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segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Como discernir as verdadeiras experiências da Graça de Deus das falsas - Parte 01/02


Trecho da transcrição da palestra do Abade Arquimandrita George do Santo Mosteiro de São Gregório da Montanha Santa em Stratoni de Halkidiki, em 14 de janeiro de 1989, por convite do Reverendíssimo Nicodemus, Metropolita de Hierissou, da Montanha Santa e Ardameri. 

Original na revista "São Gregório" do Santo Mosteiro de São Gregório, da Montanha Santa

Fonte: http://www.impantokratoros.gr/2D843221.en.aspx

Tradução: Lr. Fabio L. Leite


Formas de Experiência da Graça de Deus

Quais são as experiências da graça que um cristão pode receber de forma que sua fé e vida cristã não sejam para ele algo mental e externo, mas um verdadeiro sentimento espiritual de Deus, uma comunhão com Deus, uma habitação de Deus na qual todo o seu ser participa?

É primeiro e antes de tudo uma informação interior de que através da fé em Deus, ele encontrará o verdadeiro significado da vida. Ele sente que sua fé em Cristo é uma fé que o conforta internamente; que ela dá sentido à sua vida, e o guia, que é uma luz forte que o ilumina. Quando ele percebe dessa forma a fé cristã em si, ele começa a viver a graça de Deus. Deus não é algo externo a ele.

Outra experiência da graça de Deus é recebida pelo homem quando ele ouve em seus coração o convite de Deus para arrepender-se de suas ações pecadoras e tenebrosas, para retornar ao modo cristão de vida, para confessar, para entrar no caminho que leva a Deus. Essa voz de Deus que ele ouve dentro de si é uma experiência preliminar da graça de Deus. Todos os anos que vivemos longe de Deus são anos em que não temos como entender nada.

Ele começa a se arrepender, ele confessa com seu confessor pela primeira vez na vida. Depois da confissão, ele sente uma grande paz e alegria como nunca sentiu antes. Então ele diz "Eu fui confortado". Esse consolo é a visitação da graça divina em uma alma que se arrependeu e que Deus deseja confortar.

As lágrimas de arrependimento de um cristão quando ele começa a orar e pede perdão a Deus ou quando ele confessa são lágrimas de contrição. São lágrimas muito confortadoras. Elas trazem muita paz à alma do homem. A pessoa sente então que elas são um dom e uma experiência da graça divina.

Quão mais profundo o arrependimento do homem, mais profundo será seu amor por Deus e rezará com um eros divino, quando então suas lágrimas de arrependimento tornam-se lágrimas de alegria, lágrimas de amor e de eros divino. As lágrimas que estão acima e além das lágrimas de arrependimento são também prova de uma visitação e experiência mais nobre da graça de Deus.

Nos aproximamos para comungar o Corpo e o Sangue de Cristo tendo arrependimento, confessado e com preparação espiritual através do jejum. Depois de receber a Santa Comunhão como nos sentimos? Profunda paz em nossa alma, e alegria espiritual. Também isso é uma visitação da graça divina e uma experiência de Deus.

Existem, porém, outras experiências ainda maiores de Deus. A experiência suprema de Deus é a visão da Luz Incriada. Foi essa luz que os discípulos do Senhor viram no Monte da Transfiguração. Eles viram Cristo brilhar como o sol, com uma intensa e divina luz, a qual não era uma luz material, criada, como a do sol ou de outras fontes luminosas da criação. Era a Luz Incriada, mais precisamente a Luz de Deus, a Luz da Santa Trindade. Aqueles que estão completamente limpos das paixões e pecados, e que oram com sinceridade e uma oração limpa, são os que são considerados dignos dessa grande experiência de ver a Luz de Deus ainda nesta vida. Essa é a Luz que irá brilhar na vida eterna. Eles não apenas a vêem desde já, mas também são eles mesmos vistos nessa Luz desde agora, pois essa Luz cobre os Santos. Não a vemos com nossos olhos, mas os de coração puro e os santos a vêem. O halo luminoso que é pintado ao redor da cabeça dos santos é a Luz da Santa Trindade que os iluminou e os santificou.

Na vida de São Basílio Magno, lemos que enquanto ele estava orando em sua cela, ele podia ser visto completamente envolto na Luz, e a cela inteiramente inundada pela Luz Incriada. Vemos a mesma coisa nas vidas de muitos santos.

Portanto, alguém ser considerado digno de ver a Luz Incriada, é ter uma das maiores experiências concedidas por Deus e não é dada a todos, mas a bem poucos - apenas àqueles que progrediram na vida espiritual. De acordo com Pai Isaac, em cada geração apenas uma pessoa, se tanto, chega a ver a Luz Incriada. Mesmo assim, até em nossos dias há cristãos considerados dignos dessa experiência única de Deus.

Claro que precisamos enfatizar que não basta ter visto alguma Luz para que realmente a pessoa tenha visto a Luz Incriada. O demônio pode enganar essas pessoas, e mostrar-lhes outras luzes - demoníacas ou psicológicas - enganando-os a crer que se trata da Luz Incriada, quando não é. Por essa razão, todo cristão que ouve alguma coisa, ou tem alguma experiência, não deve aceitá-la imediatamente como se viesse de Deus, porque ele pode estar sendo enganado pelo demônio. Ele deve confessar a experiência ao seu confessor que então irá dizer-lhe se é de Deus ou um engano dos demônios. É necessário muito cuidado em tais casos.

Identificando uma experiência pura da graça de Deus

Vamos examinar agora as condições que podem garantir se as diferentes experiências que temos são genuínas ou falsas.

A primeira condição é que devemos ser pessoas de arrependimento. Se não nos arrependemos de nossos pecados e nos limpamos de nossas paixões, não é possível que estejamos vendo Deus. Como o Senhor diz em suas bem-aventuranças, "Bem-aventurados os puros de coração pois eles verão a Deus". Quanto mais a pessoa purifica-se de suas paixões, se arrepende e retorna a Deus, mais ela sentirá e verá Deus.

Tentar alcançar essas experiências de Deus através de métodos e meios artificiais - como é feito no Hinduísmo, Yoga, etc, é um erro. Essas experiências não vem de Deus. São experiências alcançadas por meios psicológicos.

Os Santos Padres nos dizem: "Dê seu sangue para receber o espírito". Em outras palavras, se você não der o sangue do seu coração com seu arrependimento, oração, jejum, asceticismo, você não receberá a graça do Espírito Santo. As verdadeiras experiências espirituais são dadas aos que, por humildade, não pedem experiências espirituais mas pedem a Deus por arrependimento e salvação, são dadas aos que são humildes e dizem, "Meu Deus, não sou digno de receber a visitação da Tua graça, da Tua consolação celestial e divina, dos prazeres espirituais". Entretanto, aos que orgulhosamente pedem a Deus para lhes dar experiências, Ele não as concederá, devido ao orgulho delas. Assim, a segunda condição é humildade.

A terceira condição para receber uma verdadeira experiência espiritual é estarmos no seio da Igreja. Não fora da Igreja, porque fora dela o demônio irá nos enganar. Quando uma ovelha separa-se do rebanho, ela é devorada pelos lobos. Dentro do rebanho há segurança. O cristão só está seguro dentro da Igreja. Entretanto, quando ele abandona a Igreja, ele se expõe aos seus próprios enganos, aos enganos de outras pessoas e aos enganos do demônio. Temos incontáveis exemplos de muitas pessoas que não deram atenção à Igreja e ao seu estado espiritual e no fim caíram vítimas do engano. Elas até acreditavam terem visto Deus, ou que receberam visitações de Deus quando na verade as experiências que tiveram eram demoníacas e destrutivas. Também ajuda muitíssimo oferecer orações puras e fervorosas. A verdade é que é durante as horas de prece que Deus concede a maioria das experiências espirituais aos homens, e é por isso que os que oram amorosamente com zelo e paciência, recebem os dons do Espírito Santo e sentem a graça de Deus.

Como você talvez saiba, existe uma oração que rezamos na Montanha Santa e que você também rezar: "Senhor Jesus Cristo, tem piedade de mim, um(a) pecador(a)". Essa oração que se caracteriza por ser noética, sincera, incessante quando é dita com humildade, amor e persistência, traz ao coração do homem um sentimento da graça de Deus.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O Valor do Arrependimento

Eu fico um pouco triste por ver que nossa sociedade entende o arrependimento como uma forma de fraqueza. 

"Eu não me arrependo de nada" é um slogan de uma sociedade que morre de medo da dor de compreender seus próprios erros, que se acovarda perante a necessidade de reconhece-los publicamente, e se atemoriza diante do esforço para corrigir o que puder ser corrigido.

Só que sem arrependimento, inclusive dos erros que nos foram prazerosos, dos erros que nos ensinaram algo, dos erros que no fim "trouxeram coisas boas", sem sentirmos a dor aguda dos desvios mesmos quando estes nos beneficiaram de alguma forma, nossos olhos jamais verão a verdade, nosso caráter, personalidade e atitude jamais serão autênticos, porque ao invés de lermos a narrativa da nossa vida tal como ela se apresenta, impomos-lhe um sentido que consideramos mais digno e honrado, ou de alguma forma mais desejável.

Antes da vinda de Jesus Cristo - o Caminho, a Verdade e a Vida - tínhamos João Batista que bradava "Arrependei-vos! Endireitai os vossos caminhos!" O arrependimento, o reconhecimento do desperdício de tempo e energia de vida no que era errado, o reconhecimento de que até o que foi "bom para mim" é ruim quando não é harmônico com os caminhos do Senhor, e sentir dor com isso, é condição incontornável para amarmos e sermos amados de verdade.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Sobre Ser Feliz




Desde a época de João Batista até o presente, o Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam. 

Mateus 11:12
Eu vim lançar fogo à terra, e que tenho eu a desejar se ele já está aceso? 

Lucas 12:49
Porque nosso Deus é um fogo devorador. 

Hebreus 12:29
Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca. 

Apocalipse 3:16


Existe uma felicidade "morna" e que é falsa. Trata-se de uma felicidade que alguns chamam de burguesa mas acomete também os pobres e os bilionários além da burguesia. É a felicidade da ausência de problemas, da "paz" que no trajeto do herói é uma das tentações que podem fazê-lo desviar-se da jornada heroica se ele não resistir. Não viemos ao mundo para uma vida de mais ou menos. Viemos para felicidade esfuziante, e para isso, às vezes, temos que abdicar do que é meramente "certo" no sentido de que não causa problemas, para até, se for o caso, comprar brigas e problemas em uma estrada mais gloriosa e brilhante.


Estava ouvindo uma das aulas do Seminário de Filosofia do Olavo de Carvalho e ele cita o Louis Lavelle que diz algo mais ou menos assim, que temos que nos afastar até do círculo das pessoas com quem cultivamos simpatias e empatias naturais para conviver com aquelas com quem teremos a oportunidade de realizar nossas verdadeiras vocações espirituais, ou seja, realizar a nós mesmos, nos tornarmos aquilo para que Deus nos criou. Podemos combinar isso com a primeira citação do Lavelle que o Olavo fez, sobre apenas em momentos isolados termos perfeita clareza do sentido de tudo na nossa vida e que de ordinário nossos sentimentos e visão se fecham para isso e somos envoltos novamente nas trevas. Manter a memória desses momentos, mesmo apesar do cinismo que diz que eles são ilusões, mesmo apesar da dor que nos causa não os termos conosco e nos seduz a racionalizarmos que podemos ficar sem dor se apenas desistirmos dessa felicidade esfuziante é um exercício constante, e que só pode ser realizado precisamente com aquelas tais pessoas com quem podemos realizar nossa vocação espiritual. A felicidade morna não se sustenta e necessariamente se desfaz, decaindo novamente no inferno como vemos na citação do Apocalipse acima. O "violento" é o que luta pelo Reino de Deus, a grande felicidade na nossa vida, para viver uma vida de fogo e intensidade. É necessário resistir à tentação da felicidade morna para conquistarmos a felicidade brilhante.

domingo, 23 de dezembro de 2012

O Mistério do Natal




Com seu nascimento em uma humilde manjedoura, o Criador de Todas as Coisas, inicia a consumação do seu amoroso plano de salvação da humanidade. Descendo da Eternidade para o mundo físico, Jesus se torna um de nós, um ser de carne e histórico. E por que o Filho de Deus faria isto? Não poderia ele em sua onipotência realizar nossa Salvação sem submeter-se às dores da carne, sem os suores, as ingratidões, infâmias, traição e morte que viriam em seguida? Não é Deus o Senhor, cuja Palavra fez existir todo o universo e um mero sopro tornou um boneco de barro em uma criatura viva e inteligente à sua própria imagem e semelhança? Qual é o mistério da Encarnação do Filho de Deus no Natal?

A resposta, meus caros, é que realmente Deus não estava e não está forçado por nenhuma necessidade ou imperativo para realizar o que fez e ainda faz hoje em dia, pois nada há maior do que Ele. Sendo assim, em absoluta liberdade para fazer outra coisa que não nos salvar, ou realizar a salvação sem dor alguma para si, Deus escolhe encarnar-se como um de nós, exclusivamente por amor. Os ensinos, o que aprendemos do exemplo, tudo isso, por importante que seja, é secundário em face da experiência intensa do amor de Deus por nós, iluminando nossos corações e almas. Deus não veio apenas para ensinar, apenas para profetizar, apenas para educar. Veio para amar. Amar os que iriam amá-lo de volta, amar os que não o compreenderiam, amar até os que iriam odiá-lo. De fato, diz-nos a Santa Escritura que Ele já nos amava quando nós o odiávamos. E odiamos a Deus quando queremos fazer as coisas a nossa maneira, quando queremos que Ele apenas subscreva a nossa vontade como se fosse um mordomo dos nossos desejos. Mas Ele nos ama primeiramente, mesmo assim, pois o Amor verdadeiro não ama virtudes, qualidades, histórias, que nada mais são que abstrações, por belas que sejam. Ama pessoas concretas, seres humanos inteiros, ama-os mais que às suas virtudes e a despeito de seus defeitos.

O Amor de Deus é o amor verdadeiro. Não é um sentimento. Não se satisfaz em sentir amor, não é uma história romântica que montada na cabeça fica aguardando as pessoas que melhor vão interpretar os papéis pré-determinados no roteiro imaginado e que, por vezes, tentamos fazer acontecer "na marra". Não é a expectativa de um bem-estar ou de conforto. O Verdadeiro Amor, como vemos no nascimento de Cristo é união, presença intensa, doação, pois ali a natureza humana e a natureza divina unem-se, sem mistura e sem perder suas peculiaridades, na pessoa de Jesus Cristo, o Qual, por isto, é chamado de completamente Deus e completamente Homem, dupla natureza que representamos com os dois dedos dobrados durante o sinal da Cruz.

Mencionei antes que o Amor verdadeiro não acontece "na marra", por mera força do querer através de ações impositivas. Deus é onipotente, porém Ele não nos obriga, nem mesmo a vivenciarmos seu Amor se não quisermos, muito menos nos força a amar outras pessoas. Sabemos disso através de outra consumação da perfeição, esta perfeição já relativa e humana, que é a presença doce, humilde e majestosa da jovem Maria, Nossa Senhora, a Teotókos. Maria ali representa toda a humanidade. Deus não a força a participar de seu plano. Deus não aparece impondo-se em toda Seu poder infinito. Ao contrário, Ele envia um amigo, um anjo, para levar à Maria um pedido: "Eu gostaria de fazer isto, por amor de todos vocês. Você me permite?" Vejam, amigos que é o "Senhor dos Exércitos", o Criador, Deus Poderoso, Luz do Mundo, Primeiro e Último, Rei das Nações, Senhor da Glória,o Sol Nascente, O Senhor dos mortos e dos vivos, O Eterno forte e poderoso, o Eterno poderoso na batalha, O Sol da justiça, O justo juiz dos vivos e dos mortos, que, diante de uma moça de 14 ou 15 anos, gentilmente pede-lhe permissão de executar a Salvação de todo o universo, simplesmente porque todo ato de amor começa com uma escolha em liberdade. Para a realização do amor, da união de Deus com a Humanidade, o "sim" livremente escolhido é a porta de entrada. Assim como pelo "não" de Eva toda a humanidade caiu, pelo "sim" de Maria todos nós fomos salvos. É o Inimigo quem tenta enredar suas vítimas com palavras e atos envolventes, forçando situações e sentimentos. É este Inimigo que busca que sua vontade e desejos realizem-se "na marra". Isto não é amor. O Amor começa com o "sim" de Maria, cresce na união, na presença, na participação na vida do amado, como Jesus participou da nossa vida, comendo, bebendo, crescendo, trabalhando, suando, ferindo-se, conhecendo nossas alegrias e nossas dores. E consuma-se, como veremos mais tarde, na entrega total da vida, novamente voluntária e por livre escolha como Jesus fez na Cruz, transfigurando assim, a própria escuridão da morte em Vida ressuscitada, luminosa e eterna.

Digamos sim com Maria para a vontade de Deus em nossas vidas, para que Cristo Deus, nasça na manjedoura de nossos corações, iluminando os animais que ali habitam e representam nossos instintos; iluminando São José, ancião protetor da jovem menina e que representa a fé, a honradez e nossas virtudes; recebendo a visita dos pastores que representam a humildade; recebendo a visita dos anjos e que representam a graça de Deus; e a visita dos Reis Magos, que representam a sabedoria, a inteligência, a riqueza e o poder que se curvam em adoração obediente perante o Menino Deus.

domingo, 12 de junho de 2011

Jugo Desigual

por Padre Chris Metropulos
20 de outubro de 2009


Fonte: HELLENIC Communication Service
http://www.helleniccomserve.com/crtlunequallyyoked.html




Parece que todo lugar em que olhamos hoje em dia, tem alguém falando sobre o casamento. No mundo político, o assunto do assim chamado "casamento gay" é cheio de raiva. O New York Times recentemente publicou que pela primeira vez na história dos EUA o número de mulheres solteiras é maior que o número de mulheres casadas: 51%.

Os comerciais de TV e a internet anunciam websites feitos para te ajudar a encontrar um parceiro, e têm lucrado muito. Há artigos sobre solidão, sobre os problemas dos casamentos, e sobre realização pessoal que condicionam uma mentalidade sobre relacionamentos que parece contrária à sabedoria preservada na Igreja.

Então, como devemos interpretar estes "sinais dos tempos"? Eu sugiro que o entendimento atual sobre o que é o casamento e o que os relacionamentos foram feitos para ser é incompleto para dizer o mínimo.

Vivemos em uma época na qual "eu tenho o direito de ser feliz" parece estar no topo das prioridades da cabeça de todos. O casamento é visto como uma forma de realização pessoal e de felicidade. As relações são avaliadas por quão "felizes" elas fazem as pessoas, e quando a pessoa não se sente mais "feliz" então a relação "acabou". "Minha felicidade" é a medida de todas as coisas e quando esta é abalada, então a fuga é a resposta.

Se este é o modo pelo qual a maioria das pessoas trata o casamento e as relações, será alguma surpresa que exista tanto medo de compromisso e um indíce tão alto de divórcio?

A Igreja nos oferece uma visão radicalmente diferente do casamento e das relações. A Fé nos diz que o casamento não é sobre felicidade pessoal, mas sobre salvação pessoal. As relações nos são dadas, não com fins utilitários de fazer-nos felizes, ou de fazermos crianças, ou mesmo para o sucesso econômico. Eles nos são dadas para nos ajudarem a sermos como Cristo em nossas atitudes e comportamento. As relações foram feitas por Deus para servir como caminhos que nos chamam a sermos cristãos.

Não surpreende que o Apóstolo Paulo tenha insistido que "Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis; porque, que sociedade tem a justiça com a injustiça? E que comunhão tem a luz com as trevas?" (2 Coríntios 6:14). Com esta atitude cristã sobre o casamento e as relações, você não escolhe alguém para casar baseando-se na aparência, no dinheiro, ou mesmo na atração física. Você escolhe primariamente baseado em como aquela pessoa pode te ajudar a ser o melhor cristão que você pode ser. Sem isso como o critério primário para seu parceiro pela vida toda, você só vai alimentar a noção de relações descartáveis.

Aqui estão três modos de evitar o 'jugo desigual" e realizar uma escolha sábia para casar-se.

Primeiro - Escolha baseado na Fé. Ninguém deve ter medo de encontrar um parceiro que ame a Deus mais do que o/a esposo/a. A verdade é que um esposo que é comprometido com Cristo e Sua Igreja é uma escolha melhor do que alguém morno na fé. Um cristão ortodoxo comprometido irá levar a sério os mandamentos do Salvador de amar e servir e de fazer o casamento o mais forte possível.

Segundo - Escolha baseado em camaradagem. Um esposo é mais do que um parceiro econômico ou mesmo uma fonte de prazer sexual. Seu esposo é seu companheiro de vida. Isto significa que esta pessoa precisa ser alguém com quem você pode passar durante tempos difíceis. É alguém que vai te ajudar nas horas difíceis e se alegrar contigo nas horas felizes.

Finalmente, escolha baseado na família. Qual é a atitude do seu potencial esposo em relação à família? É a mesma que a sua? Vocês serão pais comprometidos e criar seus filhos em um lar cristão ortodoxo? As respostas a tais questões são fundamentais para que qualquer casamento seja o que ele foi feito para ser.

O maravilhoso paradoxo disso tudo é que quando você procura primeiro o Reino de Deus e coloca a sua fé como a prioridade maior da sua vida, felicidade e alegria te encontram por si sós. Você não estará o tempo todo lutando para ser feliz ou, pior ainda, dependendo de outros para te fazerem feliz. Você vai descobrir que focar a sua vida em Cristo traz todas as outras coisas que você esperava e que você será capaz de recebê-las como presentes ao invés de como um "direito" de uma vida auto-centrada e amesquinhadora da alma.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Anúncio sobre Vassula Ryden pelo Patriarcado Ecumênico



A Igreja Ortodoxa, seguindo estritamente o exemplo e o ensino luminosos dos Santos Apóstolos, o ensino dos Pais da Igreja que sucederam estes Apóstolos, e as decisões divinamente inspiradas dos Sínodos Ecumênicos, resguarda como uma pérola valiosa a fé da Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica a qual é vivenciada por todos os cristãos através da participação nos Sacramentos e toda a vida espiritual do divinamente fundado corpo eclesiástico.

Portanto, são rejeitados sempre como uma inovação inaceitável, quaisquer movimentos ou tensões geradas, pessoais ou coletivas, em menosprezo ou ruptura com os dogmas da fé e vida cristã ortodoxa dentro da Igreja como único caminho para a salvação de nossas almas, especialmente as auto-proclamadas personalidades "supostamente carismáticas".

Neste espírito, e para a proteção benéfica da plenitude dos fiéis ortodoxos em face de uma perigosa confusão espiritual, ao não perceberem bem as questões nais quais há risco de ilusão, expulsamos da Igreja Mãe, Vasiliki Paraskevis Pentaki-Ryden, conhecida como "Vassula", e sua organização fundada sob o título "Verdadeira Vida em Deus"(True Life in God) que precipitada e frivolamente prega ensinos baseados no suposto "diálogo direto entre ela(Vassula) e o Fundador da Igreja, Jesus Cristo, Nosso Senhor"; assim como (expulsamos) os que foram conquistados por ela e os apoiadores do "Verdadeira Vida em Cristo", que escandaliza a mentalidade ortodoxa dos crentes piedosos,e se desvia voluntariamente dos ensinos da Igreja, dados por Deus.

Assim, convocamos todos os proponentes destas inovações inaceitáveis e os apoiadores que as mantêm, os quais a partir de agora não são mais aceitos na comunhão eclesiástica,  não somente a não estarem envolvidos no trabalho pastoral da sua Santa Metrópolis local, mas também a não pregarem os ensinos novos, para que se evitem as devidas sanções de acordo com os Santos Cânones.

Expressamos, finalmente, a profunda tristeza do Patriarcado Ecumênico a respeito dos atos de nove membros do clero da Igreja Ortodoxa - felizmente são poucos - que se descobriu estarem em diálogos com a dita "Vassula" e lhe concederam um "certificado de Ortodoxia".

No Patriarcado, 16 de março de 2011
do Secretário-Chefe do Santo e Sagrado Sínodo

Original: http://www.ec-patr.org/docdisplay.php?lang=gr&id=1306&tla=gr
Traduzido do inglês, no site: http://www.johnsanidopoulos.com/2011/03/announcement-on-vassula-ryden-by.html

sábado, 13 de novembro de 2010

A Importância da Doutrina Correta

Amigos,

o texto abaixo é a tradução de um podcast realizado por um padre ortodoxo americano. Para os que não conhecem, podcasts são como programas de rádio só que transmitidos pela internet. Este padre realizou toda uma série de podcasts comparando a fé ortodoxa com as demais fés religiosas e este texto faz parte da introdução. Abaixo encontrarão também o link para a série original, sendo que ela é em inglês.

Espero que aproveitem!

A Importância da Doutrina Correta

Padre Andrew Stephen Damick
Tradução: Fabio L. Leite

http://ancientfaith.com/podcasts/orthodoxyheterodoxy

Na maior parte das áreas de nossas vidas, nos preocupamos com a verdade. Um caixa tem que saber quanto de troco terá que dar. Uma enfermeira tem que aplicar a quantidade correta do medicamento no paciente. Um matemático checa e confere suas provas. Um júri escuta todos os fatos para encontrar a verdade em um julgamento. O professor de história tem que conhecer os nomes e datas corretos.O cientista publica seu trabalho para ser conferido por seus pares, de modo a garantir que todos estejam obtendo os mesmos resultados. Em todos estes casos e mais, o que importa não é a opinião, é a verdade.

Mesmo assim, parece que quando chegamos nas questões religiosas e espirituais, e nas questões morais que as acompanham, aí nos tornarmos relativistas. Ao invés de perguntarmos o que Deus realmente é, perguntamos, "O que é Deus para mim?" Ao invés de perguntarmos qual o significado de Deus ter se tornado homem, nós sugerimos que "tá bom se algumas pessoas acreditarem porque elas querem". Ao invés de perguntarmos se Deus espera algo de nós, nós jugamos as expectativas religiosas pelo que nós mesmos queremos. A busca da objetividade é atirada pela janela, e a subjetividade reina.

Este problema fundamental é piorado por causa da falta de familiaridade com as ferramentas do conhecimento espiritual; isto é, as pessoas não estão fazendo o que é necessário para ver a verdade. Se um astrônomo recusa-se a utilizar um telescópio, ou se um biólogo não quisesse utilizar um microscópio, nos diríamos que eles, na melhor das hipóteses, possuem um conhecimento incompleto de seus campos. De um ponto de vista cristão, o que está faltando é pureza de coração; como Jesus disse: "Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus".Também está faltando a orientação para alcançarmos esta pureza, que deveria vir daqueles que viram Deus e passam a experiência à frente para a próxima geração.

Platão definiu o mesmo problema quando escreveu A República e utilizou a famosa alegoria da caverna. Nesta alegoria, prisioneiros acorrentados em uma caverna por todas as suas vidas acreditam que toda a realidade é definida pelas sombras que vêem na parede. Se um dos prisioneiros escapasse, encontrasse a saída e visse o sol e toda a realidade como ela é, como ele poderia descrever a sua experiência para pessoas cuja realidade consiste de sombras? Quando ele retornasse à caverna, tentando reajustar-se à vida na escuridão, os que ali permaneceram provavelmente iriam ridicularizá-lo como tendo enlouquecido pela sua experiência ao invés de iluminado. Tal é o fardo de muitos fiéis hoje.

Eu sugiro que a grande batalha espiritual de nossa época não é entre crentes e ateístas; ao invés, é uma luta entre o orgulho e a humildade. Esperamos e exigimos humildade em quase todas as áreas da vida: o que importa é o que é objetivamente verdadeiro, não o que cada um de nós por acaso acha que é verdade. Não são nossos gostos que são importantes. Mas quando se trata das questões mais importantes, deixamos a humildade de lado e nos colocamos no centro do universo. Esta tentação do orgulho é comum, mesmo entre os crentes em Deus.

Uma das pressuposições básicas desta série de podcasts é que a verdade não é relativa, e que o Cristianismo Ortodoxo representa a plenitude da verdade - o locus da revelação de Deus em Cristo. Desta posição básica, analisaremos vários grupos religiosos e seus ensinamentos, vendo o que temos em comum e o que temos de diferente. Porque a verdade não é relativa, todos os seres humanos devem estar dispostos a colocar de lado o que preferiríamos que fosse verdade e aceitar o que realmente é verdadeiro, mudando a nós mesmos, nossas atitudes, e nossas crenças sempre que necessário.

Se tornou politicamente incorreto em nosso tempo falar-se como se uma crença em particular fosse verdade e outra falsa. E mesmo assim, eu consigo lembrar bem claramente em minha própria história de vida que vários grupos religiosos em nossa cultura costumavam achar que suas próprias crenças eram verdades e, então, concluir pela lógica que as outras deveriam ser falsas.

Hoje, porém, esta conclusão - e, acima de tudo, expressá-la publicamente, é vista como sendo não caridosa, não amorosa. De fato, em nosso tempo, discordâncias públicas sobre religião são entendidas como ofensivas. Porque vivemos em uma época do politicamente correto, recebemos alguns mandamentos de teologia cultural que dizem:

Todas as religiões são basicamente a mesma coisa;

O que importa é viver uma vida boa;

Todos adoramos o mesmo Deus;

Religião é uma questão privada;

Não imponha suas crenças sobre os outros;

Nenhuma religião está certa em tudo;

Nós vamos descobrir o todo da verdade quando chegarmos no Céu;

Pensamentos como os acima possuem uma idéia comum por trás deles: que as crenças sobre Deus e sobre a natureza da realidade não são muito importantes. Por isso é que não deveriam ser discutidas em público. Por isso é que os detalhes de cada uma delas não seriam tão importantes. Por isso é que não deveríamos tentar converter as pessoas para nossa fé. Não existe esse negócio de "verdade absoluta". Tudo é relativo - exceto, talvez, o fato de que tudo é relativo.

E mesmo assim, para quase tudo na vida - seja na política, na saúde, ou mesmo nas tabelas de pontos de nossos times de futebol - nós exigimos seriedade, detalhe, precisão. Distraída por estas coisas transientes, nossa cultura conseguiu ignorar um silogismo básico:

Se realmente existe um Deus, então quem Ele é e o que Ele pode querer de nós são mais importantes do que tudo no universo.

Como pessoas que acreditam em Deus, nosso negócio não é "ser agradável". Nosso negócio é a verdade. O propósito destes podcasts é examinar as diferenças entre a fé da Igreja Ortodoxa e as fés de outras comunhões cristãs e não-cristãs.

Evidentemente, como um padre ortodoxo, é minha crença que a fé cristã ortodoxa é a única verdadeira. Eu não seria ortodoxo se eu não acreditasse que a Igreja Ortodoxa é a verdade revelada por Deus em seu filho Jesus Cristo. Minha fé é tal que, se eu encontrar uma parte da fé ortodoxa que não faça sentido para mim ou me parecesse incorreta, então sou eu que preciso ser reformado, e não a Igreja.

De fato, esta é a visão de todas as religiões tradicionais, clássicas, ao contrário do estilo consumista moderno de compreensão da fé que é popular em nossa cultura - que cada pessoa é o árbitro final do que é verdadeiro ou falso, que ela pode ficar escolhendo que pedacinhos de cada espiritualidade ou crença ela quer para si, em um tipo de buffet religioso.

A natureza da verdade, entretanto, é ser verdade independente do que qualquer um pensa a respeito. Em face da verdade, não há opiniões. A maioria das pessoas acredita nisso, mas não costumam aplicar isso na questão que mais importa: quem é Deus, e o que Ele quer de mim?

Existe o bem e existe o mal. Existe a verdade e existe a falsidade. Estas pressuposições básicas, fundamentadas em nossa existência do dia-a-dia, deveriam ser a base de todos os nossos pensamentos e ações relacionadas à verdade suprema.

Se você já visitou o site Facebook (Nota do Tradutor: um site como o Orkut, mais utilizado por americanos), você provavelmente sabe que os usuários podem montar seus perfis detalhando com várias pequenas informações sobre quem são e o que fazem. Um dos detalhes que podem ser especificados é rotulado "Visão religiosa". É isso que a maioria das pessoas pensa quando tratam de religião, que é uma questão de "visão", que religião é uma opinião que você tem, algo que você acha. Repare que o Facebook nem mesmo usa o termo "crença".

Para as religiões mais tradicionais, entretanto, a fé não é meramente um conjunto de visões; ao contrário, a fé religiosa é todo um modo de vida, uma forma de viver com propósito que, no seu cerne, possui objetivos que fundamentam tudo no modo como vivemos.

Assim, o Facebook representa uma filosofia secularista, a qual não é tanto uma negação das verdades espirituais, mas divide em compartamentos isolados os elementos da vida, em categorias elegantes nas quais uma nada tem a ver com a outra. Nesta caixa eu guardo minhas visões econômicas. Nesta outra estão minhas opiniões sobre a televisão à cabo. Nesta aqui estão minhas preferências de leituras, e nesta eu mantenho minha religião. Até a palavra religião - que eu não gosto de utilizar em relação à Igreja Ortodoxa - significa algo bem diferente. A palavra latina "religio" significa reconexão. Construir e reconstruir relações.

Aquilo com o qual você está tentando se relacionar varia de uma religião para outra, mas o ponto comum é que existe algo acontecendo de fato. Não é simplesmente algo que você acha ou concorda e não é apenas sobre você: existe um Outro.

Isso é verdade para tudo na vida. Meu irmão é um engenheiro químico. Minha irmã é bióloga. Dá para tentar imaginar o que foi que deu em mim de virar padre. Mas eles sabem que é assim, que não é sobre opinião. Se não acredita neles, pergunte a um médico, um físico ou psicólogo. Pergunte a um pedreiro, a um faxineiro. Eles vão te dizer que o que você acredita e o que você faz fazem diferença. Se você crê ou faz algo diferente, vai obter resultados diferentes.

O que me preocupa é que normalmente não aplicamos este princípio básico ao que mais importa na vida humana. No contexto religioso, esta verdade fundamental significa que religiões diferentes - porque crêem e praticam coisas diferentes - vão chegar a resultados diferentes.

Às vezes, estes resultados diferentes são todos jogados sob o mesmo rótulo de salvação. Mas o que significa ser salvo? Para o hindu que pratica yoga, a salvação significa ser liberado do corpo físico e ser absorvido no esquecimento do universo; para o Budista é a aniquilação da personalidade individual no Nirvana. Eu te garanto que não é isso que a salvação significa para um batista. Mas o que um batista quer dizer com salvação e o que um ortodoxo quer dizer, também não são a mesma coisa. Assim, os membros das diferentes fés possuem diferentes métodos de chegar aonde eles querem chegar.

Além disso, porque existem a verdade e a falsidade, e porque a maioria das religiões tradicionalmente alegam que suas fés são verdadeiras e as outras são pelo menos de alguma forma falsas, isso significa que alguns crentes religiosos estão fundamentalmente errados sobre suas crenças e práticas. Isto significa que eles não irão obter os resultados que pensam que terão.

Na fé cristã ortodoxa, nosso único propósito na vida é nos tornarmos mais como Jesus Cristo. Se vamos para o céu depois de morrermos é apenas um elemento de um quadro muito maior. Este quadro maior é, em útima instância, a Santa Trindade.

A vida do cristão ortodoxo tem um objetivo: união com a Santíssima Trindade - o Pai, o Filho e o Espírito Santo - o Deus Uno que criou todas as coisas. O caminho para esta união é Jesus Cristo, o Deus-Homem, a segunda Pessoa da Santa Trindade. A Salvação é a obtenção da vida eterna.

Em João 17, em sua oração ao Pai antes de Sua crucificação, Jesus define o que isso significa. Ele disse: "E isto é a vida eterna: que eles Te conheçam, o único verdadeiro Deus, e Jesus Cristo, o qual Tu enviastes." Conhecer Deus - isso é o que a vida eterna significa, e não simplesmente viver para sempre.

Ele ora assim depois: "E a glória que Tu me entregastes, Eu entreguei a eles. Para que sejam um, como Nós somos um; Eu neles, e Tu em Mim, para que eles sejam feitos perfeitos em Um, e que o mundo possa saber que Tu Me enviastes, que Tu os amastes como amastes a Mim."

Assim, na fé cristã ortodoxa, ser salvo - ter a vida eterna - significa amar a Deus em Jesus Cristo. Também significa receber de Jesus a glória que Ele recebeu de Seu Pai. Na realidade, a salvação é muito, muito mais do que escapar do inferno quando morrermos. É um conhecimento profundo e íntimo de Deus: Pai, Filho e Espírito Santo.

Neste conhecimento profundo - o qual é experiência mais do que acumulação de fatos - aqueles que estão sendo salvos recebem a própria glória de Deus. Ir para o céu ou para o inferno no momento da morte significa simplesmente que nossa experiência de Deus durante esta vida continua na próxima, embora muito amplificado. Se amamos a Deus e o conhecemos profundamente, nossa experiência será de infinita e intensa felicidade. Se rejeitamos a Deus nesta vida - ou simplesmente O ignoramos - nossa experiência deste amor nos será completamente estranha e sentida como sofrimento. Ele derrama o mesmo amor sobre todos. Alguns querem, outros não.

É por isso que a doutrina correta importa. É por isso que heresias são tão perigosas. Toda a nossa doutrina está orientada para termos um conhecimento íntimo de Deus, porque o tipo do conhecimento que tivermos dele vai determinar nosso destino eterno, nossa existência perpétua na vida que há de vir. Este conhecimento depende da nossa vontade de vivenciar a doutrina correta em nossas vidas diárias.

Vamos supor que espalhassem por aí que sou um homossexua praticante. Não é verdade, mas porque algumas pessoas acreditariam, isso afetaria suas relações comigo. Porque sou um padre, poderia afetar até as relações entre os membros da paróquia. Muitas relações como muitas pessoas seriam quebradas. Algumas pessoas certamente aceitariam e tentariam se aproximar, mas também estas relações seriam baseadas em uma realidade distorcida. Algumas pessoas de fora da paróquia poderiam ouvir esta fofoca e nunca nos visitarem ou considerarem a conversão. Aqueles mais próximos de mim - minha esposa e família - teriam suas vidas grandemente perturbadas se acreditassem nesta mentira. Destruíria a minha vida familiar, o que iria reverberar por nossos parentes, amigos, a unidade da paróquia e assim por diante - tudo por causa de uma crença errada a respeito de quem sou.

Talvez a fofoca não fosse tão séria. Suponhamos que dissessem que eu tenho um problema com bebidas. Os efeitos provavelmente seriam tão sérios quanto, embora não tão escandalosos. De toda forma, todas as relações seriam afetadas, não de acordo com a moral de cada um, isto é, não dependeria de se eles praticaram o bem ou o mal, mas dependeria daquilo que eles acreditavam sobre mim e como reagiram a essa crença.

Agora aumente muito este efeito aplicado à adoração e conhecimento do próprio Deus do universo. Algumas doutrinas falsas sobre Ele, podem causar uma destruição espiritual inimaginável. Outras podem até ter um efeito menor. Mas todas elas, em um grau ou outro, nos afastam da verdade, do puro conhecimento do único e verdadeiro Deus. Isto irá afetar como e se receberemos a glória de Deus, e como iremos experienciá-lO na próxima vida.

Viver uma vida moral de acordo com a lei Deus é realmente fundamental para a nossa vida em Cristo, mas não é suficiente. A religião não é apenas a ética. Devemos conhecer Deus conforme Ele realmente é. É por isso que a doutrina correta importa.

domingo, 25 de outubro de 2009

São Serafim e São Francisco - A Palavra dos Santos


Caros leitores,

o trecho abaixo foi traduzido pelo amigo Felipe Ortiz. É de grande importância em tempos de ecumenismo, pois é um testemunho de como Deus vê a questão da união das comunidades cristãs. Trata-se de uma visão em sonho que uma fiel protestante teve e na qual um santo romano e um santo ortodoxo lhe trazem a palavra de Deus. E não quaisquer santos, mas São Francisco e São Serafim,  os santos que talvez sejam os mais venerados na era moderna respectivamente entre os latinos e na Santa Igreja. Meditemos sobre a palavra de Deus revelada a nossa irmã através de seus santos.

Em Cristo,
      Fabio.

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São Serafim e São Francisco
Introdução e tradução: Felipe Ortiz


Por mais improvável que pareça, o encontro entre o católico italiano Francisco de Assis (1181/2-1226) e o ortodoxo russo Serafim de Sarov (1754-1833) chegou a acontecer.

E sua testemunha, surpreendentemente, foi uma protestante devota, na França, por volta do ano de 1925.

O trecho abaixo faz parte do livro São Serafim de Sarov -- Biografia Espiritual, escrito por um dos grandes ascetas e missionários ortodoxos do séc. XX, o Arquimandrita Lázaro (Moore), inglês convertido à ortodoxia (1902-1992).

Este livro, publicado postumamente, é considerado uma das melhores biografias de São Serafim. Na minha edição, que é a primeira, o trecho que traduzo abaixo está nas p. 239 a 243.

Esse livro já está esgotado, mas felizmente está prestes a ser reeditado, com outro nome, numa edição que aliás parece que será muito bonita: http://anaphorapres s.com/music/ pre-release- sale/


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O evento que relatamos abaixo nos foi comunicado verbalmente em agosto de 1931 pelo Sr. K., que mais tarde o escreveu em uma carta dirigida a nós. É dessa carta que faremos uso aqui.

É de conhecimento geral que São Serafim sabia por experiência e disse mais de uma vez que o Cristianismo estava preservado em toda a sua plenitude e pureza na Igreja Ortodoxa. E o que é mais impressionante e convincente é sua própria sublime virtude e a abundância da graça que habitava nele com tal "poder" (Mc 9:1) que raramente se viu até nos santos antigos. É suficiente mencionar apenas a conversa de N. A. Motovilov com o santo (durante a qual ele se transfigurou miraculosamente, como o Senhor no Monte Tabor) para firmar, sem a menor dúvida, que a Ortodoxia ainda retém de fato a sua pureza, vitalidade, plenitude e perfeição originais. Mas citemos suas próprias palavras:

"Nós temos a fé ortodoxa, que não tem a mínima mácula."

"Rogo-vos e suplico-vos", disse ele em certa ocasião a alguns veterorritualistas, "ide à Igreja Greco-Russa. Ela está em toda a glória e poder de Deus. Ela é dirigida pelo Espírito Santo."

Isso também foi testemunhado por uma adepta de outra confissão. Aqui estão os fatos.

"Um amigo meu", escreve o Sr. K., "encaminhou-me uma carta escrita em francês na qual uma senhora alsaciana pede a ele para enviar-lhe alguma coisa sobre a Igreja Ortodoxa Russa -- um livro de orações ou algo do gênero. Se não me engano, foi no ano de 1925. Algo foi-lhe enviado como resposta à carta e, por algum tempo, a coisa ficou nisso.

"Em 1927, eu estava naquela localidade e tentei entrar em contato com ela; mas ela estava em viagem, nas férias de verão, e eu só pude conhecer a sua sogra, uma velha senhora de grande caridade cristã e pureza de coração.

"Ela me contou que sua família pertencia a uma antiga e nobre linhagem da Alsácia, os N.N.s, e que eles eram protestantes. Devo dizer que naquele distrito da Alsácia os aldeões são de religião mista: metade são católicos romanos e a outra metade protestantes. Eles compartilham a mesma igreja, na qual celebram seus ofícios em revezamento. Nos fundos da igreja há um altar católico com imagens e todos os demais apetrechos. Quando os protestantes celebram um culto, eles puxam uma cortina em frente ao altar católico, deslizam sua mesa até o meio e rezam. Recentemente tem havido um movimento entre os protestantes da Alsácia a favor da veneração dos santos. Isso aconteceu depois da publicação do livro de Sabatier sobre Francisco de Assis. Apesar de protestante, ele se deixou cativar pelo modo de vida desse santo depois de uma visita a Assis. A família de meus amigos também caiu sob os encantos deste livro. Embora tivessem permanecido no protestantismo, eles ainda assim se sentiam insatisfeitos; particularmente, empenhavam-se pela restauração dos sacramentos e da veneração dos santos. Além disso, foi típico deles que, quando o pastor realizou a sua cerimônia de casamento, eles pediram-lhe para não puxar a cortina sobre o altar católico, a fim de que pudessem pelo menos ver as imagens dos santos. Seu coração procurava a Verdadeira Igreja.

"Certa vez, a jovem esposa estava doente, sentada no jardim, lendo uma vida de Francisco de Assis. O jardim estava em plena floração. O silêncio do campo a envolvia. Enquanto lia o livro, ela caiu num sono leve.

"'Eu mesma não sei como foi que aconteceu', ela me disse mais tarde. 'De repente eu vi o próprio Francisco vindo em minha direção e, com ele, um velhinho semelhante a um patriarca, recurvado mas radiante', disse ela, indicando dessa forma a velhice e a aparência venerável dele. Ele estava todo de branco. Ela se apavorou, mas eles chegaram bem perto dela e Francisco disse: 'Minha filha, tu buscas a verdadeira Igreja. Ela está ali, onde ele está. Ela apoia todos e não exige o apoio de ninguém.'

"O ancião branco permaneceu calado e apenas sorriu em aprovação às palavras de Francisco. A visão terminou. A mulher como que tornou a si. E de algum modo ocorreu-lhe o pensamento: 'Isso tem ligação com a Igreja Russa.' E a paz desceu à sua alma. Depois dessa visão, foi escrita aquela carta a que me referi no começo.

"Dois meses mais tarde, eu estava de novo em sua casa, e dessa vez fiquei sabendo de mais um detalhe através da própria vidente. Eles haviam contratado um empregado russo. Quando ela entrou no quarto dele para ver se ele estava acomodado confortavelmente, ela viu ali um pequeno ícone e reconheceu nele o ancião a quem havia visto, durante seu sono leve, com Francisco. Perplexa e alarmada, ela perguntou: 'Quem é ele, esse velhinho?'

"'São Serafim, nosso santo ortodoxo', respondeu o empregado. Então ela compreendeu o significado das palavras de Francisco sobre a verdade estar na Igreja Ortodoxa."

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Protestante Alemão Converte-se à Igreja ortodoxa no Monte Athos


No último sábado, 8/8/2009, no Santo Monastério de Dohiariou, na Santa Montanha, em uma atmosfera de devoção, o alemão Dominik Weiel, 40 anos, geólogo, renunciou ao Protestantismo e abraçou a Ortodoxia, recebendo o nome batismal de Michael (Miguel).

Miguel conheceu o Monte Athos e a Ortodoxia por via wireless através da rádio-comunicação com um irmão rádio-amador, o Pe. Apollo SV2ASP/A, iniciada em 1991. O experiente rádio-amador alemão DL5EBE, ainda universitário, quando escutou pela primeira vez o ainda inexperiente monge agiorita chamando por um sinal fraco, comunicou-se com ele e lhe ofereceu ajuda. Esta foi sua primeira oportunidade de ir até Athos, encontrar o monge e montar a rádio. A visita se tornou um marco em sua vida. Ele encontrou com o Ancião Gregório, abade do monastério, e os irmãos, os quais ele amou e continuou a visitar, e sempre participando do programa completo do local.

Quando completou seus estudos superiores, ele foi empregado por uma empresa de petróleo alemã com atividades por todo o mundo. Por muitos anos ele tem trabalhado em Moscou, e por causa disto, muitos anos se passaram desde sua última visita a Athos. Entretanto, a despeito disto, ele não deixou de se comunicar. Durante todo este tempo, ele lutou consigo mesmo a respeito da conversão e finalmente decidiu ser batizado, se dirigindo, por isso a Athos.

Durante este período ele estava cheio de trabalho e os dias se passavam com grande ansiedade para ser batizado. Finalmente, na Sexta, o ancião perguntou-lhe "você deseja ser batizado?" "Seria um enorme prazer", ele respondeu e seu rosto ficou iluminado. Então, nós convidamos o Sr. Stavro Pomaki, Oficial da Aeronáutica, rádio-amador e filho espiritual do monastério, o qual, apesar de longe de casa, alegremente concordou em se tornar padrinho de Michael.

Pouco tempo depois tudo estava pronto e na manhã de sábado após a Divina Liturgia, ele recebeu o santo batismo no porto de nosso monastério, na presença de toda a irmandade e de peregrinos e finalmente, com grande felicidade, retornou para seu trabalho.


Vamos orar para que o Arcanjo Miguel, o protetor de nosso Monastério, cujo nome foi dado por nosso Ancião, apóie o novo irmão na difícil jornada de sua vida e suas lutas cotidianas.

História original no site Impantokratoros:

domingo, 14 de setembro de 2008

A Santa Cruz


A Santa Cruz é a nova Árvore da Vida em paralelo com aquela do Paraíso pois nela estava o Fruto da Vida.

Lembremos da passagem em Gênesis 3:22:
"Então disse o Senhor Deus: Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal; ora, para que não estenda a sua mão, e tome também da árvore da vida, e coma e viva eternamente"

Quando o Homem quebrou o primeiro mandamento, de jejum da árvore do conhecimento do Bem e do Mal, afastou-se de Deus pela desobediência, trazendo sobre si a doença, o pecado e a morte.

Caso tomasse da Árvore da Vida nessa condição, seria eternamente doente, pecador e...espiritualmente morto, pois o fruto da Árvore da Vida o tornaria eterno na condição em que estivesse.

Esse foi o motivo da expulsão de Adão e Eva: a infinita misericórdia de Deus que não queria que nos tornássemos eternos em um estado de decadência sem fim. E foi também por esta ilimitada misericórdia que Deus nos enviou Seu próprio Filho, Ele mesmo o Fruto da Vida, o Pão da Vida (Eu sou o Caminho, a Verdade e A VIDA). Vejamos as Santas Escrituras em São João, capítulo 6:

32 Disse-lhes, pois, Jesus: Na verdade, na verdade vos digo: Moisés não vos deu o pão do céu; mas meu Pai vos dá o verdadeiro pão do céu

Quem é que o Pai nos deus senão seu Filho? Ele é o Pão do céu como ele confirma em seguida:

33 Porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo.


Que também concorda com São João, capítulo 3:13:

Ora, ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do homem, que está no céu.


Aquele que desceu do céu, Aquele que o Pai nos deu é ele a Vida, Nosso Senhor Jesus Cristo, o que Ele diz de forma explícita em São João 6:51:

"Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo."

Sendo assim o madeiro da cruz torna-se o tronco árvore de onde o Pai nos concede o Fruto da Vida que outrora nos proibira. A ação redentora de Nosso Senhor tudo transfigura, tudo renova e um instrumento de morte se transforma em doador da Vida.

Sabemos também, através da última bem-aventurança em São Mateus 5

Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de vós.

e de São João 15:20

Lembrai-vos da palavra que vos disse: Não é o servo maior do que o seu senhor. Se a mim me perseguiram, também vos perseguirão a vós; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa.

Que a energia da Cruz é componente essencial da redenção, isto é como disse São Paulo ao Romanos (repare a condicional):

Ora, *se* já morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos.

Ou seja, que *se* "morremos" com Cristo, ressuscitaremos em Cristo. Deixando morrer o "homem velho", carnal, das paixões, "crucificando-o", fazemos como São João Batista: "É necessário que *Ele* cresça e *eu* diminua" (S. João 3:30).

E de fato aí está a energia da Santa e Vivificante Cruz; a diminuição constante do nosso eu, da nossa vontade para que a Dele seja plena em nós e possamos dizer com o Filho para o Pai:
"Que se faça a Tua Vontade e não a Minha" (S. Lucas 22:42);

e como São Paulo:
"Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim;" (Gálatas 2:20).

No dia da Liturgia são lidos os Salmos 22, 74 e 99 que profetizam a crucificação de Nosso Senhor. Isso demonstra que a Cruz faz parte da Salvação desde o início.

De fato, tramite-nos a Santa Tradição que o sacrifício redentor de Nosso Senhor é figurativamente mencionado já no proto-Evangelho do Gênesis (3:15) quando Deus diz à serpente: "E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e *tu lhe ferirás o calcanhar*."

Finalmente, Nosso Senhor explica para Nicodemos de que modo esta Vida Eterna nos foi dada:

E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado;
Para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.
(S. João 3:14-15)

A leitura da epístola do dia é 1 Coríntios 1:18:24 e o Evangelho é S. João 19:6-11, 13-20, 25-28 e 30-35, todos relacionados à Santa Cruz.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O que é afinal "imagem e semelhança"?


O que é afinal "imagem e semelhança"?

por Fabio Lins

"A expressão 'de acordo com a imagem Dele' claramente refere-se ao aspecto da natureza Dele que consiste de mente e livre-arbítrio, enquanto que "de acordo com Sua semelhança" significa semelhança em virtudes, na medida em que isso é possível."
S. João de Damasco


Na queda, o homem perdeu a semelhança: deixamos de ser veículos de expressão da virtude ,que só pode vir de Deus; e a imagem ficou "danificada": nossa mente fragmentou-se e nosso livre-arbítrio defeituoso, cheio de inúmeros pequenos e grandes vícios que lhe tolhem
a liberdade de escolha. Este "órgão de tomar decisões", estando doente, faz com que tomemos decisões erradas e "erremos o alvo" da nossa vida que é Deus. Este é que é o significado da palavra "pecado" no grego do Novo Testamento "hamartia": errar o alvo.

Erramos o alvo porque nosso livre-arbítrio é viciado, cheio de "compulsões", ou, como diziam os Pais da Igreja, "paixões" que tem o mesmo radical de "passivo" ou "passividade" (tanto que em inglês diz-se "passions"). Paixões, portanto, são o preciso contrário do que o mundo moderna prega. Ao invés de serem 'afirmações e expressões da individualidade' da pessoa, são exatamente impressões, marcas que o ambiente provoca na pessoa, moldando-a, tolhindo seu livre-arbítrio. Quanto mais cheia de paixões for a pessoa, mais dominada pelo ambiente ela está, menos liberdade ela tem e mais passiva ela é em face do que a cerca, seja a natureza, campanhas de marketing ou a sociedade.

É por isso que o caminho de restauração da imagem passa necessariamente pela via ascética, a via da profunda disciplina. Trata-se de, com o auxílio de Deus, disciplinar as escolhas e as
vontades. Por vezes vemos santos tomando radicais ações de mortificação e ficamos vivamente impressionados. Não estarão violentando-se? Quem já viu uma turba enfurecida de grupos rivais de torcedores brigando sabe que existem situações nas quais medidas violentas são inevitáveis para acalmar os ânimos. Realmente, é possível que a polícia exagere na mão da repressão. Igualmente é possível que alguns santos - que apesar de santos não possuíam a perfeição ideal já que apenas Nosso Senhor Jesus Cristo é sem pecados - tenham exageado a mão. Mas assim como a polícia reprime em favor dos inocentes em volta, o santo disciplina-se em favor da salvação. As compulsões em muitos de nós foram tão excitadas ao longo dos anos pelo reforço e repetição dos mau-hábitos, pelo feedback positivo da sociedade aos nossos vícios que é necessário um "choque" para aquietá-los. Descobrir a medida certa é sempre uma operação delicada e por isso mesmo é que a orientação de um pai espiritual é necessária para que o remédio - especialmente se tiver que ser forte - não ultrapasse a necessidade.

A reunião da mente e do coração é uma necessidade absoluta. Vemos o caso mais radical de tal separação nos psicopatas e sociopatas, nos quais seus pensamentos, quase sempre muito inteligentes, não encontram o menor eco em seu coração. Esta é a razão de muitas pessoas,e admitamos, nós mesmos, tomarmos atitudes "cruéis". Nossa decisão, nossa idéia, não está unida ao coração. Igualmente é o motivo de pessoas de "grande coração" tomarem rumos irracionais,
evidentemente danosos e ilógicos. O coração delas, desvinculado da razão, é qual um navio sem leme, um navegador sem mapa ou bússola. Reunindo inteligência e coração estamos desfazendo o "esfacelamento" da imagem divina em nós.

Para fazer esta reunião apropriadamente é necessário curar o "Nous" o "órgão" que nos permite "ver" Deus. Presentemente, este Nous ora é abalado pelas tempestades do coração, aprisionado pelos limites da mente, e ora é arrastado na lama pelas nossas "passividades compulsivas", as paixões. Por isso o treino ascético constante na oração e na quietude é necessário. Uma vez aquietados os algozes que o agridem, o Nous começa a "curar-se sozinho", ou, melhor dizendo,
considerando que Deus está constantemente "reenergizando-o" com Suas próprias energias para que possamos vê-Lo, ele pode seguir seu rumo natural se estiver sem ataques.

A semelhança só é possível se imagem estiver saudável, isto é, as virtudes só podem ser expressas com uma mente (inteligência-coração) unificada e um livre-arbítrio sem entraves, isto é, sem vícios graves, sejam vícios por coisas diretamente destrutivas ou por prazeres e distrações. A Virtude não está em nós mesmos, mas em Deus. Ela pode se expressar através de nós se formos "veículos" adequados para isso, se o "cano" (nossa alma) estiver firme e sem rachaduras para que a água (as energias de Deus) passe. Um "cano com água abundante jorrando" é o homem santo. Ele é "corpo de Deus" porque naquele momento em que a água está nele, a água e ele são uma só coisa, ainda que composta. É por isso que a pessoa santa, quando diz que todo bem que pratica não vem dela mas de Deus, não está sendo falsamente humilde, mas expressando a mais pura verdade. Só Deus é santo, só Deus é perfeito e não há virtude em nós mesmos, mas podemos ser coparticipantes da virtude, da perfeição e da santidade divinas, conforme o próprio São Pedro nos ensina em sua 2a. epístola.

A salvação consiste precisamente na reconstrução da imagem e mais uma vez receber a semelhança; em restaurar nossa "sanidade espiritual" para a partir daí Deus poder se manifestar em nós, fazendo, assim, que sejamos Seu próprio Corpo. Nossa participação nela é nossa luta ascética diária, nossa "reforma espiritual", tornando este hoje miserável templo em habitação digna do Espírito de Deus.

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O texto que S. João de Damasco segura em seu ícone é:

"Antigamente, Deus, que é sem forma ou corpo, não podia ser retratado. Mas agora, quando Deus foi visto na carne conversando com os homens, faço uma figura do Deus que vejo. Não adoro a matéria. Adoro o Criador da matéria que se tornou matéria por amor de mim."

Burocrata de um reino árabe, ele foi um grande defensor dos ícones em uma época em que o próprio imperador do Império Romano era contra fazer imagens de Deus e santos.