ter tomado o reino, disse que lhe chamassem aqueles servos, a quem tinha dado o dinheiro, para saber o que cada um tinha ganhado, negociando.

16 E veio o primeiro, dizendo: Senhor, a tua moeda rendeu dez moedas.

17 E ele lhe disse: Bem está, servo bom, porque no mínimo foste fiel, sobre dez cidades terás autoridade.

18 E veio o segundo, dizendo: Senhor, a tua moeda rendeu cinco moedas.

19 E a este disse também: Sê tu também sobre cinco cidades.

20 E veio outro, dizendo: Senhor, aqui está a tua moeda, que guardei num lenço;

21 Porque tive medo de ti, que és homem rigoroso, que tomas o que não puseste, e colhes o que não semeaste.

22 Porém, ele lhe disse: Mau servo, pela tua boca te julgarei. Sabias que eu sou homem rigoroso, que tomo o que não pus, e colho o que não semeei;

23 Por que não puseste, pois, o meu dinheiro no banco, para que eu, vindo, o exigisse com os juros?

24 E disse aos que estavam com ele: Tirai-lhe a moeda, e dai-a ao que tem dez moedas.

25 (E disseram-lhe eles: Senhor, ele tem dez moedas.)

26 Pois eu vos digo que a qualquer que tiver ser-lhe-á dado, mas ao que não tiver, até o que tem lhe será tirado.

Esta passagem se refere a todas as graças de Deus de forma geral. Quer dizer que Deus nos confere dons que devemos utilizar e desenvolver e que aquele que não desenvolve acabará perdendo o dom. Não é possível porém, deixar de considerar a imagem quase capitalista e “especuladora” que Jesus utilizou nessa passagem para dar o ensinamento.

Houve por bastante tempo uma discussão sobre se o casamento seria algo bom. Isso se devia a heresias que pregavam que apenas o ser humano celibatário vivia de acordo com a vontade de Deus. Aqueles que defendiam o casamento apontavam que a união do homem e da mulher
é usada diversas vezes nas Santas Escrituras como imagem da união de Deus com a Igreja. Destacavam, a partir daí, que não poderia ser utilizado algo ruim como imagem de algo bom. Pode-se também dizer que se o lucro, o investimento capitalista e mesmo a especulação financeira fossem algo mal em neles mesmos, Deus não os utilizaria como imagem de algo tão bom e maravilhoso como a ação de Sua Graça sobre a humanidade.

O homem das dez moedas, assim como o das cinco moedas, eram pobres de coração e por isso herdaram as cidades, símbolos do Reino; enquanto o que não investiu e não multiplicou sua riqueza era o que era de fato “rico de coração” apesar de ter permanecido “pobre de bolso”.
Sua moeda foi dada ao mais sábio que por sua vez saberia transformar aquele pequeno investimento inicial em dons. Seja a graça de Deus a inteligência, o dom da palavra, o dom da oração, do entendimento ou mesmo a riqueza mundana, temos o dever santo e sagrado de multiplicá-lo e compartilhá-lo com os nossos próximos.

No desenho animado “José: Rei dos Sonhos”, que conta a história deste personagem do Antigo Testamento*, tem uma música “à la Disney”** cujo refrão resume bem o espírito dessa mensagem:

“Você tem que dar um pouco mais do que recebeu, tem que deixar um pouco mais do que estava aqui. É a própria medida da sua alma que está em jogo. Você tem que dar um pouco mais do que recebeu”.

Tal é a mensagem da parábola do Mau Investidor, que é tambem o Mau Pobre e a imagem que se deve seguir, personificada em São Zaqueu e no Patriarca José, que representam o Bom Rico, para que se dê bom uso à riqueza, de modo que na fortuna ou na miséria, mantenhamos sempre Deus, e unicamente Ele, no templo de nosso coração. Viver desejando sempre a Deus e o bem do próximo e não a riqueza, qualquer que seja nossa condição material.

Abraços, que Jesus Cristo na Santíssima Trindade e sua Santa Mãe nos abençõe! Peçamos pelas orações de São Zaqueu e do Patriarca José, para nos iluminar nesse tópico.
Fabio Lins

* Vejam ícones ortodoxos do Patriarca José:
http://www.comeandseeicons.com/j/inp109.jpg e
http://www.thehtm.org/images/a-77.jpg

** Vejam o clipe em: http://youtube.com/watch?v=6WDXCEmpuYI

O Verdadeiro Significado de "Todos Sejam Um"

Congregação Episcopal Retorna à Ortodoxia

9 de Julho, 2007 (Daily Oklahoman)

Uma nova igreja ortodoxa está em formação no norte de Oklahoma City.

Mark Wallace, um ex padre carismático da Igreja Episcopal, está liderando suas antigas congregações em sua transformação para cristãos ortodoxos. Wallace e muitos membros da antiga Igreja Episcopal Carismática da Santa Trindade, estão assistindo a aulas e frequentando os ofícios na Igreja Ortodoxa Antioquina de Santo Elias.

"Não tenho dúvidas em minha mente de que a Ortodoxia tem algo a oferecer à vida americana. É um segredo bem mantido," ele disse.

Wallace diz que sua jornada para o Cristianismo Ortodoxo começou ano passado quando ele ficou perturbado pelos eventos na Comunhão Internacional de Igrejas Episcopais Carismáticas, uma denominação formada em 1992 e que agora conta com perto de 1.000 igrejas em 20 países.

O ex-padre Mark, 53, formado pela Universidade Oral Roberts, disse que iniciou a paróquia de Santa Trindade em 1996 como uma Igreja Episcopal Carismática e que discordava do bispo em questões doutrinais.

Wallace também disse que em dezembro de 2006 contatou o pastor da Santo Elias, o reverendo Constantine Nasr, com fins de explorar a possibilidade de se tornar parte da comunidade cristã ortodoxa.

Padre Nasr, 62, disse estar feliz por ajudar Wallace e sua congregação a aprender mais sobre o Cristianismo Ortodoxo., mas que não estava surpreso pelo interesse dele.

"Desde da ascenção e da queda do evangelismo pela TV, desde de todo o liberalismo em algumas denominações, a Igreja se esfacelou," ele disse.

"As pessoas querem consistência. Querem tradição. Querem os sacramentos. Através da Internet, eles descobriram a Igreja Mãe e por muitas razões estão decidindo retornar ao lar da antiga fé."

Wallace comentou que foi atraído para a Igreja Cristã Ortodoxa por sua estabilidade no que concerne doutrina, liturgia e governo da igreja.

"Estou convicto que a Igreja Ortodoxa é a Igreja que Jesus fundou. Não existe isso de re-inventar a roda, que era o que eu fazia na outra igreja. Estávamos sempre mudando," ele disse.

Inicialmente, Wallace convocou uma reunião para discutir seus pensamentos sobre tornarem-se parte da comunidade da fé Cristã Ortodoxa. A congregação de Santa Trindade se encontrou na Igreja Comunitária de Nosso Senhor. Ele disse que sua idéia encarou um certo ceticismo saudável de alguns membros de sua congregação, e que esperava isso. No fim, cerca de 52 dos 65 membros da paróquia resolveram seguir com ele na jornada para a Ortodoxia. Começaram a freqüentar as aulas na Santo Elias para aprender as Santas Tradições e Sacramentos da Igreja Ortodoxa.

O último ofício sob a igreja episcopal carismática ocorreu no fim de março.

Padre Nasr estava presente no ofício e disse que comoveu-se quando Wallace foi retirando suas vestes episcopais carismáticas simbolizando que não era mais do clero.

"Ele foi retirando as vestes peça por peça," Nasr disse. "Estávamos todos chorando porque era como morte para esta comunidade."

Nasr disse que Wallace é leigo para a Igreja Ortodoxa, mas que continua com sua congregação como pastor ou líder. Wallace está matriculado nos cursos livres da St. Stephen's House of Studies e esperar ser ordenado diácono e padre na Igreja Ortodoxa. Nasr disse que o caminho de Wallace para o clero ortodoxo não será tão longo quanto normalmente seria porque ele já possui treino de seminário.

Nasr disse que espera ver a congregação, que será chamada de Igreja Cristã Ortodoxa Santo André, ser crismada na Igreja Ortodoxa até o Natal. Wallace disse que antigos membros da Santa Trindade participam nos serviços de matina da Santo Elias, um ofício de oração matinal. Nasr disse que após esta crisma poderão receber comunhão na Igreja Ortodoxa.

"Isto será um presente de natal," ele disse.

Wallace afirma que sente que encontrou o que muitos estão buscando.

"Um dos maiores problemas que vemos é a falta de raízes dos cristãos. Eles saem de uma igreja para outra. Ficam procurando por algo, e acho que procuram por suas raízes espirituais," ele comentou.

"Tudo que eles tentam possui algo de bom, mas eu diria que a Igreja Ortodoxa fornece uma expressão total da fé cristã."

http://www.serbianna.com/news/2007/01966.shtml

Patriarca Alexei II convida a Europa à Moralidade

http://english.pravda.ru/world/europe/98211-orthodox_church-0

Europa se revolta contra lição de moral da Igreja Ortodoxa Russa

04-10-2007

A mídia russa e de outros países lançaram diversos comentários sobre a recente aparição do líder da Igreja Ortodoxa Russa, Patriarca Alexei II, na seção da Assembléia Parlamentar do Conselho da Europa em Strasbourg.

Foi a primeira vez na história que um alto líder religioso da maior confissão da Rússia apareceu perante delegados da Assembléia. Mais importante ainda, foi a primeira visita de Alexei II a um país católico.

O Jornal Novye Izvestia relata que a aparição de Alexei II perante os delegados deu origem a um grande debate antes mesmo de sua visita à França. Jornalistas conjeturavam se o Patriarca iria falar no tom do "pregador bonzinho" ou como um "duro acusador". Em Abril, Alexei II dissera que durante uma aparição planejada perante o Conselho da Europa ele iria falar sobre valores cristãos que a Europa ocidental estava, infelizmente, perdendo enquanto propagandea o pecado.

Em entrevista para o jornal La Vie o Patriarca disse que os russos criados segundo a tradição ortodoxa cristã tinham sua própria visão sobre muitos dos problemas modernos. Uma verdadeira cooperação Pan-Européia não pode ser estabelecida se esta visão não for levada em consideração, disse Alexei II.

O discurso do Patriarca no Conselho da Europa foi tratado de modo semelhante ao de um político de alto nível. O jornal Le Figaro chama a Igreja Ortodoxa Russa "a única instituição estável em uma Rússia instável". O modo de Alexei de falar é sempre suave a não-agressivo, exatamente ao estilo dos políticos peso-pesados.

Em seu discurso na Assembléia, o Patriarca não falou abertamente que a menção ao "código singular", os valores cristãos, não foi inclusa no rascunho da constituição da União Européia a despeito do fato de que representantes da Espanha e Polônia católicas haviam insistido que devessem ser incluídos no documento. O Patriarca russo enfatizou que a lacuna que há hoje em dia entre os direitos humanos e a moral era desastrosa para a Civilização Européia. Ele disse que esta lacuna era agravada pela "aparição de uma nova geração de direitos que contradizem a moralidade e buscam justificar atos imorais com direitos humanos". Alexei II pensa que quando a moralidade não é aplicada para avaliar os atos das autoridades, os problemas sociais se tornam ainda mais insolúveis.

Entretanto, o Patriarca russo revelou uma atitude categórica da Igreja Ortodoxa Russa quanto a paradas gays e minorias sexuais. Alexei II disse que a Igreja Ortodoxa Russa tratava as tentativas de organizar paradas de orgulho gay em Moscou como manipulação e propaganda do pecado. Ele disse que o homossexualismo é uma doença e uma distorção da personalidade humana assim como a cleptomania e perguntou: "Por que não fazemos propaganda da cleptomania?" Mas, ao mesmo tempo, Alexei II acrescentou que sua religião o ensinava a amar os pecadores a despeito dos seus pecados. A comparação do Patriarca entre a homossexualidade e a cleptomania recebeu uma tempestade de aplausos de seus delegados russos enquanto os outros abstiveram-se de comentários demonstrativos sobre a questão.

O Patriarca alertou o Conselho de delegados da Europa de que um rompimento entre os direitos humanos e a moralidade ameaçava a civilização Européia. Continuou enfatizando que as pessoas devem combater o pecado e não os pecadores e respeitar os ensinamentos morais da Bíblia.

Mas o Patriarca russo acrescentou que o governo não deve interferir com a vida privada já que é uma escolha livre do indivíduo ser moral ou imoral.

O jornal Rossiiskaya Gazeta afirma que a aparição do Patriarca perante o Conselho foi o primeiro de um tão alto nível. A Igreja Ortodoxa Russa é a primeira e única confissão representada no Conselho da Europa como um estado. Em 2005, o Patriarca aprovou a abertura de um escritório representativo da Igreja no Conselho da Europa para o estabelecimento de um diálogo regular e constante.

De acordo com o Patriarca russo, nenhuma ideologia, incluindo a secular, pode ter o monopólio da Europa ou do mundo. E é por isso que ele pensa que a religião não pode ser posta para fora do espaço público. É hora de assumir que pode existir também uma motivação religiosa na esfera pública, disse Alexei II.

Um dos delegados perguntou ao Patriarca qual era sua atitude quanto a pena de morte e Alexei II respondeu que a Igreja sempre defendeu a proteção da vida tanto dos bebês não nascidos quanto dos criminosos. Neste discurso em particular, seu discurso foi altamente emocionado.

Como disse o Patriarca, o progresso tecnológico provê uma nova interpretação dos direitos humanos. Os fiéis possuem sua própria opinião sobre bioética, identificação eletrônica e outros ramos do progresso tecnológico que deixam muitas pessoas ansiosas. O jornal Kommersant cita o Patriarca afirmando que um ser humano deve sempre permanecer um ser humano e não um artigo sob o controle de sistemas eletrônicos sempre a disposição de experimentos.

Os europeus acharam que Alexei II foi mais crítico quando tocou na muito popular religião européia do politicamente correto.

Ontem, a Gazeta GZT.ru relatou a aparição do Patriarca no Conselho em uma publicação intitulada "Rússia desconsidera envolvimento no Conselho da Europa mas Patriarca Alexei II ensina moralidade a Europa".


A Rússia é a principal ré na Corte Européia de Direitos Humanos mas a corte não está satisfeita com a cooperação deste país. Delegados do Conselho da Assembléia Parlamentar da Europa adotaram uma resolução que requer que os países membros devam manter cooperação em todos os níveis do procedimento judicial. De acordo com a Assembléia, a violação da lei no norte do Cáucaso é a mais escandalosa.

Source: agencies

Traduzido para o inglês por Maria Gousseva
Traduzido do inglês para o português por Fabio Lins
Pravda.ru

Vídeo do discurso: http://www.russiatoday.ru/news/news/15010/video

A Alma Portuguesa

A Alma Portuguesa

Autoria: Padre Andrew Phillips

Tradução: Fabio Lins

As Nações dos homens existem pelo que há de melhor no homem, e são destruídas pelo que há de demoníaco nele.

John Masefield, Gallipoli

Toda terra passa por períodos de grandeza e períodos de declínio. Os períodos de grandeza expressam o entusiasmo da terra e seu povo por algum ideal e insight espirituais, por alguma grande idéia. Nestes momentos a essência espiritual de um país, a alma de seu povo, se torna aparente. Períodos de declínio expressam a traição e a perda desse ideal em favor de uma atração fatal e decadente por uma paixão mundana por riquezas terrenas, terra e poder, e obscurecimento daquela alma nacional e sua essência espiritual. Deste modo muitos grandes impérios, tanto antigos quanto novos, ergueram-se e caíram, seja o Babilônio, o Egípcio, o Macedônio, o Romano Ocidental, o Persa, o Romano Oriental, o Zimbabwense, o Mongol, o Asteca, o Inca, o Português, o Espanhol, o Mogol, o Chinês, o Otomano, o Austro-Húngaro, o Francês, o Britânico ou o Soviético. Iremos aqui analisar a grande idéia e o ideal espiritual que flamejava na alma de Portugal e seu povo.

O primeiro período da história de Portugal, o período Ortodoxo, começa antes mesmo de Portugal como o conhecemos hoje existisse, com a missão de São Tiago Apóstolo, filho de Zebedeu e irmão de São João, aos habitantes romanizados da Península Ibérica. Até hoje sua memória é lembrada na Galícia, ao norte das atuais fronteiras de Portugal, na grande cidade de peregrinação de São Tiago - Santiago de Compostela, na qual suas santas relíquias ainda são veneradas. Tal era a fama deste lucar que em 1049 o Bispo de Compostela foi excomungado pelo recém-reformado papado por dizer a verdade: que ele também, como o Bispo de Roma, era bispo de uma Sé Apostólica. Embora hoje Santiago esteja fora das fronteiras portuguesas na Galícia – que fala um dialeto próximo ao português – a peregrinação à cidade do Santo Apóstolo Tiago marcou, como veremos, a alma portuguesa por toda a sua história.

O primeiro santo da Lusitânia e da Galícia, como Portugal era então conhecido, é do primeiro século. Trata-se de S. Basílio (23 de maio), o primeiro Bispo de Braga, aquela cidade no norte de Portugal que se tornou o coração espiritual do país, dando origem ao ditado português, “tão velho como a sé de Braga”. A ele seguiram os mártires S. Paulo, Heracleus, Secondilla e Januarius do Porto (02 de março). S. Veríssimo, Máxima e Júlia de Lisboa (01 de outubro) foram todos martirizados por volta do ano 300, e S. Vítor de Braga (12 de abril) foi batizado em seu próprio sangue recusando-se a adorar os ídolos em 303.

No quinto século, depois da invasão da Península Ibérica pelas tribos germânicas dos Suevos e dos Visigodod que adotaram o arianismo, outro mártir viria a adornar a Igreja Portuguesa: S.Pedro, Arcebispo de Braga (26 de abril). E ainda S. Mancius, Bispo de Évora (15 de março) também foi martirizado no século V d.C. . Depois destes veio o grande santo português e pai monástico, S. Martinho, Arcebispo de Braga (579), comemorado no dia 20 de março e conhecido como Apóstolo da Galícia, que converteu o rei dos suevos do arianismo para a Ortodoxia e que, junto com seus discípulo Pascanius, traduziu os Ditos dos Padres do Deserto do grego. E não podemos deixar de mencionar o nome de um outro grande pai monástico, S. Frutuoso de Braga (665), comemorado no dia 16 de abril, o qual, iluminando os visigodos, escreveu uma regra monástica. Deste período existem ainda as igrejas do século sétimo de S. Frutuoso em Montélios, perto de Braga, construída para as relíquias de S. Frutuoso na forma de uma cruz grega e de S. Pedro em Balsamão e de Santo Amaro em Beja.

Este primeiro período da história e de prosperidade espiritual portuguesa terminou em 711 com a invasão dos mouros vindos do norte da África. Eles iriam tomar a maior parte da Península Ibérica e mesmo ameaçarem os povos vivendo no território do sul da França, onde foram detidos apenas na Batalha de Poitiers em 732. É desta época que vem a famosa lenda ibérica de sete bispos que fugiram através do Atlântico para “Antilia”, a Ilha de Sete Cidades, uma lenda que iria assombrar a consciência portuguesa, como veremos, por muitos séculos. As invasões mouras provocaram um movimento de resistência cristão nos séculos 9 e 10, que lutavam para libertar o norte e o centro da Portugal atual do jugo muçulmano. Dois santos destacam-se neste período: S. Rosendus de Dume (967), santo bispo e restaurador do monasticismo na Galícia, celebrado no dia 01 de março, e sua parente, a santa abadessa Senhorinha de Basto (982), celebrada no dia 22 de abril. A época também pertencem as outras únicas igrejas Pré-Romanescas, ou Ortodoxas, de Portugal, em Lourosa, fundada em 913.

Este segundo período da história portuguesa, o do Jugo Muçulmano, começa então em 711 e irá durar na maior parte do centro de Portugal até 1064. Foi neste ano que uma reconquista iniciou-se do norte, da região livre do Porto, a qual em 1139 iria determinar as fronteiras de um novo estado independente de nome inspirado em si – Portugal. Esta Reconquista não estaria completa até o século XIII no sul de Portugal, onde a presença árabe ainda é muito lembrada pelos nomes de muitos lugares, como ‘Algarve’, o qual em árabe significa ‘o ocidente’.

Gradualmente então, depois de 600 anos, o Jugo Muçulmano fora rechaçado. Mas depois disto Portugal teria que enfrentar uma nova tragédia, pois a Reconquista de 1064 fora patrocinada por uma nova ideologia estrangeira – o Catolicismo Romano. Por volta de 1080 esta ideologia, desenvolvida pelo agressivo Papa Hildebrando e utilizando influência francesa, já havia quase que completamente suprimido o muito amado rito litúrgico Moçárabe ou Hispânico que havia conservado a antiga liturgia romana e ocidental dos primeiros séculos. Em torno de 1147, quando Lisboa finalmente foi retomada dos mouros, estava claro que a conquista litúrgica de Portugal e de toda Ibéria estava completa: a antiga espiritualidade Ortodoxa Romana-Moçárabe dos primeiros dez séculos de histórica ibérica havia desaparecido. A era do Jugo Muçulmano havia acabado, mas também a era de grandeza espiritual portuguesa. Esta fora substituída por uma nova ideologia papal disseminada por uma elite na França, uma ideologia que se tornou cada vez mais forte ao longo da Idade Média. Os fiéis portugueses se encontravam privados da fé de seus ancestrais, naquele estado de privação espiritual que tem sido a amarga herança e doença da Europa Ocidental durante todos estes longos anos desde o século XI.

No século XIII, portanto, a alma e a história de Portugal haviam sido capturadas por uma nova ideologia e surgia no povo português uma saudade por um Espírito Santo ausente, por um Paraíso perdido que seus ancestrais haviam conhecido. Assim, com o fim do Jugu Muçulmano, inciou-se o terceiro período da história portuguesa, e que atingiu seu apogeu nos séculos XV e XVI. Este é o período dos grandes exploradores, como Henrique, o Navegador, Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, Alfonso de Albuquerque, Pedro Álvares Cabral e Fernão Magalhães, quando a influência portuguesa se espalhava não apenas da África ao Brasil, mas também até a China e o Japão. Este período de grandes descobertas iria terminar no século XVI quando Portugal inicia seu súbito e enigmático declínio, o quarto de sua história. O enigma do quarto período, seu declínio, só pode ser compreendido em contraste com o seu terceiro período, o de grandeza mundana. O que é que movera os exploradores portugueses e mesmo não-portugueses envoltos neste mesmo espírito, a navegar de Portugal em busca do desconhecido e assim lançar os fundamentos de um império colonial? Para compreender o espírito destes exploradores e porque partiram, não podemos fazer melhor senão observarmos o mais famoso exemplo, o de um não-português, que partiu com apoio espanhol: Cristóvão Colombo.

Nascido em 1451 em Gênova mas quase certamente de origens ibero-judaicas, Colombo ou Colón como preferia ser chamado, conhecia o Mediterrâneo muito bem como marinheiro e era um reconhecido cartógrafo. Com a idade de 25, iniciou morada em Portugal, casou-se com uma portuguesa e viveu por algum tempo na recém-descoberta ilha de Madeira, em cujas praias ele comumente encontrava plantas e madeiras que vinham flutuando de algum país misterioso ao oeste. De Madeira e Portugal ele navegou para África, Inglaterra, onde os navegantes lhe falavam de Newfoundland e para Irlanda e Islândia, onde mais uma vez ouvia falar de terras ao oeste. De 1480 em diante, Colombo torna-se fascinado pela idéia de explorar o oeste, convencendo-se que não apenas encontraria uma nova terra, mas um Novo Mundo, a Jerusalém Terrena. De caráter instável, às vezes beirando a insanidade, este homem de origem judaica, se sentia escolhido por Deus como Messias para a missão de descobrir um Novo Mundo. Nisto ele era guiado por uma profecia do Livro de Isaías (11:10-12), que diz:

“Naquele dia a raiz de Jessé será posta por estandarte dos povos, à qual recorrerão as nações; gloriosas lhe serão as suas moradas.

Naquele dia o Senhor tornará a estender a sua mão para adquirir outra vez e resto do seu povo, que for deixado, da Assíria, do Egito, de Patros, da Etiópia, de Elão, de Sinar, de Hamate, e das ilhas de mar.

Levantará um pendão entre as nações e ajuntará os desterrados de Israel, e es dispersos de Judá congregará desde os quatro confins da terra.”

Colombo foi ainda inspirado por muitos escritos e tradições, algumas das quais vinham da Grécia Antiga. Além das mais antigas, havia a bem conhecida lenda do sexto século da vida do irlandês S. Brandão, o Navegador, que havia navegado para uma terra além do Atântico, uma entrada para o Paraíso terrestre. Esta terra era chamada “Brasil”, significando em Gaélico “grande ilha”. Em segundo lugar, Colombo conhecia bem de Portugal a história de Antilia, a Ilha das Sete Cidades, para onde haviam fugido sete bispos depois da invasão dos mouros em 711. Por fim, havia o fato de quem em 1492 ( o simbólico ano de 7000 desde a Criação do Mundo, e que Colombo entendia literal e não simbolicamente), a Reconquista da Península Ibérica tinha se completado e muitos desejavam levar a Reconquista além tomando Jerusalém e assim iniciar o oitavo e último milênio no qual o mundo iria acabar.

De fato, no ano de 1492, o primeiro ano do oitavo milênio, Colombo partiu para encontrar o “Novo Mundo”, descobrindo o que hoje chamamos de Índias Ocidentais. Em 1493-4 ele retornou ao local com sete navios e mais de mil colonistas. Colombo estava convecido de que havia encontrado naquelas ilhas não apenas “Antilia”, a Ilha das Sete Cidades, mas também ‘Cipango’ (Japão) e Índia.

Foi por causa destes erros que o nome de “Índias Ocidentais” foi dado a estas ilhas e que o nome “índios” foi usado para todos os habitantes das Américas e que as Índias Ocidentais também eram conhecidas como Antilhas. Em uma terceira expedição, em 1498, Colombo descobriu a América do Sul. Tendo encontrado um enorme golfo de água doce na boca do Orinoco, ele decidiu que este seria um dos quatro rios que fluem do Paraíso, como descrito no Gênese, capítulo 02:

10. Um rio saía do Éden para regar o jardim, e dividia-se em seguida em quatro braços: 11. O nome do primeiro é Fison, e é aquele que contorna toda a região de Evilat, onde se encontra o ouro. 12. O ouro dessa região é puro;”

Retornando a Espanha, de 1500 em diante Colombo se tornou mais e mais obcecado em encontrar este Paraíso, a Jerusalém terrena, a cuja descoberta seguir-se-ia o fim do mundo. Em 1502, ele partiu em uma quarta expedição, buscando a não-existente passagem através do que é hoje o Panamá para o que haveria depois – o Paraíso. Em 1504 Colombo iria retornar, exausto e amargamente decepcionado, sem ter encontrado o tal Paraíso. Os colonizdores que viajaram com ele revoltaram-se contra o navegador, por não terem encontrado ouro o suficiente, trucidando e explorando os povos indígenas primitivos. Colombo não viveu à altura de seu nome: Cristóforo Colón – O Colonizador Portador de Cristo.

Mesmo sem que ele mesmo tenha nascido em Portugal, Colombo ilustra bem a tragédia histórica de Portugal, o resultado de inúmeros fatores específicos. Primeiramente, como resultado da perda de sua fé Ortodoxa, Portugal perdeu o Espírito Santo, o Espírito que havia sido trazido ao território português por S. Tiago, o Apóstolo. Em segundo lugar, Portugal teve suas ambições frustradas por séculos pelo Jugo Muçulmano. E em terceiro lugar, sua posição geográfica era tal na extremidade da Europa que Portugal sempre contemplava com curiosidade o sol poente através do misterioso Oceano Atlântico, fonte de tantas lendas.

E não menor entre estas lendas é a de que a Antiga Fé de Portugal poderia ser ainda encontrada além-mar, entre os sete bispos da Ilha das Sete Cidades. A idéia nacional e o ideal espiritual da alma de Portugal, uma alma peregrina desde a época de São Tiago Apóstolo, chegou a fruir no século XV quando partiram em na jornada pelo Espírito Santo, por Jerusalém, pelo Paraíso. No entanto, privados da orientação espiritual e sem guias, confundiu o terreno e o celestial, e os que partiram não encontraram o Paraíso, mas ouro, poder e as terras de povos primitivos. Não encontraram Jerusalém, mas a Babilônia, encontraram não um Império da alma, tal como S. Martinho de Braga uma vez lhes descrevera, mas um Império da terra.

Apenas este veneno pode explicar porque, depois de dois séculos de explorações heróicas entre 1384 e 1580, Portugal entrou em rápido declínio. Portugal não encontrou o Espírito Santo, mas ouro, poder e território; encontrou não o espiritual, mas o material e assim esqueceu e abandonou sua alma peregrina, traindo sua essência e ideal espirituais, sua peregrinação celestial, tornando-se apenas um agregado material. Portugal deixou de se desenvolver, deixou de trabalhar a si mesmo, perdendo seu grande ideal, seu destino espiritual e seu insight e decaiu, tornando-se uma nação esquecida pela Europa.

E hoje, tudo isso é lembrado não apenas pela palavra portuguesa ‘saudade’, que significa um desejar nostálgico e um anseio triste de um povo cuja alma peregrina está capturada entre o céu e a terra sem o Espírito Santo, mas também no lamento melancólico e assombrado da música tradicional portuguesa, o ‘fado’. E ainda assim temos certeza que quando a alma Portuguesa despertar para sua Antiga Fé, então grande será a festa de seus peregrinos ao reencontrar a fé de S. Tiago Apóstolo e dos sete bispos da Ilha das Sete Cidades.

Todos os santos da Terra Portuguesa, orem a Deus por nós!

Original aqui.

O tempo está correndo contra os Liberais

O tempo está correndo contra os Liberais

Retirado do site Orthodox England em 11/10/2007. Tradução de Ricardo Williams a partir do artigo original Time is against the liberals.

Como muitos sabem, a Igreja Ortodoxa jamais sofreu a maciça perda de fé que assola as denominações protestantes e católica romana, nem tampouco a resultante secularização de sua herança cristã ocorrida a partir da década de 1960. Há quarenta anos, vemos notícias diárias sobre a célere e constante descristianização da Europa Ocidental - mais do que podemos sequer imaginar. Por exemplo, na França há católicos romanos pedindo para serem "desbatizados"; na Alemanhacerca de 10.000 igrejas vazias serão postas à venda nos próximos anos devido à falta de fiéis; em uma diocese católica romana na República Tcheca, cerca de quarenta igrejas vazias estão à venda, incluindo um mosteiro de 2.000 hectares, pela bagatela de $ 120.000,00; a mribunda comunhão anglicana está dividida devido à inclusão de homossexuais assumidos e praticantes em seu clero. o Metodismo mostra-se decadente; a fé religiosa na Holanda e Escandinávia está desaparecendo; e na Bélgica há uma severa falta de padres.

No entato, segundo uma reportagem da Christian Science Monitor de 11/10/2007, o cristianismo Ortodoxo pode ser um "bálsamo para a Europa", e que as velhas previsões dos arrogantes sociólogos europeus ocidentais de que a Igreja Ortoodxa está acabada "se mostraram incorretas". A revista afirma que:

"Hoje, assim como na parábola do filho pródigo, em toda a Europa Oriental, as pessoas estão retornando em massa à Igreja Ortodoxa, e o resultado tem sido muito benigno, especialmente na esfera pública, ao contrário do que se esperava". E ainda: "Tentativas de provar que o secularismo moderno é o 'pomo dourado da democracia' ou 'ressaltar quaisquer desafios ao secularismo como exemplos depreciativos de diferenças de valores entre Ocidente e Oriente' não são mais aceitas. Com um número de fiéis que cresce exponencialmente, e dada a influência e recursos da Igreja Ortodoxa na Europa Oriental, esta é uma batalha que os Europeus Ocidentais estão fadados a perder." Segundo o autor do artigo, "é hora de repensarmos nossas velhas opiniões sobre os fiéis Ortodoxose aproveitarmos as enormes contribuições que eles podem dar à criação de um contrinente pacífico e próspero".

O discurso que o Patriarca Aleixo II fez na França na semana passada, falando sobre a moralidade e sua origem - a vida espiritual - serviram apenas para realçar o ponto de vista Ortodoxo. Segundo o autor, o relativo isolamento da Igreja Ortodoxa "deve-se ao fato de que cristãos roamnos e protestantes freqüentemente recusam-se a ouvir como iguais aqueles que deles discordam". E ainda, "com exceção da Grécia, este triste legado é responsável pela morosidade com que europeus ocidentais aceitam países com população majoritariamente Ortodoxa em instituições pan-européias. Porém, em sua expansão em deireção do leste, é inevitável que os valores e moral de instituições da Europa Ocidental sejam influenciadas cada vez mais pela visão conservadora dos cristãos Ortodoxos, e cada vez menos pelas opiniões modernas e secularizadas das democracias ocidentais do continente. Hoje, em toda a Europa, há mais Ortodoxos do que Protestantes, e segundo algumas estimativas, esse número irá ultrapassar até mesmo o de católicos romanos. Se a Europa da século XXi assumir uma identidade religiosa, esta será predominantemente Ortodoxa".

Prevendo tais fatos, o analista do Departamento de Relações Exteriores da Igreja Ortodoxa Russa, pe. Vselevod Chaplin, fez ontem o seguinte comentário: "Uma vida sem Deus leva as pessoas ao desespero, à confusão e à infelicidade, mesmo que elas possuam dinheiro, poder e armas. Valores morais eternos nunca envelhecem [...] Não há futuro sem valores morais, pois do contrário, o futuro se tornará nada além de oblívio e destruição". Pe. Vselevod disse ainda que "muitas pessoas, especialmente políticos liberais, de uma geração mais antiga, não concordam com as posições da Igreja da Rússia. [...] Mas o tempo está contra eles, e seu monopólio sobre a política e as questões sociais logo chegará ao fim".

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Atenção: todos os direitos desta tradução estão reservados a seu autor. Este texto não pode ser reproduzido integral ou parcialmente sem a prévia e expressa autorização do tradutor.

Punks Ortodoxos


Um grupo de punks da Califórnia convertidos à Igreja Ortodoxa "ressuscitou" um zine que era editado por monges ortodoxos do Mosteiro de São Germano do Alasca, o "Death to the World", "Morte para o Mundo". Hoje, com a assistência espiritual dos monges realizam um trabalho junto aos jovens de tribos semelhantes abordando temas como suicídio, drogas, sexo e quanto mais os jovens se interessarem, tudo sob perspectiva ortodoxa. Seu trabalho também inclui a divulgação das vidas dos santos para que os jovens tenham bons exemplos e referências.

"Morte para o mundo" tem um significado técnico específico na ascese cristã. O "mundo" é o "reino dos sentidos e dos impulsos". Hoje em dia as paixões são idolatradas como uma forma de auto-afirmação. Siga o que diz seu coração, faça o que der vontade, é o lema. Porém, paixão, tem a mesma origem de passividade, tanto que a pessoa de paixões intensas é muito "passional". Ser passional é ser passivo embora isto não esteja claro nos dias modernos. A pessoa que se deixa levar por impulsos egoístas, glutões, luxuriosos, acidiosos é fundamentalmente um joguete seja do ambiente que a cerca, dos amigos, família, inimigos, estranhos e mesmo demônios. A paixão é a reação passiva que temos ao que quer que se imponha a nós, desde um prato fumegante até a oferta de dinheiro ilícito; da mentira da droga como experiência até a soberba intelectual; desde o desejo da satisfação sexual imediata até os "sofisticados" fascínios da vaidade (lembram-se do "Advogado do Diabo"? :) ) Não é à toa que a sociedade hoje é feita de "pessoas-massa" acéfalas. São todas pessoas cheias de paixões.

Não podemos nos deixar enganar pelo fato de a palavra paixão, em português, significar também amor intenso. Não é disso que os santos e os amigos punks aí de cima estão falando, e tampouco é "amor intenso" o que nos guia no dia a dia - algo que percebemos apenas se tivermos um mínimo de humildade. Ou será que alguém vai dizer que é amor intenso que o faz querer ficar com várias pessoas, aceitar "um por fora" para fazer algo "levemente" ilegal, ou tirar onda (leia-se humilhar) com pessoas que não tem algo que temos?

O "mundo" são todas estas paixões que impedem que experimentemos a verdadeira Paixão, aquela que é tão nobre que denomina a própria ação de Deus no Seu caminho de nossa Salvação: A Paixão de Cristo. Esta sim é a suprema "passividade" no sentido de aceitar "passivamente" até a tortura e a morte por muito amar. Como Ele disse em S. João 15:

13 Ninguém tem maior amor do que este: dar a sua vida pelos seus amigos.

Isto é Paixão, com P maiúsculo. O resto é conversa fiada.

O site dos caras:
Death to the World!

E uma entrevista com eles:
http://audio.ancientfaith.com/illuminedheart/IH26-JohnandMarina_081207.mp3

A Mentalidade da Igreja Ortodoxa

A Mentalidade

da Igreja Ortodoxa


Metropolita de Nafpaktos, Arquimandrita Hierotheos
Trecho do livro de mesmo nome
Tradução e resumo: Fabio Lins
Origem e Revelação da Igreja



Através dos séculos surgiram muitos ensinamentos heréticos que distorceram a verdade revelada e que foram confrontadas pelos Pais “com a funda do Espírito”, isto é com o poder do Espírito Santo. E assim é porque os santos Pais eram os portadores da pura Tradição da Igreja.




Entre estas heresias estavam as do arianismo, dos pneumatôcos que lutavam contra o espírito, dos nestorianos, monofisitas, monotelistas, iconoclastas, etc. Todas estas heresias referem-se principalmente à Pessoa do Cristo, mas também à do Espírito Santo, e, naturalmente, perturbam os fundamentos da salvação do homem. Pois se Cristo não é consubstancial com o Pai, mas sua primeira criatura e se o Espírito Santo não é verdadeiro Deus, a salvação do homem fica em dúvida, a possibilidade de deificação é abortada.




Posteriormente, durante o século quatorze, uma outra heresia surgiu, que foi expressa por Barlaam e baseada no racionalismo. Se os ensinos de Barlaam houvessem prevalecido, o método do caminho ortodoxo para a deificação, que é o hesicasmo, teria acabado realmente em agnosticismo.




A questão que levantamos é se existem ainda hoje heresias. A resposta não é difícil de encontrar porque todos somos testemunhas do fato de que existem hereges nos dias de hoje, descendentes dos grandes heréticos, e de que existem ensinamentos heréticos sendo divulgados, talvez não deliberadamente, por pessoas que crêem, entre outras coisas, que realmente são membros da Igreja de Cristo. E realmente todos nós, em nossa ignorância e falta de conhecimento, podemos cultivar algumas visões erradas a respeito de Deus e da salvação, mas devemos lutar para nunca nos tornarmos heresiarcas ou descendentes dos grandes heréticos que apareceram na história da Igreja.


Além disso, todos os hereges foram membros da Igreja por um tempo, mesmo no clero e eram ativos nela. A profecia do apóstolo Paulo se aplica aqui: “e que dentre vós mesmos se levantarão homens, falando coisas perversas para atrair os discípulos após si.” (At 20,30).




Todas as heresias distorcem a eclesiologia também. Já que a Igreja é o Corpo de Cristo, toda alteração no ensino sobre o Cristo, sobre o Espírito Santo, sobre o modo da salvação do homem também produz conseqüências eclesiológicas.




De fato, pode ser dito que se há uma grande heresia hoje em dia, é a assim chamada heresia eclesiológica. E tal fato deve ser confrontado pelos Pastores da Igreja. Existe uma grande confusão sobre o que a Igreja é e quem são seus verdadeiros membros. Confundimos ou identificamos a Igreja com outras tradições humanas, pensamos que a Igreja está fragmentada ou separada, e ainda mais, ignoramos o modo de salvação da Igreja. Há grandes confusões sobre este grande tema.




Nos capítulos que seguem, buscaremos examinar o assunto da Igreja sob diferentes ângulos e iremos tentar compreender o que os santos Pais dizem sobre a Igreja.




Penso que assim encontraremos auxílio para adquirir a genuína mentalidade da Igreja Ortodoxa, o que é essencial para nossa salvação.




Muitos de nós pensam que a Igreja foi criada no dia do Pentecostes, quer dizer, quando o Espírito Santo desceu nos corações dos Apóstolos. E, claro, podemos dizer que o Pentecostes é o dia de aniversário da Igreja do ponto de vista de que foi aí que a Igreja tornou-se o Corpo de Cristo. Ela adquiriu substância. Entretanto, o início e existência da Igreja encontram-se em tempo anterior ao do Pentecostes.




O professor John Karmirist afirma que existem três fases no surgimento da Igreja. A primeira é a criação dos anjos e dos homens, a segunda é a vida de Adão no Paraíso, mas também o período do Antigo Testamento e a terceira fase é a encarnação de Cristo. De fato, a revelação plena da Igreja ocorrerá na Segunda Vinda de Cristo.




Vamos olhar mais analiticamente tais períodos da Igreja, pois assim poderemos concatenar com o mistério da Igreja e obter uma consciência mais aprofundada de nosso ser e abrangência.




O início da Igreja




É um ensinamento dos santos Pais que com a criação dos anjos ocorre o surgimento da primeira Igreja. E pode ser visto nos escritos dos Pais que os anjos também são membros da Igreja. Além disso, Deus-Pai é o “Criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis”. Entre as invisíveis estão enumerados os anjos, que cantam em louvor de Deus. No livro de Jó este testemunho é ratificado: “quando as estrelas nasceram, todos os anjos à alta voz cantaram em louvor de Mim” (Jô 38,7).


Assim, antes da criação do mundo sensível haviam anjos, que cantavam em louvor de Deus por causa da criação. E, para asseverá-lo, isto significa que os anjos foram os primeiros a serem criados por Deus.


(...)




A Igreja no Antigo Testamento




Adão e Eva viviam uma vida Angélica no Paraíso. Estavam no estado de iluminação do nous, o que é o primeiro grau da visão de Deus. Estavam em comunhão com Deus.

(...)



Através da queda de Adão, a comunhão do homem com Deus, consigo mesmo e com toda criação, foi quebrada.(...)



No entanto, a despeito da queda de Adão, a Igreja não desapareceu completamente.(...)



Sabemos, a partir dos ensinos dos santos, que todas as manifestações de Deus no Antigo Testamento são manifestações da Palavra, da Segunda Pessoa da Santa Trindade. A diferença entres as manifestações no Antigo Testamento e no Novo é que no primeiro manifesta-se a Palavra não-encarnado, enquanto no segundo vemos as manifestações da Palavra Encarnado.(...)

Assim, a Igreja existia no Antigo Testamento também, a despeito da queda do homem. Os membros desta Igreja eram os justos e os profetas, que tinham a Graça de Deus.(...)



A Igreja no Novo Testamento



Com a Encarnação de Cristo, vemos a manifestação da Igreja. A Igreja torna-se o Corpo de Cristo e adquire sua Cabeça, que é o Cristo.(...)



Pela encarnação de Cristo, a natureza humana que Cristo assumiu foi feita divina, e deste modo, os cristãos, os membros da Igreja, são plenamente membros do Corpo de Cristo.

(...)



Dissemos anteriormente que no Antigo Testamento os santos profetas conseguiram a deificação. Pois de acordo com o ensino dos santos Pais, e de S. Gregório Palamas também, a visão de Deus, que é a visão da Luz Incriada, se dá através da deificação do homem. O homem é deificado e, assim, feito digno de ver a luz incriada de Deus. O homem não consegue ver Deus por suas próprias forças. Na Igreja, cantamos “na Tua luz, vemos a luz”. Assim, a visão de Deus vem de dentro, não de fora, isto é, ela se dá através da deificação do homem. Não se trata de ver coisas e sinais exteriores. Este é um ponto crucial na teologia patrística. (...)



Entretanto, a deificação dos profetas fora temporária, posto que a morte não havia ainda sido abolida e é por isto que foram levados ao Hades e a visão estava fora do Corpo do homem-Deus Cristo. Tal diferença pode ser observada na experiência dos Apóstolos na Transfiguração de Cristo e na experiência que eles mesmos tiveram no dia do Pentecostes.



Na Transfiguração os discípulos viram a glória incriada da Santa Trindade na natureza humana do Logos. Para que pudessem participar desta grande experiência, eles tiveram que ser transfigurados anteriormente: “eles foram mudados, e eles viram a mudança”. Esta mudança dos discípulos é idêntica com a deificação. Através da deificação eles alcançaram a visão de Deus, e, portanto, no ensino patrístico a visão de Deus está conectada com a deificação do homem. Entretanto, embora a visão da glória incriada de Deus tenha vindo de dentro, isto é, através da deificação, ainda assim a Luz que vertia do Divino Corpo humano de Cristo era externa aos santos apóstolos, já que eles não haviam ainda se tornado membros do Corpo de Cristo.



No Pentecostes, recebemos este grande dom. Os discípulos viram a Glória de Deus internamente, isto é, através da deificação, mas também desde dentro do Divino Corpo humano de Cristo, já que com a vinda do Espírito Santo eles haviam tornado-se membros do Corpo de Cristo. No Pentecostes, o Corpo de Cristo não era externo aos Apóstolos como era na Transfiguração, mas interno, no sentido de que os Discípulos tinham tornado-se o Corpo de Cristo e como tais, eram merecedores desta experiência.



Com a Encarnação de Cristo, a Igreja se tornou um Corpo.(...)



A perpetuidade da Igreja

Pela Sua Encarnação, Cristo assumiu a natureza humana, e, realmente, a natureza humana foi unida com a natureza divina imutavelmente, sem confusão, inseparavelmente, sem alteração e indivisivelmente. Jamais se separarão. Permanecem unidas para sempre.



Assim, a Igreja existirá também depois da Segunda Vinda de Cristo e poderemos falar da perfeita manifestação da Igreja. Isto é dito do ponto de vista de que os santos desde já saboreiam “as últimas coisas”, porque, como dissemos no início, as últimas coisas na Igreja não estão isoladas das primeiras e das imediatas. Vivendo na Igreja, alcançamos o estado de Adão no Paraíso antes da Queda, e ascendemos ainda mais alto, porque atingimos comunhão e unidade com Cristo, unidos ao seu Corpo Divino-Humano, tendo tornando-nos membros do Seu Corpo.



Os santos, desde já, gozam a Glória de Deus e, por isso, S. Simeão, o Novo Teólogo, diz que aqueles a quem foi concedida a visão da Luz incriada de Deus, não estão esperando a Segunda Vinda, porque já estão experienciando o Reino de Deus.



Além disso, o Reino de Deus não é algo criado, nem é uma realidade terrestre, mas como S. Gregório Palamas ensina, a participação no Reino de Deus se identifica e conecta com a visão da Luz incriada.

Entretanto, haverá um contínuo aperfeiçoamento desta participação na glória de Deus. Isto é importante porque se a vida futura fosse uma condição estacionária, então não haveria plenitude. S. Gregório do Sinai diz caracteristicamente: “É dito que na era futura, os anjos e santos crescem perpetuamente nos dons da graça e nunca satisfazem seu desejo por maiores bênçãos. Nenhum lapso ou distanciamento da virtude para o vício ocorre naquela vida”.



E São Gregório Palamás, referindo-se a este ponto, fala do desenvolvimento contínuo na deificação, do aperfeiçoamento contínuo, perguntando: “Os santos não progridem infinitamente na visão de Deus na era por vir?”, ele mesmo responde: “Em tudo é claramente rumo ao infinito”. De fato, ele utiliza o caso do anjo que, de acordo com S. Dionísio, o Aeropagita, torna-se cada vez mais receptivo “a mais clara iluminação”. Deus é infinito e portanto concede Sua graça abundantemente e plenamente.São Gregório Palamas pergunta: “E que caminho resta aos filhos da era por vir senão avançar nisto para o infinito, aceitos de graça em graça e pacientemente realizando sua incansável ascensão?” Tal ocorrerá porque, de acordo com o mesmo santo, “a graça anterior lhes dá força para participar em coisas ainda maiores”.



É claro que, dizendo tais coisas, devemos enfatizar que não se trata de uma questão de “restauração” de todas as coisas, um ensino que não foi adotado pela Igreja, mas de desenvolvimento e aperfeiçoamento dos santos, daqueles que durante suas vidas participaram da energia purificante, iluminadora e deificante de Deus. Para aqueles homens que não participaram nem mesmo na graça purificadora, isto é, não entraram no estágio de arrependimento, este bom desenvolvimento não terá efeito. Além disso, a passagem que mencionamos fala de santos que alcançaram a graça de Deus, e portanto esta graça o está fortalecendo para participarem de coisas ainda maiores. Portanto os ofícios memoriais que a Igreja realiza por aqueles que morreram também possuem este objetivo. Eles auxiliam a pessoa em seu aperfeiçoamento, porque, de acordo com o ensino dos santos, “esta é o perfeito eterno aperfeiçoamento dos perfeitos”.



Neste sentido podemos dizer que depois da Segunda Vinda do Cristo, teremos uma mais completa manifestação da glória de Deus. E é nesta perspectiva que devemos interpretar o ensino dos santos de que desde já temos como que um certo gosto das boas coisas do Reino de Deus.

Conclusão

Depois de tudo que foi relatado, devemos terminar com algumas poucas conclusões, sem, naturalmente, exaurir este grande tema.

Apenas em Cristo há salvação. Já que os santos do Velho Testamento viram a Palavra não-encarnada e os santos do Novo Testamento viram e vêem a Palavra Encarnada e têm uma comunhão bem próxima com Ele, isto significa que a salvação do homem se dá apenas através de Cristo. E, naturalmente, já que Cristo é a Segunda Pessoa da Santa Trindade e a salvação é uma ação comum do Deus Triuno, isto significa que somos salvos quando estamos em comunhão a Santa Trindade, quando a graça do Deus Trinitário entra no nosso ser, quando “a graça de nosso Senhor Jesus Cristo e o amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo” estão em nós.

A Igreja não é uma organização humana, mas um organismo Divino-Humano. A fonte da Igreja é o próprio Deus. Ela não é uma invenção do homem, nem é fruto ou resultado das necessidades sociais do homem, mas o único lugar para a salvação do homem. Por outra, cria-se a impressão de que o homem fez a Igreja para poder sobreviver às condições trágicas e difíceis da vida. Mas como explicamos anteriormente, a fonte da Igreja é o próprio Deus, e a salvação do homem se dá nela. Clemente de Alexandria observa: “porque assim como um trabalho de sua mente é chamado mundo, também a salvação do honem é de Sua vontade e esta é chamada Igreja”. E isto significa que a Igreja nunca irá cessar de existir, a despeito de quão difíceis e desfavoráveis sejam as circunstâncias.

Na Igreja, todos os problemas estão resolvidos. Não falamos de um Cristianismo abstrato que associamos a uma ideologia, mas da Igreja que é comunhão entre Deus e o ser humano, de anjos e homens, do terrestre e do celestial, do homem e do mundo. A Igreja é “o encontro do céu e a terra”. Paz, justiça, etc., não são meras convenções sociais, mas dons que são dados na Igreja. Paz assim como justiça e todas as outras virtudes, como o amor, são experiências da Igreja. Na Igreja experimentamos a paz real, justiça e amor, que são essencialmente as mesmas energias de Deus.

A Igreja é o Corpo de Cristo, que possui o Cristo como sua cabeça e os membros da Igreja como os membros do Corpo de Cristo. Existem membros da Igreja de todas as idades e existirão até o fim dos tempos. E quando não houverem mais membros da Igreja, o fim do mundo virá.(...)



“Definição” e características da Igreja


(...)

A Igreja enquanto Mistério

Primeiro devemos sublinhar que a Igreja é um mistério. Ligada ao Cristo e sendo seu Corpo, não é uma organização humana, mas um Organismo Divino-Humano. Ao mesmo tempo a Igreja não é, como normalmente se diz, o Corpo Místico de Cristo, porque os cristãos, que são os membros da Igreja, são os membros reais do Corpo de Cristo. Então não se deve falar de um corpo místico, abstrato e apreendido espiritualmente, mas do Corpo real de Cristo.



O fato de a Igreja ser o Corpo de Cristo não implica que ela se identifique ontologicamente com Cristo, a Segunda Pessoa da Santa Trindade. Nem deve a natureza divina em Cristo ser identificada com a natureza humana, porque cada natureza retém suas propriedades. Assim, também a Igreja não deve ser identificada ontologicamente com o seu Cabeça, embora esteja ligada ao Cristo.



Em todo caso, mesmo a Igreja não sendo o Corpo místico, mas real de Cristo, é ainda um mistério e o que nela ocorre é mistério. Isto implica que não é possível investigar ou nos preocuparmos com a Igreja através do raciocínio e dos sentidos, nem podemos interpreta-la por algumas características exteriores.



Diz-se normalmente que a Igreja possui sete Sacramentos. Sem negar tal fato, eu gostaria de enfatizar que isto é uma afirmação a posteriori e que, de qualquer forma, existem variações na história do número dos Sacramentos. Os santos Pais pensam, principalmente, em termos de três sacramentos, o do Batismo, Crisma e Eucaristia. O sacramento do Batismo é chamado de Sacramento introdutório, porque introduz-nos na nova vida, como Corpo de Cristo. O Santo Crisma é o assim-chamado Batismo do Espírito, nos dando a possibilidade da graça do Batismo trabalhar em nós. E o Sacramento da divina Eucaristia deifica a pessoa através da recepção do Corpo e Sangue de Cristo. Todos os outros sacramentos (ordenação, casamento, unção, confissão) estão conectados com estes três, pressupondo o Batismo e sendo completados na Divina Eucaristia.
(...)



“Definição” de Igreja
(...)
Em tempos anteriores, várias definições do que a Igreja é foram formuladas por alguns teólogos e tais definições seguem todas mais ou menos a seguinte linha: a Igreja compõe-se de todas as pessoas que crêem em Cristo, que confessam que Jesus Cristo é o Cabeça, que Ele é seu Deus e Senhor, que possuem a mesma fé e confissão, que são santificadas através dos santos Sacramentos, que estão sendo guiadas para a salvação por pastores que possuem sucessão apostólica contínua, etc.



Tais definições foram influenciadas por livros ocidentais sobre a Igreja, pois hoje sabe-se que não é possível dar uma definição do que é a Igreja, já que nem mesmo os santos Pais o fazem. Portanto, observamos que no ensino patrístico não existe definição de Igreja. E enfatizo que teólogos mais recentes deixam claro que as definições de Igreja são derivadas da teologia escolástica do Ocidente.

Na santa Escritura e nos escritos patrísticos o que é dito na maior parte das vezes é que a Igreja é o Corpo de Cristo e uma comunhão de deificação. Que a Igreja é o Corpo de Cristo é visto nas Santas Escrituras, especialmente nas epístolas do Apóstolo Paulo. Nos ensinos de São Gregório Palamas, a expressão “comunhão de deificação” é utilizada porque demonstra qual é o propósito da Igreja. O propósito da Igreja é levar o homem à deificação. Quando afastamos a Igreja deste propósito, a transformamos em um tipo de ideologia, uma organização religiosa e humana. E sabemos muito bem que há uma grande diferença, e eu diria caótica, entre ideologia e Igreja. A ideologia possui idéias, enquanto a Igreja possui vida, uma vida que é capaz de derrotar a morte.



(...) E pode ser dito com certeza que [a imagem da Igreja como Corpo de Cristo] é uma revelação de Deus para o apóstolo Paulo. Enquanto Saulo estava viajando para Damasco para prender os cristãos, Cristo surgiu para ele, e disse: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” Quando Saulo perseguia os cristãos, Cristo tratou a perseguição como a Si mesmo. Foi deste modo, como de fato de muitos outros eventos, que o apóstolo Paulo veio a utilizar esta imagem.



O padre George Florovsky, um dos mais eminentes teólogos ortodoxos de nosso tempo, falando da Igreja, afirma: “É impossível começar com uma definição formal da Igreja, pois, estritamente falando, não existe nenhuma que possa alegar autoridade doutrinal. Nenhuma pode se encontrada nos Pais. Nenhuma definição nos Concílios Ecumênicos...Não se define o que é auto-evidente...Faz-se necessário sair da sala de aula e voltar para a Igreja que adora e talvez trocar o jargão da escola da teologia pela linguagem metafórica e pictórica da Escritura. A própria estrutura da Igreja é melhor adequada a ser descrita e representada do que adequadamente definida... Provavelmente mesmo esta descrição será convincente apenas para os que são da Igreja. O mistério só pode ser apreendido pela fé.”



Quase todos os teólogos contemporâneos estão dizendo que não podemos encontrar qualquer definição que exponha integralmente o conteúdo da Igreja, a não ser a de que a Igreja é o Corpo de Cristo e podemos utilizar diversas imagens para caracteriza-lo. Neste ponto, gostaria de mencionar John Karmiris e Panagiotis Trempelas. Eles confessam que não podemos definir a Igreja como os teólogos escolásticos do Ocidente fazem. E isto porque, entre outras coisas, a Igreja é a realidade em que vivemos e não um objeto que examinamos.



Falando do enorme valor da Igreja, São João Crisóstomo diz que este é depreendido dos muitos nomes que ela possui. (...)



E, S. Máximo, o Confessor, não define a Igreja, mas utiliza várias imagens. (...)


(...)
Muitas pessoas, falando da Igreja, referem-se seja a hierarquia, que é apenas o clero e particularmente os Bispos, que constituem a ordem pastoral da Igreja, ou apenas os leigos, que foram batizados em nome do Deus Trinitário. Mas tais pontos de vista são errados e expressam pensamentos Ocidentais sobre a Igreja. Penso que seria útil alargar a análise deste ponto para clarificar alguns elementos essenciais.



Como dito anteriormente, a Igreja é o Corpo divino-humano de Cristo. Os cristãos são literalmente membros do Seu Corpo. Portanto, a Igreja não poderia nunca ser uma organização ou instituição abstrata., mas sim a unidade dos cristãos com Cristo. Mas os cristãos estão divididos em dois grupos, clero e leigos. A distinção não trata de privilégios no que concerne à salvação, mas ao que os cristãos abençoados que irão ajudar o próximo em sua deificação, isto é, pastores que irão liderar os leigos, devem representar na Igreja.


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No ensino patrístico fica claro que os três graus do sacerdócio – diácono, presbítero e bispo – estão conectados com os três graus da vida espiritual, que são a purificação do coração, a iluminação do nous e a deificação. Isto significa que o sacerdócio deve ser fruto da energia purificadora, iluminante e deificadora de Deus, ou pelo menos, orientado nesta direção. Se não for nem um, nem outro, então o sacerdócio não é tomado, não há deposição nem um ministério sacerdotal satisfatório. O trabalho do clero tem duas faces. A primeira é realizar os sacramentos e a segunda é guiar o povo a viver uma vida sacramental. Mas também os leigos, para que sejam realmente membros da Igreja e pertencer ao Corpo de Cristo, devem participar, ou buscar participar, da energia purificadora, iluminante e deificadora de Deus.



Tais coisas estão sendo ditas com a compreensão de que através do Batismo somos alistados como membros da Igreja. Entretanto, se não ativarmos a graça do Batismo através de uma vida de ascese, que a Igreja possui, então não somos realmente seus membros. Podemos realizar uma distinção. Uma coisa é ser um membro em potencial da Igreja, ter aceito a possibilidade de nos tornarmos realmente membros, e uma outra coisa é ser um membro ativo. São Gregório Palamás utiliza a imagem do filho do Rei para explicar isto. O filho nasce no palácio e tem a possibilidade de se tornar o futuro rei, ascendendo ao trono. Mas se antes disso, ele morrer, ele perde esses direitos. O mesmo é verdade para o resto de nós. Por seu nascimento biológico ele tem a possibilidade de se tornar herdeiro dos reino de seu pai. Mas se morrer prematuramente ou for expulso de casa, então perde a possibilidade de herdar todas aquelas coisas boas. Cristo disse ao bispo de Sardes: “Conheço as tuas obras; tens nome de quem vive, e estás morto.”(Ap. 3:1). Naturalmente, ele pode arrepender-se e portanto é chamado a ser “vigilante” e “arrepender-se”, mas, no momento, está espiritualmente morto. Isto não significa que ele não realiza os sacramentos, mas que os realiza como um homem morto. Nikolas Kavasilas diz: “Vamos viver a vida, atraindo a santificação através dos mistérios da cabeça e do coração” até que estejamos ligados ao Cristo, até que sejamos membros Dele, “carne de Sua carne, ossos de Seus ossos”. Entretanto, como membros mortos não podemos saborear a vida. “Quando nos cortamos e caímos da inteireza do Santíssimo Corpo, saboreamos os santos mistérios em vão; pois a vida não passa através dos órgãos mortos e separados”.



Assim, na Igreja, alguns são membros em potencial, outros realmente, e para nos expressarmos melhor, alguns são órgãos mortos e outros vivos. Esta distinção, vivo ou morto, é encontrada em toda a tradição bíblico-patrística da Igreja. E é uma pena que não conheçamos toda esta tradição e ensinemos que todos os que recebem o Santo Batismo são membros da Igreja. Para sermos precisos, também são membros, mas que se cortaram completamente para fora da Igreja. Mas algunas órgãos mortos pode ser revividos pela operação da divina graça e com sua própria cooperação.
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Nas epístolas do Apóstolo Paulo, vemos que na Igreja existem os glorificados, os iluminados e os indivíduos particulares. Os glorificados são os deificados, que participam da energia deificante de Deus; os iluminados são os que já possuem a oração noética mas ainda não atingiram a deificação, e os indivíduos particulares são os que foram batizados com a água, que estão em um estado de purificação e ainda não receberam o Espírito Santo. Depois destas categorias, existem também aqueles sem fé que ainda não entraram no estágio de purificação e que ainda não receberam o Batismo.



Com base nestas pressuposições, os Santos Padres, chamam a Igreja de uma comunhão dos Santos. Não é uma coleção de pessoas que foram um dia batizadas e estão em um estado de estagnação, mas uma comunhão de pessoas carismáticas. Assim, compreendemos que a Igreja é vida, e não um local de ideologia. Dentro desta perspectiva, S. João de Damasco, chamava a Igreja de “ordem inteiramente escolhida por Deus”, “o povo dos santos”, “o povo de Cristo”, “cordeiros de Deus, povo santo”. Neste sentido, como o Padre George Florovsky diz, a Igreja é uma comunidade sagrada que se distingue claramente do “mundo”, que ela é uma Igreja santa. “S. Paulo claramente utiliza os termos ‘Igreja’ e ‘Santos’ como coextensivos e sinônimos”.



Assim, é um erro considerarmos a Igreja como um local ideológico, religioso ou mesmo mágico. Devemos tê-la como o Corpo de Cristo e uma comunhão de deificação. Com estas pressuposições podemos experienciar na Igreja a vitória de Cristo sobre a morte. Se não morrermos a morte e o ferrão da morte, que é o pecado em nós, pelo poder e energia de Deus, se não nos transformarmos de membros mortos para membros vivos da Igreja, não iremos sentir a vitória de Cristo sobre a morte, o pecado e o demônio. E, assim, para nós, todo o trabalho da economia divina terá sido não um fato pessoal existencial, mas um mero evento histórico. Por isso a Igreja é um local de vida e não um alvo do pensamento.



As características da Igreja



Uma

A Igreja é uma. Não existem muitas igrejas. É uma conseqüência do fato de que a Igreja é o Corpo do Cristo Divino-humano. Cristo possui um Corpo; Ele não pode ter muitos corpos. Já que a Cabeça é uma, o Corpo também é um só.
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Ao falarmos da unidade da Igreja, temos duas coisas em mente. Primeiro, é que a despeito da pluralidade dos seus membros, há um só corpo, e a segunda é que é um lugar único para a salvação do homem.



Primeiramente, devemos dizer que a Igreja é uma só a despeito do grande número de membros. Cristo expressou este fato através da imagem do rebanho e do pastor. Já que o pastor que guia a ovelha é um só, e todas as ovelhas juntas formam um rebanho, isto significa que a unidade da Igreja não é abolida pelo grande número de fiéis, nem pelas Igrejas locais, as quais, entretanto, estão unidas e ligadas em sua fé e vida. Cada Igreja local não é uma de muitas assim chamadas Igrejas, mas a Igreja de Cristo. Também as paróquias não quebram a unidade da Igreja, porque cada paróquia é a Igreja em miniatura. É mais ou menos o mesmo que ocorre com o cordeiro, o Corpo de Cristo. Na Santa Mesa, Cristo é “quebrado mas não dividido”, e, portanto, quando comungamos dos Mistérios Ilibados, não comemos uma parte de Cristo, mas o Cristo inteiro, pois Cristo é “partilhado inseparavelmente em partes”. Assim, a despeito da existência de muitas igrejas locais e paróquias, a unidade da Igreja não é rompida. A ruptura se dá através da heresia. Então, realmente não há uma divisão da Igreja, mas uma separação de um grupo que se retira dela. A unidade da Igreja não é perdida, mas os membros heréticos se separam desta unidade e não mais pertencem ao Corpo de Cristo uno.



S. Máximo Confessor diz que, enquanto os Cristãos se dividem em categorias de acordo com idade, raça, nacionalidades, línguas, lugares e modos de vida, estudos, e características e realmente “tendo sido divididos uns dos outros, e muitos tendo nascido na Igreja diferentes e renascidos e recriados através dela pelo Espírito”, ainda assim “ela dá igualmente a todos, e os favorece com uma forma e designação, ser de Cristo e levar Seu nome”. E Basílio, o Grande, diz característicamente: “A Igreja de Cristo é uma, mesmo que endereçada de lugares diferentes”. Estas passagens e especialmente a vida da Igreja acabam com toda tendência nacionalista. É claro que não podemos acabar com as nações e terras natais, mas podemos nos livrar do nacionalismo, o qual é uma heresia e um grande perigo para a Igreja de Cristo.



Santa



Já que a Igreja é o Corpo de Cristo , é santa. Foi santificada e purificada por Cristo, que a assumiu e fez dela Seu Corpo.



Referindo-se à Santidade da Igreja, o Apóstolo Paulo diz: “Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, a fim de a santificar, tendo-a purificado com a lavagem da água, pela palavra, para apresentá-la a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem qualquer coisa semelhante, mas santa e irrepreensível.” (Ef. 5, 25-27).



A Igreja no Antigo Testamento assemelhava-se a uma prostituta, e Cristo a santificou, fazendo-a virgem. São João Crisóstomo analisa esta verdade graficamente: “Pois o milagre do noivo é que tomou uma prostituta e a fez virgem”. E então, ele escreve que no âmbito humano biológico, o casamento destrói a virgindade, enquanto “com Deus, o casamento restaura a virgindade”.


Analisando, este grande mistério ainda mais profundamente, Crisóstomo diz: “Deus desejou uma prostituta... sim, uma prostituta: falo de nossa natureza”. Deus deseja a prostituta “para fazer dela virgem”. E, de fato, Ele não envia nenhum anjo, querubim ou serafim, ou qualquer um dos seus servos, “Ele apresenta a Si mesmo, o amante”. E como a prostituta não queria elevar-se, Ele mesmo desce. Ele entra em sua cabana. A vê bêbada, coberta de feridas, enfurecida, empesteada de demônios. Ele se aproxima dela. Ela foge. Ele a convida dizendo: “Eu sou um curador”. Ele imita os costumes dela. Então, “Ele a toma, a adapta a Si mesmo”, quer dizer, se torna noivo dela, lhe dá o anel, isto é o Espírito Santo.



Então Crisóstomo apresenta o diálogo entre Cristo e a ex-prostituta. Cristo disse a ela: “Já que fostes criada no Paraíso, como caístes de lá?” Ela responde que o demônio a expulso de lá. E Cristo continua: “Fostes criada no Paraíso e ele te expulsou. Contemple, Eu a crio em Mim mesmo, Eu a gesto! Já não possuis um corpo e não tens nada a temer do demônio”. A prostituta responde: “Mas sou uma pecadora e suja!” E Cristo diz: “Não se preocupe; sou um curador. Conheço minhas ferramentas, sei que eras de barro e estava quebrada. Eu a reconstruirei com o banho do renascimento e consigná-la com o fogo.”



Citei estas palavras de São João Crisóstomo, porque elas mostram o que a Igreja é e que ela foi santificada por Cristo. Também mostram que a Igreja é santa não através de seus membros, mas porque seu Cabeça, Cristo, é Santo. A santidade dos cristãos emana da santidade do Cristo, em realidade coparticipantes da energia deificadora de Cristo.



Então, já que a Igreja é santa, então também seu trabalho é santificar. O objetivo da Igreja é santificar seus membros, guiá-los para a iluminação e a deificação. O trabalho santificante da Igreja é realizado através dos Sacramentos e da vida ascética, quer dizer através do seu método de cura na integralidade. É claro que não participar na energia deificante de Deus é u ma doença. Não é uma questão psicológica, mas um fato espiritual. Por isso, todos nós que estamos doentes fazemos uso do verdadeiro método de cura e participamos da energia purificadora e iluminante de Deus. E deste modo, também nós somos santificados e somos verdadeiros membros do Corpo de Cristo. Deixamos de estar mortos, e nos tornamos membros vivos.





Católica



O termo “católico” originou-se com Aristóteles e significa “completo”, “inteiro”, “o nome comum em contraste com o de cada um”. Podemos também dizer que o termo “católico” identifica-se e liga-se com o que é Ortodoxo.



Quando dizemos que a Igreja é católica, referimo-nos a três aspectos em particular. Primeiro, que ela existe no mundo inteiro, segundo que possui a verdade completa sobre Deus, o homem e a salvação, e terceiro que a vida que Igreja possui é a mesma para todos os Cristãos, para todos os seus membros.


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Em segundo lugar é chamada católica porque possui toda a Verdade, conforme foi revelada no dia do Pentecostes. Aqui, devemos destacar que a teologia escolástica do Ocidente ensina que através das eras adquirimos um maior aprofundamento dos dogmas da fé e que estes estão ainda se desenvolvendo cada vez mais. Este não é um ensinamento ortodoxo. Acreditamos que no dia do Pentecostes, os Apóstolos alcançaram a deificação, experimentaram a Revelação e assim atingiram toda a Verdade. Aqueles, ao longo dos tempos, que atingem a deificação partilham da mesma experiência de revelação. E esta verdade é formulada e expressa em todas as épocas, enquanto as heresias surgem. Assim, não nos desenvolvemos ou aprofundamos na fé, mas, por um lado, buscamos viver a fé, e por outro, buscamos preservar a expressão da fé em termos que irão protegê-la de distorções e más-ações.



Santo Irineu, bispo de Lyon, escreve: “A Igreja, tendo recebido esta mensagem e esta fé, embora espalhada pelo mundo, cuidadosamente a mantém, como se morasse em uma só casa: e mesmo assim confia em todos, já que possui um e o mesmo coração”.Neste sentido, a catolicidade está ligada com a ortodoxia. A Ortodoxia preserva a verdade plena, tanto revelada quanto dogmática e enquanto experiência, enquanto a heresia quebra a catolicidade da verdade, porque escolhe um aspecto da verdade em detrimento de outro. Por exemplo, Ário não negou que o Anjo do Senhor aparece no Antigo Testamento, mas negou a divindade da Palavra. Os monofisitas não negaram a natureza divina, mas a super-enfatizaram ao custo da natureza humana, motivo pelo qual acabaram com a possibilidade da salvação. Isto é observado em todas as heresias. Eles escolhem uma parte da verdade, a separam de sua catolicidade e a super-enfatizam ao custo do todo. Por isto, a Igreja Católica-Ortodoxa ensina, como S. Cirilo de Jerusalém diz, “De um modo completo e católico, todos os dogmas que devem ser conhecidos pelo homem”.


Igualmente, a Igreja é chamada católica porque a vida que ela oferece pertence a todos; quer dizer, todos os cristãos têm a possibilidade de atingir a deificação, a despeito do seu estilo de vida, sua ocupação e lugar onde moram. A pessoa ortodoxa é uma que acredita em caminho católico, uma pessoa virtuosa vivendo um caminho católico, e que aplica à sua vida todos os mandamentos de Cristo. Como o Padre Justin Popovits ensina, os membros da Igreja “vivem com o que Lhe é próprio(do Cristo), eles possuem o que Ele possui, e ele sabem através do conhecimento Dele, porque pensam com uma mente católica da Igreja, sentem com um coração católico da Igreja, e desejam com um desejo católico da Igreja e vivem uma vida católica da Igreja”. Somos membros da Igreja “através da vida una, santa e católica da Igreja, da fé santa e católica da Igreja, da alma santa e católica da Igreja, da consciência santa e católica da Igreja, da mente santa e católica da Igreja, da vontade santa e católica da Igreja. E que tenhamos tudo em comum e católico, a fé, e amor, e justiça, e oração, e jejum, e verdade, e tristeza e alegria e salvação e deificação e teo-antropocidade, e imortalidade, e eternidade e benção”



Apostólica
A Igreja é chamada apostólica por muitos motivos. Primeiro porque começa em Cristo e Ele é o Apóstolo e Sumo-Sacerdote da confissão. Cristo foi enviado por Seu Pai para fazer a Igreja Seu Corpo e, portanto, para permanecer unido a Ele para sempre.



O Apóstolo Paulo escreve em sua epístola aos hebreus: “Portanto, santos irmãos, coparticipantes do chamado divino, o apóstolo e sumo-sacerdote de nossa confissão, Jesus Cristo” (Heb. 3,1). Cristo é chamado apóstolo e sumo-sacerdote.



Igualmente a Igreja é chamada apostólica porque está baseada no fundamento dos apóstolos.(...) Além disso, é chamada apostólica porque é, também, patrística. Os santos pais nos garantem a apostolicidade da Igreja. Eles são sucessores dos apóstolos, não apenas através da transmissão da graça do sacerdócio, mas porque eles mesmos alcançaram a mesma experiência dos Santos Apóstolos. Realmente, a sucessão apostólica é, por um lado, a ordenação ininterrupta e transmição da graça do sacerdócio, e por outro lado a participação do homem na energia purificadora, iluminante e deificante de Deus.


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Para concluir este assunto, posso dizer que a Igreja é o Corpo de Cristo e uma comunhão de deificação. As características da Igreja são: “uma, santa, católica, apostólica”, e não são independentes uma da outra. Cada uma pressupõe a outra.



A Igreja não é uma organização humana, não é uma lista de pessoas mortas. É o Organismo Divino-humano. E devemos constantemente buscar ser e permanecer membros vivos da Igreja, para experimentar, não intelectualmente mas espiritualmente, a unidade, catolicidade e apostolicidade da Igreja.

[1] John Romanides: The Ancestral Sin (O Pecado Ancestral), ed. Domos, 28-29.

[2] Archim. Justinos Popovich, p. ct. p.62f